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Educar para Ressocializar

O doutor Luiz Coutinho foi o convidado do programa Academia, da TV Justiça. O criminalista falou sobre a educação como instrumento no processo de ressocialização de detentos reclusos em presídios do país. O programa foi exibido no dia 10 de novembro de 2017.

Na oportunidade o autor expôs a tese de sua autoria que propõe a implementação do ensino à distância para detentos reclusos em presídios do país.

O resultado do estudo gerou o livro, “Atrás das Grades – O desafio da educação de presos no século XXI”. A obra é fruto de um profundo trabalho de pesquisa para sustentação da tese que lhe garantiu o título de Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Museu Social Argentino, e estrutura-se em três importantes pilares: prisão, educação e socialização.

Assista a entrevista completa aqui.

“Não existe ressocialização para o indivíduo que não foi socializado”

Juntamente com o vídeo, compartilho o capítulo 3 da minha mais recente obra. O livro que foi lançado em dezembro de 2016:’Atrás das Grades – O desafio da educação de presos no século XXI’ da Editora Casa Cultural Coronel Pitá.

Capítulo 3
DO PROCESSO (RE) SOCIALIZAÇÃO OU SOCIALIZAÇÃO DO CONDENADO

3.1 DOS OBJETIVOS EXPLICÍTOS E IMPLÍCITOS DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS

De acordo com a Lei de Execução Penal (Brasil, Legislação Penal, Lei
7.211/84), temos que seu objetivo primeiro seja:
Art. 1º- Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença
ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração
social do condenado e do internado.

Para Renato Marcão (2011, p. 31),
A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do
internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a
natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a
humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e humanizar.

Joe Graeff Filho (2011, p. 202) anota,
Buscando a finalidade na criação da LEP é possível verificar seu caráter
pedagógico estabelecido na segunda parte de seu artigo 1°, que com natureza
própria e desvinculada, visa dar ao condenado possibilidades de integração
social como resgate de sua dignidade para que ao final da pena possa
retornar ao seio da sociedade como sujeito capaz de viver em harmonia com o
mundo, afastado da marginalidade.

Licínio Barbosa (1993, p. 210), ao explicar os objetivos da execução penal
fala em teleologia da execução penal, e sustenta que a finalidade precípua é
a reeducação como finalidade superior da execução, porque modela, do
velho, – um novo homem. Só por seu intermédio, o delinquente retornará, um
dia, devidamente preparado para os embates da vida, à sociedade que o
fustigou com a sanção, em decorrência da infração. A ressocialização do
sentenciado – reintegrado no concerto social, – eis a finalidade máxima da
pena, buscada pelo Direito Penal moderno.

De todas as observações temos como recorrente, propostas de “recuperação,
ressocialização, readaptação, reinserção, reeducação social, reabilitação”,
que, à primeira vista, são tratados como expressões sinônimas e dizem
respeito ao conjunto de atributos que permitem ao indivíduo tornar-se útil a
si mesmo, à sua família e à sociedade.
Kent (1988, p. 53-4) sustenta,
La palabra ‘readaptación’ o las expresiones resocialización, reinserción
social, readecuación social, rearmonización, reeducación. Parábolas del hijo
pródigo que se autolegitiman, sin mayor consulta a los marcos histórico y
político que subyacen en las categorizaciones del Derecho penal.
Lineamientos genéricos que sólo están allí para desdibujar los contornos
ciertos de la penetración del sistema penitenciario o de la regulación
carcelaria en la vida de quienes quedan bajo su égida.

A rigor, este discurso oficial representa os objetivos declarados, que
consistem no controle formal do Estado através dos órgãos de Execução Penal,
e que não representam, nem tutelam, os interesses comuns a todos os
cidadãos, mas a interesses de grupos minoritários socialmente privilegiados,
não sendo atingidos na maioria das vezes.
D’outra banda o Sistema Penal é sabidamente seletivo, seja no que diz
respeito à proteção dos direitos humanos, dos bens e interesses sociais,
seja em relação ao processo de criminalização (incriminalização e
descriminalização), seja no que tange ao recrutamento da clientela, o que
fortifica a ilação de que o sistema punitivo é absolutamente inadequado para
atuar de maneira útil e saudável na sociedade. A sociedade moderna está
muito mais preocupada com as propostas de estabilização da situação presente
do que a reconstrução para além desta sociedade no futuro, razão pela qual
Kent (1988, p. 87), acertadamente comenta:
Nuestras sociedades democráticas están mucho mejor dispuestas para celebrar
ceremonias de exclusión que ceremonias de reintegración. Es la tendencia
natural de cualquier sociedad; pero no es papel de la justicia el ir contra
la naturaleza? No consiste asimismo en reintegrar a los ciudadanos que ha
excluido? El gran problema de las sociedades democráticas que generan la
exclusión no será pronto la reconciliación?

Nota-se que o discurso oficial dos objetivos da execução penal coloca a pena
como pedra angular do sistema, mas não busca compreender o problema como um
todo, apenas como parte, aprisionar para recuperar, em outras palavras, não
confessando os objetivos implícitos, que representam a manutenção de um
sistema capitalista perverso e excludente e que se alimenta dos seus
próprios resultados para efeito de manutenção do “status” existente.
Não se pode falar em objetivos da execução penal sem uma proposição concreta
da reconstrução dos problemas sociais, e sem uma discussão séria do próprio
sistema social. De mais a mais, é imperioso proceder à crítica das práticas,
das atitudes e atividades dos operadores do direito, afinal a nova ordem
social impende em repensar para quem é feito o sistema punitivo sob pena de
“não acompanharmos o bonde da história”, e continuarmos alijando dos
processo de inclusão a parte mais necessitada da população; também, é
necessário avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer
suporte reflexivo ao legislador, dês que a legislação penal brasileira é
concebida sem uma análise sistêmica e muitas vezes em total afronta ao texto
constitucional;
Outra questão a ser pensada é proceder a avaliação do papel desempenhado
pela ciência jurídica e o próprio comportamento dos operadores do direito no
seu desenvolvimento, isto porque, em matéria criminal, via de regra,
formam-se dois grupos bem definidos: o bem e o mal. No grupo do bem, que
busca sempre a Justiça, juízes e promotores, muitas vezes em uma simbiose
promiscua, que não consegue apartar as funções de acusar e julgar de forma
estanque. Do outro lado, acusado e defensor, representando o mal, uma vez
que, próximos ao fenômeno do crime, não estariam dispostos a colaborar com a
busca da aplicação equinanime do Direito. Mitiga-se o direito de defesa, da
não auto-incriminação, do devido processo legal, do contraditório, entre
tantas outras garantias expressas pelo texto constitucional.
Numa análise propositiva, nos cabe ainda, investigar as causas da
desestruturação, do enfraquecimento, ou até mesmo da ruína de um sistema
jurídico; a quem serve? e até onde iremos neste processo?
Temos um Poder Judiciário sucateado, sem juízes, com falta de funcionários,
sem condições salubres e operacionais do desenvolvimento da máquina
judiciária, e mais que isto, sem uma proposição concreta de mudança, falta
planejamento, uma garantia da prestação jurisdicional célere e que busque a
efetivação da justiça. Penso que o primeiro objetivo da Justiça Criminal é
que o processo seja rápido, efetivo, que não se use a prisão processual como
pena, mas que, uma vez consolidada a situação jurídica (trânsito em julgado
da sentença penal), ela seja efetivada, garantindo ao condenado os direitos
previstos na legislação de Execução Penal.
Deve-se ainda, investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação
social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a
indivíduos, seja no que tange a grupos, seja no que tange a coletividades,
seja no que tange a preocupações humanas universais, numa afirmação concreta
do princípio da dignidade da pessoa humana e em respeito aos direitos
fundamentais.
Estabelecer, esclarecer e definir a teleologia do Direito, por meio da
crítica conceitual institucional, valorativa, política e procedimental, com
o objetivo de auxiliar o juiz no processo decisório, apontando métodos
adequados de (re) socialização do apenado.
Mapelli (apud FALCONI, 1998, p.117) para definir o vocábulo
“Ressocialização”, anota,
Un principio fundamental de humanización de la ejecución de las penas y
medidas privativas de libertad en virtud del cual éstas deben adaptarse a
las condiciones generales de vida en sociedad (princípio de atenuación) y
contrarrestar las consecuencias dañinas de La privación de libertad
(principio de nil nocere).

Nesta toada, percebe-se a dupla finalidade da execução penal, qual seja, dar
sentido e efetivação do que foi decidido criminalmente, além de dar ao
apenado condições para que ele consiga aderir, novamente, ao seio social,
evitando, desta forma, a reincidência.
Nota-se que sempre, e de forma indistinta, quando tratamos de presos e
execução penal trazemos à colação a expressão “ressocialização” ou seus
sinônimos. Será que é adequada? Quem é o sujeito de direito – sujeito
passivo da resposta punitiva estatal e sujeito ativo do crime – no Direito
Penal?
Antes de mais nada é necessário esclarecer que a expressão ressocialização
não pode prescindir de uma prévia socialização, daí a primeira falácia do
sistema em “ressocializar quem não foi socializado”, pensamento corrente da
criminólogia crítica.
Bem confirma esta proposição o Des. Lourival Almeida Trindade (2003, p.29),
“o cárcere, além de sempre reproduzir os valores das classes dominantes,
jamais cumpriu suas reais funções – a de reeducação e de reinserção social
do apenado.” E prossegue (2003, p. 30),
na atualidade, não se ignora que a prisão, em vez de regenerar e
ressocializar o delinquente, degenera-o e dessocializa-o, além de
pervertê-lo, corrompê-lo, e embrutecê-lo. A prisão é, por si mesma,
criminógena, além de fábrica da reincidência. Já foi cognominada, por isto
mesmo, de escola primária, secundária e universitária do crime. Enfim, a
prisão é a verdadeira sementeira da criminalização.

Dirceu Siqueira e Telma Rostelato ( 2009, p. 112), concordam com o nosso
conterrâneo:
Talvez a culpa não seja somente de nossa legislação penal, mas em grande
parte do Estado, por meio dos estabelecimentos prisionais que oferece, todos
mal aparelhados, deixando o prisioneiro à mercê de uma escola que apenas o
transforma em um detento de maior periculosidade, pois muitos após saírem
daquele lugar, saem com maior aptidão para a prática de delitos cada vez
mais atemorizadores.

De mais a mais, o sujeito de direito da resposta estatal é necessariamente
aquele que foi excluído, no nascimento, da sua capacidade de consumir, e
para explicar este quadro, inicialmente, podemos pontuar que o modelo
econômico, dos países capitalistas, acentua as desigualdades existentes
entre as diferentes classes sociais e estimula o aumento da repressão às
camadas menos favorecidas da sociedade.
Luis Niño (1997, p. 104) explica,
En realidad, y como todos sabemos, lejos de favorecer el tránsito a una
mayor igualdad, el propio desarrollo del sistema socio-económico cimentado
en la ficción contractual, profundizó las diferencias de los individuos y
los grupos humanos respecto de la posesión y disposición de los bienes
materiales, hasta hacer añicos la metáfora del consenso originario. El
proceso de concentración de los capitales es hoy una realidad incontrastable
en cada país, en cada región y en cada continente, y divide al planeta en
microcosmos cada día más diferentes.

Com as concepções do neoliberalismo, surgiu o que se convencionou chamar de
“Estado mínimo”, levando a efeito as privatizações, sob o argumento de
desonerar os cofres públicos, passando os serviços as mãos dos particulares
com custos ainda mais elevados e reduzindo-se, em contrapartida, os
benefícios que deveriam ser garantidos pelo Estado.
Daí Maria Lúcia Karan, (1993, p. 206-207) anotar,
A função efetiva do sistema penal é de manutenção do status quo, ou seja: o
cárcere é reprodutor de desigualdades sociais. Trata-se de um instrumento de
exclusão social, ao contrário dos seus fins oficialmente declarados.
Escolhe-se para receber toda a carga estigmatizante provocada pelo sistema
penal, preferencialmente os membros das classes subalternas, fato este
facilmente comprovado se observarmos quem está preso em nosso país.

Alessandro Baratta (2011, p. 3) nos instiga ao afirmar,
Se verificarmos a população carcerária, sua composição demográfica, veremos
que a marginalização é, para a maior parte dos presos, oriunda de um
processo secundário de marginalização que intervém em um processo primário.
É fato comprovado que a maior parte dos presos procede de grupos sociais já
marginalizados, excluídos da sociedade ativa por causa dos mecanismos de
mercado que regulam o mundo do trabalho.

Precisa é a observação de Araújo, (2007, p.87),
Diante desse grave problema social, as políticas públicas implementadas para
área de segurança foram as de um aumento do aparato estatal coercitivo. Com
isso, em vez de se realizarem políticas de longo prazo, como o investimento
na educação pública e gratuita, as autoridades públicas fizeram a opção de
criminalizar as camadas da população pobre, como se essas já nascessem
predestinadas ao crime, o que não deixa de ser verídico, visto o número
pífio de oportunidades ofertadas a esses indivíduos ao longo de suas vidas.

Por outra via temos que não apenas o fator econômico representado pelo
desemprego é o responsável pelo incitamento do indivíduo ao cometimento de
delitos. Na sociedade moderna, os meios de comunicação em massa, as novas
redes sociais, ou seja, a sociedade visual – estimula o ter em detrimento do
ser, situação que impõe o consumo a todas as classes, sendo o indivíduo
valorizado pelo que representa socialmente em razão dos objetos que possa
apresentar aos seus pares. Tal forma de proceder, não raro propõe o
cometimento de alguns delitos com o intuito de obter um ganho material
imediato que possibilite a resolução rápida das necessidades representadas
pelos símbolos escolhidos como adequados socialmente.
Para Bauman (1998, p. 55),
a criminalidade crescente é produto da sociedade de consumidores. Veja-se
que o frequente estímulo ao consumo é indistinto, atinge e conquista a
todos, havendo, portanto, uma necessidade de se consumir. Como existem
grandes distorções econômicas, alguns grupos serão privados da satisfação
deste anseio incutido sendo, por vezes, conduzidos ao desvio.

E, caberá, nesta nova fase, à prisão servir de reforço à exclusão destes
criminosos, dos que desviam, ou como bem adjetiva o professor polonês, os
consumidores falhos. Tem-se, neste novo período, a ideia de classes de
criminosos, não mais o ideal de classes perigosas, pune-se pelo que a pessoa
é, e não pelo que fez.
Alessandro Baratta (1998, p. 182) pontualmente enfrenta a questão: “Antes de
querer modificar os excluídos, é preciso modificar a sociedade excludente,
atingindo, assim, a raiz do mecanismo de exclusão”.
Completa Edna Araújo (2007, p.88),
A socialização de indivíduos deve ser a prioridade das políticas
governamentais. Possibilitar que as pessoas tenham oportunidades iguais deve
ser o objetivo das políticas de inclusão social. O Estado deve estar
presente na vida do povo pobre não apenas por meio da repressão, mas por
meio da garantia a essas parcelas da população, de acesso a serviços
fundamentais para existência digna de um ser humano como saúde e educação
gratuitas e de qualidade.

Um dos temas a ser discutido no presente Estudo é a falácia expressa no
discurso que a passagem do detento por uma instituição carcerária, teria o
condão de “ressocializá-lo”, afinal de contas, como pugnar pela
ressocialização de um indivíduo que jamais teve oportunizada sua inclusão
social.
Com efeito, o pretendido tratamento através da ressocialização é
incompatível com o encarceramento. Afinal a ruptura de laços familiares e
outros vínculos humanos, são fatores que em nada ajudam a integração do ser.
Por isso o que se observa, em toda parte, é que a prisão exerce um efeito
devastador sobre a personalidade, reforça valores negativos, cria e agrava
distúrbios de conduta.
Bem pontua Mapelli Caffarena, (1997, p. 123),
La prisión es, por su propia naturaleza, una suma de carencias y
privaciones, es por excelencia un medio antipedagógico orientado hacia fines
que poco tienen que ver con las aspiraciones resocializadoras. Basta con
analizar la fragilidad de los medios llamados comúnmente “resocializadores”
para comprender la imposibilidad de alcanzar estos fines. No se trata tan
sólo de un problema de falta de voluntad política, sino de que la fisura
anómica entre la resocialización y los medios de que se dispone para
alcanzarla deviene de una imposibilidad estructural de la propia prisión.

Por sua vez Guilhermo Etcheverry (2002, p. 15) afirma: “No es posible
reeducar, resocializar, en aislamiento, redignificar y reinsertar en la
sociedad por medio del castigo”.
Temos que o processo deve ser visto de forma inversa, através do discurso da
inclusão e da socialização, como instrumento de possibilitar ao indivíduo a
sua participação social gerando meios para efetivar sua condição de membro
da sociedade.
Durkheim (1922, p.67) foi um dos percussores do conceito socialização,
considerando-o como,
Desenvolvimento conduzido pelos adultos daqueles que ainda não estão
inseridos na vida em sociedade – portanto, algo específico do período da
infância, anotando que autonomia do agir trata-se de um déficit para a vida
organizada em sociedade, à qual os indivíduos deveriam ser integrados, uma
vez que incorporavam os saberes e normas sociais vigentes, por intermédio de
indivíduos ‘já socializados’, com a finalidade de manter a coesão e a ordem
social.

Gilberto Freire (2005, p.72) anotou que socialização é a condição do
indivíduo (biológico) desenvolvido, dentro da organização social e da
cultura, em pessoa ou homem social, pela aquisição de status ou situação,
desenvolvidos como membro de um grupo ou de vários grupos.
Em suas dimensões mais amplas, os processos de socialização devem envolver o
ser humano individual, considerando-o como um espectro de experiências,
posicionamentos, saberes, estruturas emocionais, capacidades cognitivas,
desenvolvendo aptidões para determinar sua interação, comunicação e
atividade no meio social em que vive, sendo certo que estes objetivos não
poderão ser alcançados através do sistema carcerário uma vez que os
indivíduos devem ser previamente socializados através das relações
familiares, escolares, religião, sendo de fundamental importância sua
postura propositiva como anota Dubar (2000, p. 101),
Dessa forma, os autores atribuem uma participação ativa do indivíduo nas
instâncias socializadoras, conferindo a ele maior autonomia e liberdade
reflexiva. Esse indivíduo é concebido como tendo capacidade de dialogar,
questionar e escolher um universo de relações, bem como os valores que
constituem esse universo diferente dos demais.

Essas dimensões devem ser tratadas, em seu conjunto ou em suas
particularidades, segundo uma perspectiva sociológica, sendo certo afirmar
que o discurso de socialização deve e pode ser aplicado aos presos,
notadamente pessoas à margem da sociedade e dotadas de condutas desviadas
que permeiam o fenômeno criminoso, sendo certo que estes indivíduos
necessitam desenvolver capacidades, competências do agir, interesses e
qualidades pessoais em tensão com as regras, expectativas e costumes
sociais.
Aduza-se, por oportuno, que a massa carcerária nem sequer foi inserida no
contexto social, vivendo marginalizada das pautas macrossociais, não
existindo possibilidade de ser contextualizada através da exclusão, afinal
estamos tratando de cidadãos de segunda categoria, como bem explica Beiras
(1997, p. 207),
construcción de un ciudadano de segunda categoría’, este concepto nos
sugiere la existencia de ciudadanos que no solamente reciben un trato ‘de
segunda’ al momento de la aplicación de las normas penitenciarias, sino que
este tratamiento se da – incluso – desde el mismo momento de la
interpretación jurisdiccional de dichas normas.

Jock Young (2002), final do século XX, diagnostica a transição de uma
sociedade inclusiva para uma sociedade excludente, de uma sociedade que
assimila e incorpora para outra que exclui, sendo que uma solução que se
pode apontar para o sistema é exatamente a solução que José Raimundo
Carvalho (2012, p. 258-259), verbera quando estabelece um ponto de encontro
entre a socialização e inclusão,
A meta primordial do processo de inclusão social é trazer as pessoas para
uma sociedade da qual elas nunca fizeram parte até então, visando reduzir as
disparidades para integrar cada vez mais pessoas a uma condição de vida
digna, promovendo acesso equitativo aos benefícios do desenvolvimento.

O termo “incluir” vem do latim includere, que tem o significado de
compreender, abranger, conter em si, envolver, pertencer juntamente com
outros, entre os diversos sinônimos oferecidos pelo Dicionário Aurélio, de
Língua Portuguesa.
Segundo Romeu Sassaki (1997, p. 17), o movimento de inclusão social tem como
objetivo maior a construção de uma sociedade real e justa para todas as
pessoas, e seus princípios se baseiam nos seguintes pressupostos: a
celebração das diferenças; o direito de pertencer; a valorização da
diversidade humana; a solidariedade humanitária; a igual importância das
minorias; a cidadania com qualidade de vida. Situações acaso observáveis na
execução penal, tornar-se-iam fundamentais para a adaptação do condenado
para a vida em sociedade.
Anote-se que a finalidade pena da execução penal não é a retribuição,
tampouco a prevenção, merecendo um aprofundamento e discussão, restando uma
pergunta a ser respondida: a quem serve o Direito Penal? e porque a punição
é estimulada na forma de prisão?
De forma direta responde este questionamento Loïc Wacquant(1999, p.93),
A indústria da carceragem é um empreendimento próspero e de futuro radioso,
e com ela todos aqueles que partilham do grande encarceramento dos pobres
nos Estados Unidos.

A nova organização do sistema punitivo estabelece uma relação de controle de
uma população de jovens adultos que não dispõe de meios para sua integração
no mercado formal de trabalho e que se tornam úteis a organização e produção
no ambiente carcerário. Considere-se o baixo custo da mão de obra como mais
uma perversão do sistema capitalista, além de ter sido viabilizada a
privatização de prisões, gerando uma indústria fomentada pelo aprisionamento
da miséria, sendo incentivado o encarceramento, como resposta econômica,
real e eficiente, para responder aos setores exploradores deste segmento da
produção.
Além dos beneficiários diretos da indústria da carceragem, temos vários
personagens periféricos que se alimentam do fenômeno criminoso, desde o
jornaleiro que entrega as notícias dos fatos ocorridos, indo ao editor dos
programas e até mesmo o dono do jornal, afinal o journalism a sensation,
repleto de clichês acerca do endurecimento das penas criminais e do estímulo
às expedições punitivas, têm ampla aceitação de público, em especial, nos
indivíduos que estão próximos a fatos desta natureza. Os policiais, e os
agentes de segurança privada, as instituições diretamente ligadas ao sistema
punitivo: Magistratura, Ministério Público e responsáveis pela custódia dos
presos, e porque não a advocacia, professores de Direito, donos de editoras,
enfim todos acabam ganhando com o crime, daí ser uma premissa equivocada a
regra que “o crime não compensa”. Não compensa, para uns.
3.2 DA FUNÇÃO DA PENA
A pena pode ser definida, segundo Damásio E. de Jesus, como uma sanção
aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, como retribuição de seu
ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim evitar
novos delitos.
Hulsman (1993, p. 87) elenca dois elementos como característicos da pena,
tal como é entendida pela civilização ocidental:”Uma relação de poder entre
aquele que pune e aquele que é punido, que por sua vez reconhece a
autoridade do primeiro; e depois, imposição de doses de sofrimento,
penitência, dor.”

Para Guillermo Etcheverry (2002, p.17),
La finalidad de la pena privativa de la libertad es lograr que los
condenados adquieran la capacidad de comprender y respetar la ley, lo que
una vez cumplida su condena les facilitará la reinserción en la sociedad.
(…) En el tránsito del siglo XVIII al XIX los acontecimientos históricos
promueven nuevos marcos legales. Las leyes definen el poder de castigar como
función general. Dentro del arsenal punitivo de una sociedad, la cárcel es
una pieza esencial. Es la institución más severa con que cuenta el sistema
penal, y se la debe considerar como última herramienta para controlar las
conductas antisociales, es decir, el delito.

A finalidade da pena, muito se discutiu, e ainda se discute, sendo certo que
diversos estudiosos e teóricos formularam modelos que estabelecem pelo menos
três modelos para explicar a legitimidade e os fins da pena privativa de
liberdade, a saber: teoria absolutista – fins retributivos; relativa – fins
preventivos; mista – junção das finalidades retributivas e preventivas.
A primeira corrente prega que a função da pena é retribuição, afinal a
prisão é, antes de tudo, um castigo, fundado em Kant, era um imperativo
categórico. Para a Escola Clássica, responsável pela formulação desta
teoria, a pena é atribuída com a finalidade de retribuição ao mal causado
pelo crime, sendo necessária para restaurar a ordem jurídica violada.
Aníbal Bruno (1967, p.18) afirmou,
é um mal justo com que o Estado responde ao mal injusto praticado pelo
criminoso, em correspondência com a gravidade do fato, segundo o bem
ofendido, e a grandeza de sua culpabilidade e pela qual se processa a
reintegração da ordem jurídica violada.

Paulo Borges e João Guimarães, (2013, p.88) ensinam,
A função retributiva da pena é bem explicada pelo jurista Claus Roxin, que
ensina: A teoria da retribuição não encontra o sentido da pena na
perspectiva de algum fim socialmente útil, senão em que mediante a imposição
de um mal merecidamente se retribui, equilibra e espia a culpabilidade do
autor pelo fato cometido. Se fala aqui de uma teoria “absoluta” porque para
ela o fim da pena é independente, ‘desvinculado’ de seu efeito social. A
concepção da pena como retribuição compensatória realmente já é conhecida
desde a antiguidade e permanece viva na consciência dos profanos com uma
certa naturalidade: a pena deve ser justa e isso pressupõe que se
corresponda em sua duração e intensidade com a gravidade do delito, que o
compense.

Sucedendo a Escola Clássica surge, na segunda metade do século XIX, a Escola
Positiva, que defende as teorias preventivas da pena, embasada na ideia de
defesa social, na medida em que a função da pena consiste em inibir, tanto
quanto possível, a prática de novos delitos. Nesse momento, a pena não deve
mais ser vista como a retribuição, um castigo proporcional à transgressão
moral, mas sim como um conjunto de medidas sociais, preventiva e
repressivas, que vislumbrem uma defesa mais eficaz e humana da sociedade.
Patricia Ziffer (1999, p.49) anota,
Prevención general se entiende, tradicionalmente, la función intimidatoria
de la pena frente a los posibles autores. La teoría de la prevención general
positiva no es posible extraer una medida determinada de pena, pero
igualmente consideran que puede proporcionar un ‘marco’, configurado por la
‘reacción que ya debe ser tomada en serio y aquella que todavía no resulta
exageradamente estricta’.

A função preventiva da pena divide-se em dois ramos bem delineados: a
primeira, denominada prevenção geral, que se dirige à generalidade dos
cidadãos; e a segunda conhecida por prevenção especial, que se dirige
exclusivamente ao delinquente em particular.
Para Roberto Lyra (1942, p. 24-25):
As teorias da prevenção dividem-se em gerais e especiais. São gerais, quando
consideram a pena em face da coletividade, no momento preciso de exercer a
sua ação intimidativa; são especiais, quando consideram a pena em face de
determinado resumo, a prevenção geral encerra a função social; a prevenção
especial, a função individual da pena.

A prevenção geral pode ser ainda, positiva e negativa, como compreende Luis
Niño (1997, p. 104),
Prevención general negativa atribuible a la pena no se ha acreditado en la
dinámica social. Lo que sí se ha acreditado es que los gobernantes que
apuestan unívocamente a este fin preventivo-general aproximan su gestión al
terrorismo estatal. Prevención general positiva, según el cual a través de
la imposición de penas no se procura tal inhibición de energías criminales
sino el reforzamiento de los valores fundantes del Estado Y no satisface por
una sencilla razón: en la medida en que el funcionamiento de ese Estado, de
cara a la comunidad, vale decir, en sus políticas y sus realizaciones
económicas, sociales y culturales, no luzca racional para vastos sectores de
la población, ningún refuerzo lógico cabrá esperar a partir de la actuación
específica del sistema penal.

Paulo Borges e João Guimarães (2013, p.88), por seu turno, advertem:
A prevenção geral negativa nada mais é do que o uso da intimidação a pena
imposta ao infrator irá refletir na sociedade como um exemplo, ou seja,
surgirá o medo de também sofrer a mesma imposição caso cometa o delito
praticado pelo apenado. Por sua vez, a prevenção geral positiva vai além do
intuito da geral negativa, uma vez que busca disseminar na sociedade a ideia
da necessidade de se respeitar determinados valores.

Para explicar a prevenção especial colha-se o escólio de Takayanagi( 2010,
p. 1070),
a prevenção especial pode atuar de três formas: assegurando, com a prisão, a
comunidade diante dos delinquentes, intimidando o autor, por meio da pena,
para que não cometa futuros delitos; e preservando-o da reincidência
mediante a sua correção. Seria a ideia da ressocialização.

Assim a função preventiva especial negativa, que extirparia, segregaria o
indivíduo inconveniente da sociedade, e a função preventiva especial
positiva, que estaria relacionada às teses das escolas correcionalista e da
Defesa Social, estaria dirigida diretamente ao delinquente.
A rigor, podemos entender que o afastamento do deliquente apenas poderá
gerar a neutralização do mesmo, o que Jorge Perano (2009, p. 678), credita
ao discurso da prevenção especial positiva (ressocialização) a capacidade de
limitar a fundamentação da teoria especial negativa (neutralização), ou
ainda da teoria geral positiva, as quais serviriam para legitimar um
encarceramento indefinido e ilimitado.
Nos restam, ainda, as teorias mistas ou unitárias são as mais difundidas e
pretendem unificar a concepção de finalidade da pena, conciliando os
aspectos mais relevantes das teorias absolutas e preventivas, que em
conjunto trazem como justificativa para a imposição da pena a necessidade de
retribuição da afronta ao ordenamento jurídico perpetrada pelo indivíduo,
vislumbrando a sua ressocialização e reintegração ao convívio social,
aproveitando ainda para servir de exemplo para que os outros membros da
coletividade não sigam o mesmo caminho da delinquência.Porém, tais objetivos
quando reunidos, na busca por uma justificativa unitária da pena de prisão,
soam conflitantes, conforme afirma Thompson (1970, p. 9-10),
Ainda o nosso moderno sistema prisional procede numa direção muito incerta,
porque sua administração tem, necessariamente, uma série de compromissos. De
um lado, espera-se que as prisões punam; de outro, supõe-se que reformem.
Espera-se que disciplinem rigorosamente ao mesmo tempo em que ensinem
autoconfiança. São construídas para operar como grandes máquinas impessoais,
mas se espera que ajuste os homens a viver vidas comunitárias normais.
Operam de acordo com uma rígida rotina autocrática, mas se espera que
desenvolvam a iniciativa individual. Todas as regras restritivas, por demais
frequentes, obrigam o preso à ociosidade, a despeito do fato de que um de
seus objetivos primários é de ensinar aos homens como ganhar uma vida
honesta. Recusam ao preso qualquer possibilidade de autogoverno, mas esperam
que ele se transforme em um homem consciente, numa sociedade democrática.
Para alguns, as prisões não são mais do que clubes campestres, a prover as
fantasias e os caprichos dos internos. Para outros, a atmosfera prisional
parece carregada somente de amargura, de rancor e de sentimento pervertido
de frustração. E assim o esquema paradoxal prossegue, porque nossas ideias a
respeito da função das instituições correcionais, na nossa sociedade, são
confusas, vagas e nebulosas.

Após uma abordagem histórica do tema, constata-se que para as “teorias
justificacionistas”, mesmo que se considere a pena um mal, ela será sempre
um mal necessário. Dessa forma, concluindo a linha de pensamento das três
principais correntes que buscam legitimar o direito de punir do Estado,
recorremos aos pensamento de Paulo Queiroz (2005, p. 9):
Punitur quia peccatum est; punitur ut ne peccetur; punitur quia peccatum est
et ne peccetuar. Respectivamente: pune-se porque pecou (tória absoluta);
pune-se para que não se peque (teoria relativa); pune-se porque pecou e para
que não se peque (teoria mista).

Certo está Álvaro Mayrink da Costa(2014, p.21), quando aduz,
A pena de prisão não ressocializa nem proporciona a reintegração social
futura do condenado ao modelo socionormativo, opera teoricamente a tutela
dos bens jurídicos, sem conseguir reduzir o conflito violento de interesses.
Como é impossível aboli-la, cumpre ao Estado, como instrumento de prevenção
geral positiva limitadora, reservá-la aos portadores de comportamentos
transgressores de especial gravidade à ordem jurídico-social, intolerados
pela macrossociedade, e efetivar através de intervenção garantista a reforma
efetiva da gestão penitenciária diante da crise da prisão, assegurando o
respeito à dignidade da pessoa humana presa, garantida por um estado social
e democrático de direito.

E com ele concorda Guillermo Etcheverry, (2002, p.17),
Es por todos conocido que la pena privativa de libertad no tiene los efectos
declarados, ya que no repara el daño ocasionado, no es una herramienta de
resocialización y favorece la reincidencia: las condiciones indignas de la
vida en prisión destruyen progresiva e irreparablemente los rasgos de
humanidad, la subjetividad e identidad de las personas. El funcionamiento
del sistema penal sigue manifestando su ineficiencia. Desde ese punto de
vista podríamos decir que la pena privativa de libertad ha fracasado y que
al presente los penalistas no encuentran cómo suplirla. Irwin identifica
tres etapas en el deterioro de la persona privada de libertad ambulatoria:
desintegración, desorientación, degradación. Una progresión elocuente que
obliga a la acción. La idea de que la privación de la libertad prepara desde
el aislamiento a un individuo para vivir libremente y formar parte de una
comunidad demuestra ser una falacia.

Daí porque Eugenio Raul Zaffaroni (2009, p. 139) adverte:
La prisión o ‘jaula’ es una institución que se comporta como una verdadera
máquina deteriorante: genera una patología cuya característica más saliente
es la regresión, lo que no es difícil de explicar. El preso o prisioneiro es
llevado a condiciones de vida que nada tienen que ver con las del adulto; se
le priva de todo lo que usualmente hace el adulto o no conoce. Por otra
parte, se le lesiona la autoestima en todas las formas imaginables: pérdida
de privacidad y de su propio espacio, sometimiento a requisas degradantes.

As funções declaradas da pena prescrevem um dever ser e legitimam o
funcionamento de justiça; numa segunda perspectiva, a pena exerce uma função
na economia, isto é, a pena é determinada em relação aos sistemas econômicos
e sociais de determinada época e sociedade, com a finalidade de atender aos
interesses da classe dominante.
Poder-se-ia afirmar que o cárcere teria a função de Intimidação do infrator,
contudo, é pacífico o entendimento de que a pena de prisão não intimida.
Os cárceres estão abarrotados de pessoas que não se amedrontaram diante da
pena e pelas ruas circulam milhares de criminosos a praticarem toda sorte de
delitos indiferentes à possibilidade de serem presos e apenados. D’outra
banda não socializa, afinal um um meio criminógeno jamais poderá cumprir uma
função, senão de aperfeiçoamento no crime, nos fazendo concluir que este
processo de readptação, encontra alguns entraves de ordem natural,
intransponíveis, sendo eles:

3.2 ISOLAMENTO

O primeiro fator a impedir a recuperação do condenado é o isolamento ao qual
ele é submetido, pois ao adentrar nos portões e os muros de um
estabelecimento prisional, deixando o convívio com a familia e os amigos,
além de despojar-se de todos os papéis que desempenhava nos diversos núcleos
sociais, para transformar-se num encarcerado, ainda que todos os outros
males que venham a ser provocados pela prisão fossem desconsiderados, o
simples fato de estar excluído do mundo livre e de sua família, representa
um grande obstáculo à sua reabilitação.
No mundo fechado da prisão é difícil sugerir e propor respostas de
comportamento para a vida em liberdade. O homem, por sua própria natureza,
nasceu para a liberdade e não para a prisão. Se esta não lhe ofertar
possibilidade de transformação, enfrentará o desconcertante entrave de não
readaptar-se posteriormente na sociedade e tornará facilmente a delinquir.
Pontua Odete Oliveira (2003, p. 51),
Privação de liberdade é o pior dos sofrimentos que se pode impor ao ser
humano. O rompimento compulsório com a família, principalmente com os
filhos, com o recinto e a privacidade do lar, via de regra, é o mais difícil
de suportar.

Leciona Tiago Cabral (2006, p. 22),
A manutenção do contato e o convívio com a família proporcionam condições
para estruturar o ambiente familiar e tornam possível ao condenado o retorno
ao lar, encontrando em seus entes, pessoas carinhosas, saudáveis, e que o
amam, o conforto das longas horas de solidão e aprisionamento.

Assim enfrentamos o primeiro ponto a justificar a dificuldade de adptação do
condenado, qual seja, o isolamento decorrrente da prisão e a perda do
referencial da família e amigos, instrumento fundamental para a busca do
equilibrio do recluso.

3.3 PRIVAÇÕES

3.3.1 PRIVAÇÃO DE BENS
Considere-se que o encarcerado ao estar sob o julgo do sistema penitenciário
fica privado de possuir qualquer objeto que possa traduzir alguma espécie de
conforto material, isto porque, ao ingressar no presídio, todos os seus
objetos pessoais são entregues a administração prisional, resguardando-se
poucos artigos de higiene pessoal.
Como esclarece Goffmann (1974, p.26-7),
Uma vez que o internado seja despojado de seus bens, o estabelecimento
precisa providenciar pelo menos algumas substituições, mas estas se
apresentam sob forma padronizada, uniformes no caráter e uniformemente
distribuídas (…) o fato de não dar chaves aos internos e as buscas e os
confiscos periódicos de propriedade pessoal acumulada reforçam a ausência de
bens.

Azevedo (1999, p. 50), afirma,
O cárcere contraria todo ideal educativo moderno de estimular a
individualidade e o auto-respeito, alimentado pelo respeito ao educador. Os
rituais de degradação no começo da detenção, despojando o encarcerado dos
símbolos exteriores da própria autonomia (vestimentas e objetos pessoais)
constituem o oposto. A educação fortalece o sentimento de liberdade e
espontaneidade do indivíduo; a vida carcerária, como universo disciplinar,
tem o caráter repressivo e padronizador. (sem grifos no original)

3.3.2 PRIVAÇÃO DAS MÍNIMAS CONDIÇÕES DE PRIVACIDADE E HIGIENE

Estabelece a Lei de Execuções Penais(Brasil, Legislação Penal, Lei 7.210/84)
no seu art. 88,
O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho
sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração,
insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).

As condições encontradas nos estabelecimentos prisionais são outros aspectos
que não permitem a reeducação do condenado, pois são extremamente precárias.
Embora a LEP traga comando normativo das condições mínimas de salubridade,
espaço e higiene, notadamente as condições assistidas no Brasil, passam
longe das razoáveis para educar um indivíduo para ser reintegrado ao
convívio social.
A matéria também é disciplinada pela ONU, através das Regras Mínimas para o
tratamento de reclusos, (nº 10. 2005): “Reconhece que os locais das prisões
devem corresponder às exigências mínimas de higiene, espaço físico mínimo,
iluminação, calefação e arejamento.
Dessa forma, as más condições de higiene, por sua vez, representadas pela
falta de circulação de ar, a grande concentração de umidade, os odores
fortes, a imensa quantidade de insetos e parasitas, são encontradas nas
celas, corredores, e até mesmo, nas cozinhas, debilitando a saúde dos presos
e comprometendo o desenvolvimento de qualquer tarefa que tenha por objetivo
reintegrá-los à sociedade, sendo um segundo aspecto negativo à
ressocialização.

3.3.3 PRIVAÇÃO DE AUTONOMIA

Uma das características do sistema prisional é o seu fechamento ou seu
caráter total representado pela barreira à relação social com o mundo
externo e por proibição à saída que, muitas vezes, estão incluídas no
esquema físico, por exemplo: portas fechadas, paredes altas, arames
farpados, poços, fossos, águas, florestas ou pântanos.
Demais disto a sujeição do indivíduo ao convívio atrás das grades, o submete
a regras rígidas estabelecidas pela administração prisional fazendo que eles
sejam submetidos a uma vida fechada e formalmente administrada.
Pontua Odete Oliveira (2003, p. 53),
No sistema prisional, o estado de subordinação à direção do estabelecimento,
aos guardas, aos regulamentos, às regras, aos horários, às ordens e
contra-ordens e revistas é total. Tal situação não enseja a mínima
possibilidade de escolha ou opção por parte do preso. A obediência ao
comando e ao corpo burocrático não permite ao interno manifestar sua
opinião, externar sua vontade ou interesse. A consequência desta
característica de completo cerceamento é, sem dúvida, de uma grande apatia
ou frustração indizível.

O automatismo coercitivo a que são submetidos todos os reclusos retira-lhes
completamente a iniciativa e até os desejos mais reservados, a ponto de se
apresentarem hesitantes entre o fazer e o não fazer, com o próprio senso de
autodeterminação alterado, aguardando que outros tomem decisões por eles.

3.3.4 PRIVAÇÃO DE SEGURANÇA
Embora possa parecer um paradoxo o fato do indivíduo estar submetido a uma
instituição total – penitenciária, implica numa constante sensação de
insegurança.
A privação de segurança se faz sentir com grande intensidade no dia-a-dia do
prisioneiro. Nunca é possível saber o que poderá acontecer num presídio:
violência, brutalidade e ameaça que ocorrem nos meios prisionais,
culminando, muitas vezes, em rebeliões, motins, fugas e mortes.
Esta sensação coloca os presos em estado de alerta diuturnamente pois a
reprodução do processo de violência pode desencadear uma resposta estatal
imediata e com consequencias graves à integridade física e psicológica do
encarcerado.

3.3.5 PRIVAÇÃO DE RELAÇÕES HETEROSSEXUAIS

Por expressa previsão da legislação brasileira é possível a visita íntima
dos internos submetidos ao sistema prisional do nosso país.
Estabelece o Art. 41 da LEP (Brasil, Legislação Federal, Lei 7.210/84):
Constituem direitos do preso:
[…]
X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em alguns dias
determinados (…)

Reforçando a legislação existente, a resolução número 1 do Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), publicada em 30 de Março de
1999, recomendava aos Departamentos Penitenciários Estaduais ou órgãos
congêneres que fosse assegurado o direito à visita íntima aos presos de
ambos os sexos, recolhidos aos estabelecimentos prisionais.
Todavia, o exercício deste direito nem sempre é respeitado no sistema
prisional, seja pelas exigências estabelecidas pela própria administração
prisional, seja pela falta de condições materiais para a execução do
benefício, estando muitas vezes o prisioneiro privado da possibilidade de
contato sexual com seu(a) parceiro(a). Isto nos faz concluir que para o
detento, uma das mais terríveis de todas as privações e sofrimentos impostos
na prisão é o tolhimento da realização de atos sexuais que estava acostumado
na sua vida extra-muros. Ao estar impedido de manter relações
heterossexuais, sente-se ferido em sua masculinidade e, então, é acometido
de verdadeiro sentimento de castração simbólica, ou então, opta por relações
de caráter homosexual na própria prisão.
Demais disto, o ócio e a ausência de exercícios físicos aumentam ainda mais
o desejo sexual, nas palavras de Jiminez Ásua (apud DONNICE, 1976, p.74): “A
incontinência sexual é uma espécie de pena acessória principal”.
Júlio Fabbrini Mirabete (2004, p. 125), por sua vez, observa que,
a abstinência sexual pode causar graves danos à pessoa humana, podendo
desequilibrar a pessoa e favorecer condutas inadequadas. Desse modo, vem
ganhando corpo nas legislações a orientação de se conceder permissão de
saída ou visita íntima como solução do problema sexual das prisões.

Importante anotação sobre o tema faz Tiago Cabral, (2006, p. 27),
A repressão do instinto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da
personalidade do indivíduo. Enfim, torna-se impossível falar de
ressocialização em um meio carcerário que deforma e desnatura um dos
instintos fundamentais do homem, e ainda tortura física e psicologicamente o
condenado, não dando a mínima condição para um tratamento digno e que surta
resultado.

A visita íntima é um dos fatores de manutenção da conexão do presidiário
com o mundo exterior e funciona como incentivo efetivo para que o mesmo,
passado o período de cumprimento da pena, seja reinserido no seu núcleo
familiar e social, contando com certas peculiaridades como afirma Carvalho,
(2005, p.3),
Assim, a visita íntima do marido, mulher, companheiro ou companheira, deverá
estar sempre condicionada ao comportamento do preso, à segurança do presídio
e às condições da unidade prisional sem perder de vista a preservação da
saúde das pessoas envolvidas e a defesa da família. Trata-se de uma questão
delicada a ser encarada com muita responsabilidade, em benefício da própria
população carcerária. No entanto, a visita da família é um direito
incontestável, que deve ser incentivado, como elemento de grande influência
na manutenção dos laços afetivos e na ressoacialização do preso.

Além disto, temos que muitas vezes os presidiários acabam sendo vítimas
“assaltos sexuais”, gerando inegável violação ao inelieável direito de
preferência sexual, pela perda da autonomia do consentimento e reflexamente
ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Na verdade, incorre-se em grave contradição quando se busca a correção e a
(re)socialização do apenado e, ao mesmo tempo, ignora-se o problema sexual
ou se pensa que este não requer atenção especial.
Conforme assinala Cézar Bitencourt (2001, p. 202):
A repressão do instinto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da
personalidade do indivíduo. Enfim, é impossível falar de ressocialização em
um meio carcerário que deforma e desnatura um dos instintos fundamentais do
homem.

3.3.6 PRIVAÇÃO DE UM TRATAMENTO HUMANITÁRIO

Uma outra questão que apresenta-se como empecilho a socialização é a forma
como o preso acaba sendo tratado na estrutura penitenciária, perdendo sua
identidade e passando por humilhações e tratamento desumano e degradante.
Logicamente que o homem é produto do meio, e também os responsáveis pelo
encarceramento encontram-se custodiados, explico: conviver todos os dias em
um estabelecimento prisional afeta diretamente os próprios agentes do
sistema, associe-se a este fato, o baixo nível cultural dos guardas
prisionais, via de regra, e a ausência de critério seletivo têm criado
grande vulnerabilidade do sistema penitenciário.
Kent (1988, p. 53-4) sustenta,
Las ideas y las normas – por excelentes que fueren – de poco servirán sin la
coetánea presencia de un personal preparado y motivado para cumplir un reto
resocializador de significativa monta, razón por la cual deberá ponerse
especial cuidado en la selección, en la formación y en el perenne
perfeccionamiento de las personas llamadas a afrontar este compromiso tan
noble y humano que les permita sentirse útiles a sí mismos y, sobretodo, en
gracia de una pléyade de marginados que tienen derecho inalienable a
regresar para el disfrute de las bondades incomensurables de la libertad.

A falta de um plano de carreira, de uma remuneração digna, de condições
salubres de trabalho, de uma jornada de trabalho adequada, impõe aos agentes
de presídio um nível de stress elevadíssimo que repercute, muitas vezes, no
tratamento dos internos.
Desse modo, a deficiência na seleção dos agentes penitenciários e a escassez
de recursos para a correta manutenção dos estabelecimentos, além da
preocupação exacerbada com a disciplina e a segurança para evitar rebeliões
e fugas, conduzem a uma precária e, às vezes, brutal assistência aos presos.
Assim podemos afirmar que, na maioria dos casos, o tratamento dispensado aos
internos além de ser desumano é humilhante, sádico e impiedoso,
consubstanciado em maus-tratos verbais (insultos, grosserias, gritos, uso de
palavras ofensivas) e físicos (pancadas, tapas, chutes, murros, enfim, todo
tipo de crueldade) que só contribuem para a degradação moral do condenado.
Acreça-se a este fato que a manutenção do objetivo maior do Estado está no
custodiamento e na manutenção da ordem interna dessa sociedade, mas o
desenvolvimento desta ação concentra um poder repressivo nas mãos de muito
poucos, abrindo infindável abismo entre os mandantes e os mandados,
verdadeiro regime totalitário, em que os presos são submetidos a um
exacerbado controle extremo, por meio de constante vigilância e minucioso
regulamento, a uma estrutura severa e limitada, de privacidade impossível,
em que a conduta e a intimidade de cada um são observadas pelos demais.
De fato, o convívio no estabelecimento penitenciário, desrespeitando as
regras mínimas de tratamento de preso, ofende a dignidade da pessoa humana e
desrespeita os direitos fundamentais. De mais a mais, é imposição que recai
sobre o Estado respeitar, proteger e promover as condições que viabilizem a
vida com dignidade.
Sobre este ponto, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem afirmado
reiteradas vezes que,
Quien sea detenido tiene derecho a vivir en condiciones de detención
compatibles con su dignidad personal y el Estado debe garantizarle el
derecho a la vida y a la integridad personal.

Sendo certo que o Estado é único responsável pelos estabelecimentos
destinados a custódia de pessoas detidas e deve garantir os seus direitos,
sendo corrente na jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, senão vejamos,
la Convendón toda persona privada de Iibertad tiene derecho a vivir en
condiciones de detcnción compatibles con su dignidad personal y eI Estado
debe garantizarle el derecho a la vida y a la lntegridad personal. En
consecuencia, el Estado, como responsable de los establecimientosde
detención, es el garante de estos derechos de los detenidos (Caso Neira
Alegría y otros. Sentencia del 19 de enero de 1995. Serie C, nº 20, pár.60.)

No mesmo sentido,

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Durand y Ugarte, Sentencia de
16 de agosto de 2000. Serle C, nº 68, párr.78.

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Cantoral Benavides. Sentecia
del 18 de agosto de 2000. Seric C, n.º69, párr.87.

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Castillo Petruzzi. Sentencia
del 30 de mayo de 1999. Serie C, nº 52, párr.195.
A Corte Internacional de Justiça, na sentença do “caso Barcelona Traction”,
sustentou que,
Los principios y las reglas concernientes a los derechos fundamentales de la
persona humana, crean obligaciones respecto de la Comunidad Internacional en
su conjunto’. La importancia de los derechos hace que ‘Todas los Estados
puedan ser considerados como teniendo un interés jurídico en que esos
derechos sean protegidos, por lo cual las obligaciones de que se trata son
obligaciones ‘erga omnes’ (CIJ, 5-2-1970).

3.4 DOS DIREITOS NÃO ATINGIDOS PELA CONDENAÇÃO

Estipula o art. 38 do Código Penal Brasileiro (Brasil, Legislação Federal,
Lei 7.209/84):
Art. 38 – O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da
liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade
física e moral. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Considere-se a prisão como resposta estatal decorrente de ofensas as regras
do contrato social (Rosseau). Por estas mesmas normas cada cidadão abre mão
de uma parcela dos seus direitos em favor do grupo social com o objetivo de
harmonizar a convivência com o respeito a todos os direitos não atingidos
pela sanção estatal.
A LEP prevê em seu art. 3º, que são assegurados ao condenado todos os
direitos não atingidos pela sentença. O preso, apesar de perder uma gama de
direitos normalmente usufruídos por aqueles em liberdade, não pode perder
todo e qualquer direito, sem qualquer relação com o cumprimento da pena.
Assim, não deixa de ser um sujeito de direitos, mesmo que esta afirmação não
possa ter a plenitude que teria no caso de se falar de um indivíduo em
liberdade.
Joe Graeff Filho ( 2011, p. 202 ) observa,
Quando o infrator for levado ao cárcere, o Estado deve ter como premissa
básica o fato que está retirando do sujeito apenas sua liberdade, parte que
apesar de integrar sua dignidade, abriu mão ao praticar o delito, mas todas
variáveis devem ser garantidas, pois, a prisão não deve, para o bem da
própria sociedade, ser vista como um castigo, mas sim como a oportunidade
reconstrução dos preceitos éticos esquecidos. Como um retorno ao começo,
inicia-se novo processo de educação informal e se necessário formal. A
correção pela prisão deve visar o preenchimento das lacunas deixadas na
formação do indivíduo e que propiciaram o desvio delitivo como forma de
garantir uma nova oportunidade.

Por esta razão o preso tem assegurado o direito ao respeito de sua
integridade física (CF art. 5°, XLIX), sendo passível de apuração de
responsabilidade qualquer abuso neste sentido, seja na condição de abuso de
autoridade (Brasil, Legislação Federal, Lei 4.898/65), ou nas disposições da
Lei de Tortura (Brasil, Legislação Federal, Lei 9.455/97).
A condenação criminal transitada em julgado suspende automaticamente os
direitos políticos, enquanto durarem seus efeitos (CF, art. 15, III),
consoante a lição de SILVA: (2013, p.349): “O núcleo fundamental dos
direitos políticos consubstancia-se no direito eleitoral de votar e ser
votado, embora não se reduza a isso”.
Não podemos perder de vista que a condenação em caráter definitivo, gera em
favor do Estado um título executivo, sentença penal transitada em julgado,
que encerra um comando mandamental referente ao tempo de custódia que será
submetido o condenado, contudo, embora custodiado, permanecerão incólumes
diversos direitos do condenado, tais como:
a) O direito à vida: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade”. (art., 5°, caput, da CF). Desta
forma é dever do Estado zelar pela preservação do direito a existência do
condenado, não podendo, em hipótese alguma, sonegar este direito sob pena de
grave violação aos Direitos Humanos;
b) O direito à integridade física, psíquica e moral: prevê o art., 5, III,
da Constituição Federal, que “ninguém será submetido a tortura nem a
tratamento desumano ou degradante”, e em seu inciso V, assegura o direito de
resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material,
moral ou à imagem. Complementa no inciso X do Art. 5º, da carta política,
que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”, além da individualização da pena, previsto no
inciso XLVI, do art. 5º da CF; assim, uma vez entregue a custódia estatal o
preso tem garantido que não será submetido a quaisquer espécie de violência,
sobretudo, a tortura, além de ter preservado o direito à imagem;
c) O direito à liberdade de convicção religiosa: é inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a
suas liturgias (art. 5º, VI da CF). E ainda, nenhum preso ou internado
poderá ser obrigado a participar de atividade religiosa (art. 24, § 2º da
LEP). O Direito à religião também é previsto no art. 5º, VII da CF/88;
d) Direito à instrução: todo cidadão terá direito ao ensino fundamental,
obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para
todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria (art. 208, I, CF). No
art. 215, da Constituição Federal, está previsto que o Estado garantirá a
todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura
nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das
manifestações culturais;
Nas unidades prisionais a assistência educacional compreenderá a instrução
escolar e a formação profissional do preso e do internado (art. 17 da LEP).
O ensino fundamental será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da
Unidade Federativa (art. 18 da LEP). Já o ensino profissionalizante será
ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico (art. 19 da
LEP).
A mulher condenada à pena restritiva de liberdade, terá ensino profissional
adequado à sua condição. Todas as atividades educacionais podem ser objeto
de convênios com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou
ofereçam cursos especializados. Em atendimento às condições locais,
dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as
categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e
didáticos;
e) Direito à assistência jurídica: o Estado deverá prestar assistência
jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos
(art. 5º, LXXIV, da CF). E ainda, os artigos Art. 15 e 16 da LEP garantem a
assistência jurídica, destinada aos presos e aos internados sem recursos
financeiros para constituir advogado. As Unidades da Federação deverão ter
serviços de assistência jurídica nos próprios estabelecimentos penais;
f) Direito ao uso do nome: constitui um dos direitos do preso o chamamento
nominal (art. 41, XI da LEP). Os apelidos e a numeração são proibidos nas
unidades prisionais.
g) Direito à alimentação, alojamento e vestuário (art. 41, I da LEP). A
assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de
alimentação, vestuário e instalações higiênicas (art. 12 da LEP);
h) Direito a tratamento médico, farmacêutico e odontológico;
i)Direito ao trabalho remunerado. O direito ao trabalho é regulamento pelo
artigo 39 do Código Penal e art. 28 a 37 da LEP. O trabalho do condenado,
como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa
e produtiva;
j) Direito de comunicar-se reservadamente com seu advogado;
k) Direito à previdência social. O art. 41 da LEP resguarda os direitos à
previdência social, nos termos da art. 43 da LOPS, além do seguro contra
acidente de trabalho;
l) Direito à proteção contra qualquer forma de sensacionalismo (art. 41,
VII, da LEP;
m) Direito de igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da
individualização da pena (art. 41, XII da LEP);
n) Direito a visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias
determinados (art. 41, X, da LEP);
o) Direito de contato com o mundo exterior por meio de correspondência
escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a
moral e os bons costumes (art. 41, XI, da LEP e art. 5º XII da CF);
p) É garantido o direito de propriedade, seja ela material ou imaterial,
(art. 5°, incisos XXII, XXVII da CF), ainda que o preso não possa
temporariamente exercer alguns dos seus direitos;
q) O direito a indenização por erro judiciário ou judicial está guarnecido
pelo art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal, quando determina que o
Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar
preso além do tempo fixado na sentença;
r) Todo preso tem o direito de ser informado de seus direitos, entre os
quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família
e de advogado (art. 5º LXIII, da CF);
s) O preso também tem direito à identificação dos responsáveis por sua
prisão ou por seu interrogatório policial (art. 5º LXIV, da CF);
Podemos afirmar que administração penitenciária tem o dever de respeitar os
direitos fundamentais dos reclusos de forma a assegurar o exercício de todos
os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei e a esse dever
corresponde a obrigação do preso de respeitar as normas do regimento interno
reguladoras da vida do estabelecimento. Assim é vedado por lei qualquer
manifestação de exercício arbitrário do poder, através de ato de violência,
intolerância, irracionalidade ou em confronto com os princípios consagrados
na Carta Política. Restando preservados o direito à vida, à dignidade, à
liberdade, à privacidade, estes em coordenação ao princípio da dignidade da
pessoa humana.
Note-se que a execução penal deve ser regida pelo princípio da legalidade e
que assegura que os presos só podem ter restrições de direitos quando
previamente previsto em lei, garantindo ao condenado liberdade de
pensamento, união familiar, privacidade.

3.5 DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

Outro princípio que assegura efetivação dos direitos dos presos concerne ao
princípio da individualização da pena que propõe que a pena seja aplicada
àquela pessoa individualmente considerada, de forma a possibilitar o livre
desenvolvimento da sua personalidade individual e que deve haver proporção
entre ação e reação, entre gravidade do crime e gravidade da pena e que a
pena deve ser cumprida dentro do marco constitucional de respeito à
dignidade do sentenciado e não em função dos anseios sociais de punição.
Neste sentido a individualização ocorre num primeiro momento com adoção do
art. 59 CP e seus incisos, devendo o juiz partir para a fixação da
pena-base, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequencias do
crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja
necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. A
individualização da pena para além de ser um direito fundamental, conforme
dispõe o art. 5° incisos XLV e XLVI da Carta Maior, está estritamente
vinculada aos princípios e garantias do Estado de direito e à política
criminal definida pela Constituição, exigindo uma estreita correspondência
entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a ser aplicada, de
maneira que a pena atinja suas finalidades de prevenção e repressão. Assim,
a imposição da pena depende do juízo individualizado da culpabilidade do
agente (censurabilidade de sua conduta), sendo uma garantia do condenado
contra o arbítrio judicial.
Outro princípio que assegura efetivação dos direitos dos presos concerne ao
princípio da individualização da pena que propõe que a pena seja aplicada
àquela pessoa individualmente considerada, de forma a possibilitar o livre
desenvolvimento da sua personalidade individual e que deve haver proporção
entre ação e reação, entre gravidade do crime e gravidade da pena e que a
pena deve ser cumprida dentro do marco constitucional de respeito à
dignidade do sentenciado e não em função dos anseios sociais de punição.
A individualização da pena é um direito fundamental, conforme dispõe o art.
5° incisos XLV e XLVI da Carta Maior (Brasil, Legislação Federal,
Constituição Federal 88):
A lei regulará a individualização da pena (…) e nenhuma pena passará da
pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do
perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e
contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido,
respectivamente.

O fundamento individualizador da pena (Strafzumessungsgrund), na concepção
clásica Spendel (Günter Spendel. Zur Lehre, p. 1954, p. 191.) comprende tres
significados: real, final y lógico,
el concepto ‘fundamento individualizador de la pena’ puede entenderse, en
primer lugar, como “fundamento real” (Realgrund), o causa essendi de la
medida de la pena. Con ello se quiere aludir a los antecedentes de hecho y
circunstancias que necesariamente tienen que ser tenidas en cuenta. Los
ejemplos que señala el autor son clarificadores: el extraordinario valor de
las cosas robadas, la especial brutalidad de unos malos tratos, o el número
de muertos como consecuencia de una acción imprudente. En segundo lugar,
tiene el significado de ‘fundamento final’ (Zweckgrund) o causa finalis, lo
cual significa preguntarse por el fin que se persigue con la imposición de
la pena. Por último, está el ‘fundamento lógico’ (logischer
Strafzumessungsgrund) o ratio cognoscendi, que vincula los presupuestos de
la individualización con la individualización misma.

A individualização da pena, pelo modelo atual, se dá em três fases: legal,
judicial e administrativa. No primeiro momento, o legislador escolhe os bens
jurídicos que irá proteger, aquilata a forma de proteção, estabelecendo o
comando secundário da norma penal com o seu carater sancionador; No segundo
momento, o Estado Juiz, através do Poder Judiciário, encontrando a ativação
do tipo penal através da conduta, subssume o atuar do agente a norma penal
formando a tipicidade e delimitando, no caso concreto, a quantidade de pena
aplicável a infração, e finalmente, no momento em que o título judicial se
torna firme, sentença penal transitada em julgado, temos por parte do Poder
Executivo o acompanhamento da execução penal de forma individualizada.
José Guzmán Dalbora aborda o Tema (2010, p. 128),
La tripartición de la individualización penal en unas etapas legal, judicial
y administrativa tampoco se avienen con la Constitución de un Estado de
Derecho. Bien mirado, el desprecio por la individualización legal, así como
la dilatación de las atribuciones jurisdiccional y administrativa en las
especies judicial y penitenciaria.

Carmem Silvia de Moraes Barros (2001, p. 129) afirma que a execução penal,
bem como as demais fases de individualização da pena, está estritamente
vinculada aos princípios e garantias do Estado de direito e à política
criminal definida pela Constituição, no que concorda Alexandre de Moraes
(2007), ao ponderar que o referido princípio exige uma estreita
correspondência entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a
ser aplicada, de maneira que a pena atinja suas finalidades de prevenção e
repressão.
A primeiro momento da individualização, ocorre na esfera legislativa,
conforma anota Patricia Ziffer, (1999, p. 61),
Las valoraciones previamente dadas por el legislador, reflejadas en el marco
penal, son vinculantes para el juez, quien debe dejar de lado sus propias
valoraciones y aplicar las valoraciones legales. Según Bruns, las
valoraciones judiciales deben ceder paso a las del legislador aun en caso de
duda respecto de la constitucionalidad de la escala.

Posteriormente a individualização ocorre perante o Poder Judiciário, e de
acordo com o caso concreto, seguindo as diretivas do art. 59 CP e seus
incisos, o que Raymond Saleilles, chamou de “adaptación de la pena al
individuo”, devendo o juiz partir para a fixação da pena-base, atendendo as
regras do art. 59 do CP.
Este modelo apresenta três teorias que buscam explicar a individualização
judicial da pena, conforme ensina, Eduardo Demetrio Crespo (1999, p. 43),
Modelos principales de solución al problema: TEORÍA DE LA PENA EXACTA O
PUNTUAL (Punktstrafetheorie) considera posible calcular exactamente en el
caso concreto cuál es la pena que corresponde a la culpabilidad del autor y,
aunque dentro de ciertos límites cabe tener distinta opinión sobre la pena
aplicable a un caso concreto, esto se debe a la limitación del conocimiento
humano sobre el problema de la culpabilidad. LA TEORÍA DEL ESPACIO DE JUEGO
(Spielraumtheorie) y LA TEORÍA DEL VALOR JERÁRQUICO DEL EMPLEO
(Stellungswerthearie), buscan el equilibrio entre la función preventiva de
la pena y de sus limitaciones a través de los principios de proporcionalidad
a la gravedad del injusto y a la culpabilidad del autor. La “teoría del
espacio de juego”, elaborada por la jurisprudencia alemana, afirma que la
pena adecuada a la culpabilidad comprende un marco determinado entre un
máximo y un mínimo. El marco de la culpabilidad no es sino una fase
intermedia en el camino para la determinación de la pena última, que debe
ser una pena puntual. Una cuestión importante es que este marco no debe
confundirse con el marco de la revisabilidad del arbitrio judicial.

Fabiano Yuji Takayanagi (2010, p .1067) anota,
A aplicação da pena privativa de liberdade deve seguir um procedimento
trifásico, no qual o magistrado deverá adotar o seguinte caminho: a fixação
da pena-base, para então, levar em consideração as circunstâncias atenuantes
e agravantes, por fim, adotar as causas de diminuição e aumento de pena,
conforme dita o artigo 68 do Código penal, motivando cada passo adotado
respeitando o art. 93, IX da Constituição Federal, sob pena de nulidade da
decisão.

Patricia Ziffer (1999, p.49) sustenta,
La individualización de la pena es el acto por el cual el juez pondera la
infracción a la norma y la transforma en una medida de pena determinada. La
magnitud de la pena es siempre expresión de la ponderación del ilícito
culpable; no es otra cosa que la ‘cuantificación de la culpabilidad.’

Manuel de Rivacoba( 995, p.55) por sua vez observa,
Individualización el proceso por el cual se adapta y concreta para el
singular suceso delictivo la abstracta previsión penal de la ley para la
especie o categoría criminosa a que pertenezca, escogiendo para aquél y
haciendo cumplir al reo la magnitud y la posibilidad, de las comprendidas
dentro de los limites de dicha previsión.

A individualização da pena para além de ser um direito fundamental, está
estritamente vinculada aos princípios e garantias do Estado de Direito e à
política criminal definida pela Constituição, exigindo a apreciação do juízo
individualizado da culpabilidade do agente (censurabilidade de sua conduta),
sendo uma garantia do condenado contra o arbítrio judicial.
Mir Puig (apud CRESPO 1999, p. 32) assinala que,
por ‘determinación de la pena’ se entiende la fijación de la pena que
corresponde al delito, y que ello afecta tanto a la clase como a la cantidad
de pena, incluyendo en un sentido amplio la decisión acerca de la suspensión
de la pena o su sustitución por otras penas o por medidas de seguridad.
Aclara, además, que en ese esquema la determinación de la pena posee un
momento legal y otro judicial, a los que debe añadirse la intervención de la
Administración penitenciaria en la ejecución de las penas privativas de
libertad.

Fabiano Yuji Takayanagi (2010, p .1067) informa: “para a dosimetria da pena,
deve o julgador ter uma cuidadosa ponderação dos efeitos étnico-sociais da
sanção penal e das garantias constitucionais, especialmente a garantia da
individualização do castigo”.
José Guzmán Dalbora (2010, p. 115),
De ahí que la individualización tiene que ser refractaria a la
conmensuración de la pena, a la exigencia valorativa de graduarla según el
hecho concreto del autor, y que la vieja individualización objetiva, atenta
nada más que a la gravedad del resultado antijurídico, tampoco merece aquel
rótulo, sino el de un ensayo imperfecto e incompleto de conmensuración.

Manuel de Rivacoba (1995, p.59),
La piedra basal o el punto de partida de la individualización de la pena
por el juez reside en su apreciación de la intensión o la extensión del
perjuicio inferido por el delito que está juzgando al correspondiente bien
jurídico, o de la situación de riesgo creada por aquél para éste o en las
infracciones permanentes, del grado y la duración de la compresión que
impida o reduzca su normal goce o ejercicio. Sólo en los delitos cuyo
resultado consiste en la destrucción total del respectivo bien jurídico no
cabe una graduación de lo injusto; y así, efectivamente, desde un punto de
visa objetivo, hablando sólo de antijuridicidad, no hay un homicidio más
grave que otro, sino que todos son iguales.

Finalmente a fase de individualização na esfera administrativa, isto é,
quando irrecorrivelmente condenado passa a executar a pena, devendo o Estado
Juiz classificar o apenado de acordo com as suas condições individuais ao
fim de garantir a sua segurança e que o cumprimento da pena atinja seus
reais objetivos.
José Guzmán Dalbora (2010, p. 125), explica,
Aquí interviene la individualización administrativa, encomendada a la
administración penitenciaria. En ella reposa el quicio de la
individualización, consistente en definir el régimen aplicable al sujeto y
su duración, con lo que Saleilles viene a parar, como quienes le precedieron
en este rumbo intelectual, en la sentencia indeterminada.

Para efeito de efetivação do postulado de garantia expresso na Carta
Política é garantido ao preso atenção ao devido processo legal na apreciação
dos seus requerimentos e eventuais punições que devem ser apreciados e
julgados por juiz natural e imparcial, garantido o contraditório com
produção de provas, a ampla defesa com assistência técnica indispensável,
que as decisões sejam fundamentadas para proporcionar análise por outras
instâncias, além do direito a um processo sem dilações indevidas.
Finalmente fica assegurado ao preso atenção ao princípio da humanidade que
assegura ainda o direito de cumprir pena perto dos familiares
(identificando-se com o princípio da intranscendência da sanção penal, pelo
qual a pena não passará da pessoa do condenado); direito à intimidade, à
privacidade, à liberdade de expressão e ao sigilo da correspondência.
Portanto, podemos concluir que é intolerável toda e qualquer forma de
arbitrariedade por parte da autoridade administrativa e as finalidades de
não-dessocialização e de harmônica integração social do preso, devem guiar
as medidas que se adotem durante o cumprimento da pena, devendo a autoridade
judicial garantir os direitos dos presos e determinar o seu cumprimento no
sistema penal e penitenciário
Ainda neste sentido, prescreve a LEP, art. 10º (Brasil, Legislação Federal,
Lei 7.210/84): “A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado,
objetivando prevenir o crime e orientar o retorno a convivência social”.

3.6 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DOS RECLUSOS

As regras mínimas para tratamento de reclusos são normas aprovadas no
Primeiro Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o
Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra em 1955.
Estas regras não pretendem descrever em pormenores como deve ser o modelo de
sistema penitenciário, buscam apenas, fulcradas no consenso geral do
pensamento desta época, e nos elementos essenciais dos mais adequados
sistemas contemporâneos, estabelecer o que geralmente se aceita como sendo
bons princípios e práticas no tratamento dos reclusos e na gestão dos
estabelecimentos prisionais.
Anote-se que são regras que servem de referência para as diversas nações
mundiais e podem e devem ser aplicadas em todos os locais e em todos os
momentos. Demais disto, pretendem proteger os Direitos Humanos no seu
conjunto, através de condições mínimas aceitas como adequadas pelas Nações
Unidas.
Por outro lado, as regras abrangem uma área relativamente à qual o
pensamento evolui rapidamente, seja pela dinâmica social como pelas novas
tecnologias assimiladas pelo sistema e os desafios criados pelos presos.
Considerando que as regras não objetivam impedir experiências e práticas,
desde que as mesmas sejam compatíveis com os princípios e tentem incrementar
a realização dos objetivos das regras no seu conjunto.
Sobre elas se manifestou Luiz Garrido Guzmán (1976, p. 28),
El objeto de estas Reglas Mínimas es exponer los principios y las prácticas
que generalmente se aceptan como adecuados para el tratamiento de los
reclusos y la administración de los establecimientos penitenciarios. Con
este documento quedan coronados con éxito los persistentes esfuerzos
realizados bajo los auspicios de la Sociedad de Ias Naciones y, más
recientemente, de las Naciones Unidas, por resolver la palpitante cuestión
del tratamiento justo y humano de los delincuentes, presos o condenados a
penas de privación de libertad.[…] Las Regias Mínimas son, en cierto
sentido, una ley-tipo que se ofrece para su adaptación e incorporación a los
ordenamientos legales y a la práctica correccional en general. Desde hace
tiempo, la reforma penitenciaria se ha considerado como aquel aspecto de la
defensa social en el que el establecimiento explícito de normas es más
necesario y posible. En ellas se estudian prácticamente la totalidad de los
problemas que afectan a la realidad penitencaria.

3.7 DO PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

A socialização é um processo de influência mútua entre uma pessoa e seus
semelhantes, um processo que resulta da aceitação dos padrões de
comportamento social e da adaptação a eles. Ela se divide em dois caminhos:
a Socialização primária: onde a criança aprende e interioriza a linguagem,
as regras básicas da sociedade, a moral e os modelos comportamentais do
grupo a que se pertence, sendo de axial importância para o indivíduo e deixa
marcas muito profundas em toda a sua vida, já que é aí que se constrói sua
primeira visão de mundo e a formação do seu caráter, e a socialização
secundária, através da qual todo e qualquer processo subsequente que
introduz um indivíduo já socializado em novos setores, do mundo objetivo da
sua sociedade (na escola, através dos amigos, no trabalho), tem a
expectativa de servir como elemento de aprendizagem para o convívio em
sociedade, ou grupo, depositam neste indivíduo, novas formas de aculturação.

3.7.1 PAPEL DA FAMÍLIA NO PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

Os processos de socialização iniciam-se na infância sendo de se destacar o
papel da família como primeiro referencial para o indivíduos no sentido de
lhe impor regras para o convívio em sociedade. Nota-se que a falha neste
primeiro passo indicará que a criança ao ter contato com o mundo exterior,
passara a receber de estranhos os limites que porventura não lhes foram
estabelecidos pela família.
No caso dos presos, nota-se que nos mais das vezes este processo não se
desenvolveu de forma adequada, ou seja, falhou, mas nem por isto se deve
desistir de retormar o processo de socialização, dai ser coerente a palavra
de Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, que faz uma interessante observação no
sentido de que: “incluir é abandonar estereótipos”, acaba adequando-se
perfeitamente a estes casos.
Na hipótese do cumprimento da pena privativa de liberdade, faz-se necessário
iniciar um novo processo de socialização como forma de incluir indivíduo
para retomar às suas atividades, de forma que tenha uma motivação para
viver, seja no seio de sua família, notadamente a partir de práticas não
compreendidas no período que esteve extra-muros. Estas práticas indicam, no
sentido de estimular o presidiário enquanto pessoa humana, empenhando-se no
exercício de um labor, ou através de práticas educativas, porquanto a
sociedade ocupa um papel demasiadamente importante nesta ocasião, pois cada
demonstração de rejeição ao ex-detento pode significar-lhe um incentivo ao
ócio e continuidade na prática delituosa, tudo o que se faz imprescindível é
mesmo o apoio e confiança a serem demonstrados, para que possa vir a motivar
o egresso a continuar sua vida distante da prática delituosa.
Caffarena (apud ARAÚJO, 2007, p.89), sabiamente anota,
Assim como a oportunidade do resgate da auto-estima por meio de uma
atividade qualquer, seja esta remunerada ou não, que venha enriquecer e
afastar o indivíduo do ócio vulgar e pernicioso, o apoio familiar e as
visitas constituem outro fator fundamental para a recuperação e a
valorização de vidas. O apoio familiar constitui-se em elemento fundamental,
pois produz no interno a intenção de não repetir os erros que o levaram ao
cárcere.

A complexificação da cena carcerária depende da conjunção de duas vontades:
1) da sociedade civil querer ocupar esse espaço; 2) da prisão se abrir para
circulação, e principalmente, permitir a presença nos seus espaços de
pessoas estranhas à instituição. Demais disto, a família que poderá auxiliar
na formulação deste novo modelo de socialização.
Desta forma demonstra-se como de axial importância o papel da família neste
processo, apoiando, orientando e auxiliando o condenado para o retorno da
vida em e a sociedade, não se podendo perder de vista, que o ex-detento é um
ser humano, clamando por uma oportunidade na sua vida, a qual corresponde a
viver em harmonia e sob tratamento igualitário, com os demais, sendo correto
o pensamento de Elionaldo Julião (2010, p. 542):
Compreendendo que os vínculos familiares, afetivos e sociais são sólidas
bases para afastar os condenados da delinquência, ou seja, evitar a
reincidência criminal, conforme já previsto na área socioeducativa, o
sistema carcerário deverá investir na implementação de um Plano Nacional de
Convivência Familiar e Comunitário para a política de execução penal,
primando-se por diretrizes e políticas que estreitem os laços familiares e
comunitários com os apenados, principalmente ampliando as perspectivas de
efetivamente se “mediar os possíveis conflitos” existentes.

3.7.2 SOCIALIZAÇÃO ATRAVÉS DO TRABALHO

Uma das premissas básicas para o processo de socialização do condenado é
encontrada no trabalho do preso.
O trabalho do preso é uma espécie de direito e dever ao mesmo tempo; Dever
por determinação das normas dos arts. 34 e 35 do CP na medida que impõe aos
condenados em regime fechado e semiaberto a sujeição ao trabalho durante o
dia como decorrência da condenação, d’outra banda é direito assegurado pela
LEP, art. 40, considerando os eventuais benefícios decorrentes do labor, em
especial a remição dos dias trabalhados.
O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana,
terá finalidade educativa e produtiva, sendo assegurado as regras de
organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e
à higiene. As regras de segurança do trabalho tem o objetivo promover a
proteção do trabalhador no seu local de trabalho, visando a redução de
acidentes de trabalho e doencas ocupacionais, estando regulamentadas por
leis específicas. O CP remete para a legislação especial a regulamentação
dos direitos do preso e do trabalho do preso.
O trabalho inegavelmente funciona como um elemento fundamental na
socialização do condenado, embora, apenas uma pequena parcela dos
encarcerados exercam uma atividade produtiva, ou qualquer forma de
aprendizado, razão pela qual Foucault (1986, p. 203), anotou,
o trabalho é definido como parte constituinte da ação carcerária de
transformação dos indivíduos. Impõe-se não como atividade de produção, mas
pelos efeitos que faz desencadear na mecânica humana, proporcionando a ordem
e a regularidade; o que sujeita os corpos a movimentos regulares, exclui a
agitação e a distração, impõe uma hierarquia e uma vigilância que serão
ainda mais bem aceitos, e penetrarão ainda mais profundamente no
comportamento dos condenados.

Infelizmente, em virtude da escassez de vagas, uma pequena parcela dos
condenados é albergado pela benefício/obrigação do trabalho, e na via
transversa a falta de atividade laborativa a desempenhar gera um tempo livre
enorme, que não é preenchido com nenhuma outra atividade construtiva
(recreativa, intelectual, artística, desportiva), produzindo ociosidade e
consequencias bastante negativas para sua readaptação, tais como uso de
drogas, planejamento de fugas, brigas, entre outras consequencias danosas.

3.7.3 SOCIALIZAÇÃO ATRAVÉS ESTUDO

A socialização dos presos torna-se mais eficiente quando eles têm a
possibilidade de estudar, pois a educação é imprescindível nesse processo,
nota-se que grande parte da população carcerária não teve a oportunidade
concreta de estudar na primeira infância, e por esta razão, não
submeteram-se aos influxos das praticas educativas.
Durkheim (1978, p. 41) define “educação” como uma:
[…] ação exercida, pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se
encontram ainda preparadas para a vida social: tem por objetivo suscitar e
desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e
morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto, e pelo meio
especial a que a criança, particularmente, se destine.

E segue para afirmar (1978, p. 42), que a educação consiste, pois, numa
socialização metódica das novas gerações,
[…] a sociedade se encontra, a cada nova geração, como que diante de uma
tabula rasa, sobre a qual é preciso construir quase tudo de novo. É preciso
que, pelos meios mais rápidos, ela agregue ao ser egoísta e associal, que
acaba de nascer, uma natureza capaz de vida moral e social. Eis aí a obra da
educação. Ela cria no homem um ser novo.

Como expõem Daniela Duarte e Jorge Teles (apud SARAIVA e LOPES, 2011, p.
29):
No caso de presos, a educação é decisiva na restauração da autoestima e na
sua reintegração na sociedade, por meio da potencialização da capacidade do
indivíduo em superar psicológica e socialmente as adversidades e
converter-se em sujeito de sua própria história.

Há uma consciência de que a educação é a força motriz para qualquer processo
de socialização, em especial em relação aos presos, de modo que é dever do
Estado realizar tarefas no sentido de prover o sistema prisional de meios
que possam auxiliar na reabilitação dos apenados e a educação tem papel
precípuo nesse processo. Conforme assinala, em feliz síntese, José M. R.
Delgado:
los seres humanos son educables y susceptibles de cambios personales y
sociales, existiendo hechos históricos que apoyan esta tesis: recordemos que
la esclavitud fue abolida, los sacrificios humanos han desaparecido, ya no
hay antropofagia, la mortalidad infantil ha disminuido considerablemente y
la duración de la vida se ha alargada bastante. Las ideas originadas por
seres excepcionales como Jesuscristo y Einstein han determinado cambios
decisivos en las mentes y en las conductas de los hombres. Hay que dar alta
prioridad a la investigación del espacio interior del cerebro para encontrar
las bases biológicas que permitan potenciar la felicidad personal, la
convivencia social y la cooperación internacional. Esto no es una utopía,
sino una posibilidad a nuestro alcance si así nos lo proponemos. El intento
de conseguir Paz y Bien merece ser explorado. Su éxito internacional puede
ser de incalculables y beneficiosas consecuencias. Pero incluso si el logro
internacional fuese difícil y prematuro, su implantación a nivel personal
será mucho más fácil y rápido. El éxito a nivel personal puede potenciar su
posterior utilización universal. El pensar y el actuar suponiendo que ‘yo
soy así’ y ‘siempre seré así’ y por lo tanto poco voy a cambiar’ es falso
biológicamente y peligroso para el individuo y para sus relaciones sociales.

Castrillo (1997, p.101) entusiasta da educação pontua,
No me cabe la menor duda de que la educación y la reeducación son posibles.
Sus efectos son incuestionablemente positivos, aunque no en modo alguno
automáticos ni totales, como en el fondo sucede con todo lo individual, con
todo lo específico de cada ser humano.

No caso da educação, particularmente, vai além da simples aquisição de
conhecimentos e de garantia de direitos constitucionais. É perspectiva de
mudança de vida, autoestima e outras competências e habilidades para a vida
tanto individual quanto social.

Neste particular leia-se que tanto a educação formal, como a informal são
excelentes coadjuvantes no processo de socialização, como afirma João
Vargas, (2004, p. 25),
O ensino formal e o ensino informal constituem premissas básicas de
socialização (e não de re-socialização) no cárcere, para a vida extramuros,
uma vez que gera qualificação intelectual útil, com a aquisição da
escolaridade, além dos meios profissionalizantes disponibilizados. O
cárcere, através do ensino, prepara o preso, durante o cárcere, qual um
internato educacional, para a utilização do lado de fora de seus muros, num
futuro não muito distante. A realidade atual é oposta a isso, uma vez que o
ensino não atinge a todos, nem de modo formal e nem informal. Não há
registro de presos que cursem universidades no cárcere, como ocorre em
vários países economicamente mais avançados. Este meio é fundamental para a
realização dos outros dois, como veremos a seguir.

Além de ser um direito social, a educação é um pré-requisito para usufruto
dos demais direitos civis, políticos e sociais emergindo como um componente
básico da dignidade da pessoa humana, sendo corrente as preocupações
internacionais sobre a criação de instrumentos que objetivem a proteção e a
efetividade da garantia dos direitos humanos dos presos.
Sobre isso, Gadotti (1999, p. 62) diz: “Educar é libertar […] dentro da
prisão, a palavra e o diálogo continuam sendo a principal chave. A única
força que move um preso é a liberdade; ela é a grande força de pensar”.
Pensado desta forma, o ensino deve ser um processo global, e a pessoa do
condenado deve estar no centro deste processo, despertando e estimulando sua
verdadeira vocação, sendo educado corretamente pelo mundo exterior e para o
seu retorno da vida em sociedade e neste sentido o educador tem o papel
decisivo, devendo possuir capacidade para o diálogo e respeito pelas
características individuais de cada preso.
Conforme o sociólogo Fernando Salla (1999, p. 67): “por mais que a prisão
seja incapaz de ressocializar, um grande número de detentos deixa o sistema
penitenciário e abandona a marginalidade porque teve a oportunidade de
estudar”.
Sob qualquer prisma que se pense em enfrentar o papel da educação no sistema
prisional, temos que sua função precípua é diminuir a distância do preso com
o contexto social, oportunizado uma vida após o seu retorno ao convívio na
sociedade, sendo importante coadjuvante no processo de socialização do
condenado.

3.7 CRISE NA RESSOCIALIZAÇÃO

Com estas observações vemos que a ressocialização encontra-se em flagrante
crise por inúmeros motivos, sendo o primeiro deles a falta de vontade
governamental para enfrentamento da crise do sistema prisional: a uma, por
criar um sistema que seleciona a população mais pobre da sociedade para
receber a sanção penal e lhe frustrar oportunidades de inclusão social,
sendo inegável a falta de politicas públicas que objetivem obstar o fenômeno
do crime; a duas, por não estabelecer um planejamento concreto, pensado a
prisão a longo prazo, através de políticas de aperfeiçoamento do sistema
tanto no aspecto do trabalho como na educação.
Um segundo obstáculo a ressocialização está na deficiência da formação das
pessoas imbuidas no dever de cuidar do sistema prisional, partindo da
premissa que este sistema se constrói apenas com vigilância e opressão,
quando na verdade a proposta ressocializadora deve incluir a humanização do
tratamento do preso.
Em terceiro plano, a falta de espaços físicos e sociais adequados para a
custódia dos presos, afinal os limites espaciais destinados aos
encarcerados, normalmente minúsculos, não lhes possibilitam praticamente
nenhuma movimentação e as posições em que podem ficar não são sequer
razoáveis para o bem-estar físico de um ser humano.
Silva e Bezerra (2007, p. 1) por estas razões afirmam,
A superlotação das unidades prisionais, as subumanas condições de vida dos
presos, o crescimento de organizações criminosas e da corrupção dentro das
prisões, aliado à falta de segurança, não permitem que os estabelecimentos
carcerários cumpram sua função.

O problema agrava-se pela desproporção existente entre o número de vagas nos
estabelecimentos prisionais e a grande quantidade de mandados de prisão
expedidos, o que resulta na superlotação das prisões, onde as celas
individuais abrigam muito mais condenados do que a sua capacidade permite.
Uma outra questão a gerar complexidade para a cena carcerária, consiste na
legislação penal de emergência e no excesso da utilização da prisão,
sobretudo, da prisão provisória, como instrumento de manutenção da ordem do
sistema.
Günther Jakobs( 2003, p. 55) sustenta,
Com isso, tem-se como farol legislativo, o aumento cada vez maior da
quantidade de pena em detrimento da qualidade e da finalidade da pena a ser
cumprida, o que caracteriza o viés do castigo, características de um direito
penal de oposição, onde se persegue ‘ampla progressão dos limites da
punibilidade, vale dizer, a mudança de perspectiva do ato praticado pelo ato
que se vai pratica?’), deixando de lado a premissa de que a pena deve em seu
cumprimento almejar o caráter ressocializador e preventivo que vislumbre
impedir o retorno a delinquência daquele que foi submetido ao sistema
prisional.

O Tema é bem sintetizado por Caffarena,(1997, p.63)
Las cárceles son micro sociedades que funcionan con una enorme diversidad de
problemas, en donde se confunden problemas sanitarios con problemas
educacionales, problemas de tratamiento de las personas, problemas
terapéuticos.

Parece correto concluir que a proposta atual de enfrentamento do crime, nem
de longe, consegue os seus propósitos, razão pela qual pensamos que em
alternativas ao sistema que podem ser encaminhadas através dos processos de
socialização antes expostos, seja através da família que seria chamada a
participar do processo de inclusão do preso enquanto ostente esta condição;
seja através da qualificação obtida através da instrução e educação, e
finalmente pelo trabalho que poderá decisivamente apontar novos hábitos que
facilitarão a vida do Egresso na sociedade.

JUNTAMENTE COM O VÍDEO COMPARTILHO O CAPÍTULO 3 DO MEU NOVO LIVRO ‘ATRÁS DAS
GRADES- DESAFIO DA EDUCAÇÃO DE PRESOS NO SÉCULO XXI, LANÇADO NO ÚLTIMO DIA
20 DE DEZEMBRO, PUBLICAÇÃO DA EDITORA CASA CULTURAL CORONEL PITÁ.
CAPÍTULO 3 DO PROCESSO (RE) SOCIALIZAÇÃO OU SOCIALIZAÇÃO DO CONDENADO

3.1 DOS OBJETIVOS EXPLICÍTOS E IMPLÍCITOS DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS

De acordo com a Lei de Execução Penal (Brasil, Legislação Penal, Lei
7.211/84), temos que seu objetivo primeiro seja:
Art. 1º- Execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença
ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração
social do condenado e do internado.
Para Renato Marcão (2011, p. 31),
A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou do
internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a
natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas também a
humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e humanizar.

Joe Graeff Filho (2011, p. 202) anota,
Buscando a finalidade na criação da LEP é possível verificar seu caráter
pedagógico estabelecido na segunda parte de seu artigo 1°, que com natureza
própria e desvinculada, visa dar ao condenado possibilidades de integração
social como resgate de sua dignidade para que ao final da pena possa
retornar ao seio da sociedade como sujeito capaz de viver em harmonia com o
mundo, afastado da marginalidade.

Licínio Barbosa (1993, p. 210), ao explicar os objetivos da execução penal
fala em teleologia da execução penal, e sustenta que a finalidade precípua é
a reeducação como finalidade superior da execução, porque modela, do
velho, – um novo homem. Só por seu intermédio, o delinquente retornará, um
dia, devidamente preparado para os embates da vida, à sociedade que o
fustigou com a sanção, em decorrência da infração. A ressocialização do
sentenciado – reintegrado no concerto social, – eis a finalidade máxima da
pena, buscada pelo Direito Penal moderno.

De todas as observações temos como recorrente, propostas de “recuperação,
ressocialização, readaptação, reinserção, reeducação social, reabilitação”,
que, à primeira vista, são tratados como expressões sinônimas e dizem
respeito ao conjunto de atributos que permitem ao indivíduo tornar-se útil a
si mesmo, à sua família e à sociedade.
Kent (1988, p. 53-4) sustenta,
La palabra ‘readaptación’ o las expresiones resocialización, reinserción
social, readecuación social, rearmonización, reeducación. Parábolas del hijo
pródigo que se autolegitiman, sin mayor consulta a los marcos histórico y
político que subyacen en las categorizaciones del Derecho penal.
Lineamientos genéricos que sólo están allí para desdibujar los contornos
ciertos de la penetración del sistema penitenciario o de la regulación
carcelaria en la vida de quienes quedan bajo su égida.

A rigor, este discurso oficial representa os objetivos declarados, que
consistem no controle formal do Estado através dos órgãos de Execução Penal,
e que não representam, nem tutelam, os interesses comuns a todos os
cidadãos, mas a interesses de grupos minoritários socialmente privilegiados,
não sendo atingidos na maioria das vezes.
D’outra banda o Sistema Penal é sabidamente seletivo, seja no que diz
respeito à proteção dos direitos humanos, dos bens e interesses sociais,
seja em relação ao processo de criminalização (incriminalização e
descriminalização), seja no que tange ao recrutamento da clientela, o que
fortifica a ilação de que o sistema punitivo é absolutamente inadequado para
atuar de maneira útil e saudável na sociedade. A sociedade moderna está
muito mais preocupada com as propostas de estabilização da situação presente
do que a reconstrução para além desta sociedade no futuro, razão pela qual
Kent (1988, p. 87), acertadamente comenta:
Nuestras sociedades democráticas están mucho mejor dispuestas para celebrar
ceremonias de exclusión que ceremonias de reintegración. Es la tendencia
natural de cualquier sociedad; pero no es papel de la justicia el ir contra
la naturaleza? No consiste asimismo en reintegrar a los ciudadanos que ha
excluido? El gran problema de las sociedades democráticas que generan la
exclusión no será pronto la reconciliación?

Nota-se que o discurso oficial dos objetivos da execução penal coloca a pena
como pedra angular do sistema, mas não busca compreender o problema como um
todo, apenas como parte, aprisionar para recuperar, em outras palavras, não
confessando os objetivos implícitos, que representam a manutenção de um
sistema capitalista perverso e excludente e que se alimenta dos seus
próprios resultados para efeito de manutenção do “status” existente.
Não se pode falar em objetivos da execução penal sem uma proposição concreta
da reconstrução dos problemas sociais, e sem uma discussão séria do próprio
sistema social. De mais a mais, é imperioso proceder à crítica das práticas,
das atitudes e atividades dos operadores do direito, afinal a nova ordem
social impende em repensar para quem é feito o sistema punitivo sob pena de
“não acompanharmos o bonde da história”, e continuarmos alijando dos
processo de inclusão a parte mais necessitada da população; também, é
necessário avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer
suporte reflexivo ao legislador, dês que a legislação penal brasileira é
concebida sem uma análise sistêmica e muitas vezes em total afronta ao texto
constitucional;
Outra questão a ser pensada é proceder a avaliação do papel desempenhado
pela ciência jurídica e o próprio comportamento dos operadores do direito no
seu desenvolvimento, isto porque, em matéria criminal, via de regra,
formam-se dois grupos bem definidos: o bem e o mal. No grupo do bem, que
busca sempre a Justiça, juízes e promotores, muitas vezes em uma simbiose
promiscua, que não consegue apartar as funções de acusar e julgar de forma
estanque. Do outro lado, acusado e defensor, representando o mal, uma vez
que, próximos ao fenômeno do crime, não estariam dispostos a colaborar com a
busca da aplicação equinanime do Direito. Mitiga-se o direito de defesa, da
não auto-incriminação, do devido processo legal, do contraditório, entre
tantas outras garantias expressas pelo texto constitucional.
Numa análise propositiva, nos cabe ainda, investigar as causas da
desestruturação, do enfraquecimento, ou até mesmo da ruína de um sistema
jurídico; a quem serve? e até onde iremos neste processo?
Temos um Poder Judiciário sucateado, sem juízes, com falta de funcionários,
sem condições salubres e operacionais do desenvolvimento da máquina
judiciária, e mais que isto, sem uma proposição concreta de mudança, falta
planejamento, uma garantia da prestação jurisdicional célere e que busque a
efetivação da justiça. Penso que o primeiro objetivo da Justiça Criminal é
que o processo seja rápido, efetivo, que não se use a prisão processual como
pena, mas que, uma vez consolidada a situação jurídica (trânsito em julgado
da sentença penal), ela seja efetivada, garantindo ao condenado os direitos
previstos na legislação de Execução Penal.
Deve-se ainda, investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação
social e seu compromisso com as questões sociais, seja no que tange a
indivíduos, seja no que tange a grupos, seja no que tange a coletividades,
seja no que tange a preocupações humanas universais, numa afirmação concreta
do princípio da dignidade da pessoa humana e em respeito aos direitos
fundamentais.
Estabelecer, esclarecer e definir a teleologia do Direito, por meio da
crítica conceitual institucional, valorativa, política e procedimental, com
o objetivo de auxiliar o juiz no processo decisório, apontando métodos
adequados de (re) socialização do apenado.
Mapelli (apud FALCONI, 1998, p.117) para definir o vocábulo
“Ressocialização”, anota,
Un principio fundamental de humanización de la ejecución de las penas y
medidas privativas de libertad en virtud del cual éstas deben adaptarse a
las condiciones generales de vida en sociedad (princípio de atenuación) y
contrarrestar las consecuencias dañinas de La privación de libertad
(principio de nil nocere).

Nesta toada, percebe-se a dupla finalidade da execução penal, qual seja, dar
sentido e efetivação do que foi decidido criminalmente, além de dar ao
apenado condições para que ele consiga aderir, novamente, ao seio social,
evitando, desta forma, a reincidência.
Nota-se que sempre, e de forma indistinta, quando tratamos de presos e
execução penal trazemos à colação a expressão “ressocialização” ou seus
sinônimos. Será que é adequada? Quem é o sujeito de direito – sujeito
passivo da resposta punitiva estatal e sujeito ativo do crime – no Direito
Penal?
Antes de mais nada é necessário esclarecer que a expressão ressocialização
não pode prescindir de uma prévia socialização, daí a primeira falácia do
sistema em “ressocializar quem não foi socializado”, pensamento corrente da
criminólogia crítica.
Bem confirma esta proposição o Des. Lourival Almeida Trindade (2003, p.29),
“o cárcere, além de sempre reproduzir os valores das classes dominantes,
jamais cumpriu suas reais funções – a de reeducação e de reinserção social
do apenado.” E prossegue (2003, p. 30),
na atualidade, não se ignora que a prisão, em vez de regenerar e
ressocializar o delinquente, degenera-o e dessocializa-o, além de
pervertê-lo, corrompê-lo, e embrutecê-lo. A prisão é, por si mesma,
criminógena, além de fábrica da reincidência. Já foi cognominada, por isto
mesmo, de escola primária, secundária e universitária do crime. Enfim, a
prisão é a verdadeira sementeira da criminalização.

Dirceu Siqueira e Telma Rostelato ( 2009, p. 112), concordam com o nosso
conterrâneo:
Talvez a culpa não seja somente de nossa legislação penal, mas em grande
parte do Estado, por meio dos estabelecimentos prisionais que oferece, todos
mal aparelhados, deixando o prisioneiro à mercê de uma escola que apenas o
transforma em um detento de maior periculosidade, pois muitos após saírem
daquele lugar, saem com maior aptidão para a prática de delitos cada vez
mais atemorizadores.

De mais a mais, o sujeito de direito da resposta estatal é necessariamente
aquele que foi excluído, no nascimento, da sua capacidade de consumir, e
para explicar este quadro, inicialmente, podemos pontuar que o modelo
econômico, dos países capitalistas, acentua as desigualdades existentes
entre as diferentes classes sociais e estimula o aumento da repressão às
camadas menos favorecidas da sociedade.
Luis Niño (1997, p. 104) explica,
En realidad, y como todos sabemos, lejos de favorecer el tránsito a una
mayor igualdad, el propio desarrollo del sistema socio-económico cimentado
en la ficción contractual, profundizó las diferencias de los individuos y
los grupos humanos respecto de la posesión y disposición de los bienes
materiales, hasta hacer añicos la metáfora del consenso originario. El
proceso de concentración de los capitales es hoy una realidad incontrastable
en cada país, en cada región y en cada continente, y divide al planeta en
microcosmos cada día más diferentes.

Com as concepções do neoliberalismo, surgiu o que se convencionou chamar de
“Estado mínimo”, levando a efeito as privatizações, sob o argumento de
desonerar os cofres públicos, passando os serviços as mãos dos particulares
com custos ainda mais elevados e reduzindo-se, em contrapartida, os
benefícios que deveriam ser garantidos pelo Estado.
Daí Maria Lúcia Karan, (1993, p. 206-207) anotar,
A função efetiva do sistema penal é de manutenção do status quo, ou seja: o
cárcere é reprodutor de desigualdades sociais. Trata-se de um instrumento de
exclusão social, ao contrário dos seus fins oficialmente declarados.
Escolhe-se para receber toda a carga estigmatizante provocada pelo sistema
penal, preferencialmente os membros das classes subalternas, fato este
facilmente comprovado se observarmos quem está preso em nosso país.

Alessandro Baratta (2011, p. 3) nos instiga ao afirmar,
Se verificarmos a população carcerária, sua composição demográfica, veremos
que a marginalização é, para a maior parte dos presos, oriunda de um
processo secundário de marginalização que intervém em um processo primário.
É fato comprovado que a maior parte dos presos procede de grupos sociais já
marginalizados, excluídos da sociedade ativa por causa dos mecanismos de
mercado que regulam o mundo do trabalho.

Precisa é a observação de Araújo, (2007, p.87),
Diante desse grave problema social, as políticas públicas implementadas para
área de segurança foram as de um aumento do aparato estatal coercitivo. Com
isso, em vez de se realizarem políticas de longo prazo, como o investimento
na educação pública e gratuita, as autoridades públicas fizeram a opção de
criminalizar as camadas da população pobre, como se essas já nascessem
predestinadas ao crime, o que não deixa de ser verídico, visto o número
pífio de oportunidades ofertadas a esses indivíduos ao longo de suas vidas.

Por outra via temos que não apenas o fator econômico representado pelo
desemprego é o responsável pelo incitamento do indivíduo ao cometimento de
delitos. Na sociedade moderna, os meios de comunicação em massa, as novas
redes sociais, ou seja, a sociedade visual – estimula o ter em detrimento do
ser, situação que impõe o consumo a todas as classes, sendo o indivíduo
valorizado pelo que representa socialmente em razão dos objetos que possa
apresentar aos seus pares. Tal forma de proceder, não raro propõe o
cometimento de alguns delitos com o intuito de obter um ganho material
imediato que possibilite a resolução rápida das necessidades representadas
pelos símbolos escolhidos como adequados socialmente.
Para Bauman (1998, p. 55),
a criminalidade crescente é produto da sociedade de consumidores. Veja-se
que o frequente estímulo ao consumo é indistinto, atinge e conquista a
todos, havendo, portanto, uma necessidade de se consumir. Como existem
grandes distorções econômicas, alguns grupos serão privados da satisfação
deste anseio incutido sendo, por vezes, conduzidos ao desvio.

E, caberá, nesta nova fase, à prisão servir de reforço à exclusão destes
criminosos, dos que desviam, ou como bem adjetiva o professor polonês, os
consumidores falhos. Tem-se, neste novo período, a ideia de classes de
criminosos, não mais o ideal de classes perigosas, pune-se pelo que a pessoa
é, e não pelo que fez.
Alessandro Baratta (1998, p. 182) pontualmente enfrenta a questão: “Antes de
querer modificar os excluídos, é preciso modificar a sociedade excludente,
atingindo, assim, a raiz do mecanismo de exclusão”.
Completa Edna Araújo (2007, p.88),
A socialização de indivíduos deve ser a prioridade das políticas
governamentais. Possibilitar que as pessoas tenham oportunidades iguais deve
ser o objetivo das políticas de inclusão social. O Estado deve estar
presente na vida do povo pobre não apenas por meio da repressão, mas por
meio da garantia a essas parcelas da população, de acesso a serviços
fundamentais para existência digna de um ser humano como saúde e educação
gratuitas e de qualidade.

Um dos temas a ser discutido no presente Estudo é a falácia expressa no
discurso que a passagem do detento por uma instituição carcerária, teria o
condão de “ressocializá-lo”, afinal de contas, como pugnar pela
ressocialização de um indivíduo que jamais teve oportunizada sua inclusão
social.
Com efeito, o pretendido tratamento através da ressocialização é
incompatível com o encarceramento. Afinal a ruptura de laços familiares e
outros vínculos humanos, são fatores que em nada ajudam a integração do ser.
Por isso o que se observa, em toda parte, é que a prisão exerce um efeito
devastador sobre a personalidade, reforça valores negativos, cria e agrava
distúrbios de conduta.
Bem pontua Mapelli Caffarena, (1997, p. 123),
La prisión es, por su propia naturaleza, una suma de carencias y
privaciones, es por excelencia un medio antipedagógico orientado hacia fines
que poco tienen que ver con las aspiraciones resocializadoras. Basta con
analizar la fragilidad de los medios llamados comúnmente “resocializadores”
para comprender la imposibilidad de alcanzar estos fines. No se trata tan
sólo de un problema de falta de voluntad política, sino de que la fisura
anómica entre la resocialización y los medios de que se dispone para
alcanzarla deviene de una imposibilidad estructural de la propia prisión.

Por sua vez Guilhermo Etcheverry (2002, p. 15) afirma: “No es posible
reeducar, resocializar, en aislamiento, redignificar y reinsertar en la
sociedad por medio del castigo”.
Temos que o processo deve ser visto de forma inversa, através do discurso da
inclusão e da socialização, como instrumento de possibilitar ao indivíduo a
sua participação social gerando meios para efetivar sua condição de membro
da sociedade.
Durkheim (1922, p.67) foi um dos percussores do conceito socialização,
considerando-o como,
Desenvolvimento conduzido pelos adultos daqueles que ainda não estão
inseridos na vida em sociedade – portanto, algo específico do período da
infância, anotando que autonomia do agir trata-se de um déficit para a vida
organizada em sociedade, à qual os indivíduos deveriam ser integrados, uma
vez que incorporavam os saberes e normas sociais vigentes, por intermédio de
indivíduos ‘já socializados’, com a finalidade de manter a coesão e a ordem
social.

Gilberto Freire (2005, p.72) anotou que socialização é a condição do
indivíduo (biológico) desenvolvido, dentro da organização social e da
cultura, em pessoa ou homem social, pela aquisição de status ou situação,
desenvolvidos como membro de um grupo ou de vários grupos.
Em suas dimensões mais amplas, os processos de socialização devem envolver o
ser humano individual, considerando-o como um espectro de experiências,
posicionamentos, saberes, estruturas emocionais, capacidades cognitivas,
desenvolvendo aptidões para determinar sua interação, comunicação e
atividade no meio social em que vive, sendo certo que estes objetivos não
poderão ser alcançados através do sistema carcerário uma vez que os
indivíduos devem ser previamente socializados através das relações
familiares, escolares, religião, sendo de fundamental importância sua
postura propositiva como anota Dubar (2000, p. 101),
Dessa forma, os autores atribuem uma participação ativa do indivíduo nas
instâncias socializadoras, conferindo a ele maior autonomia e liberdade
reflexiva. Esse indivíduo é concebido como tendo capacidade de dialogar,
questionar e escolher um universo de relações, bem como os valores que
constituem esse universo diferente dos demais.

Essas dimensões devem ser tratadas, em seu conjunto ou em suas
particularidades, segundo uma perspectiva sociológica, sendo certo afirmar
que o discurso de socialização deve e pode ser aplicado aos presos,
notadamente pessoas à margem da sociedade e dotadas de condutas desviadas
que permeiam o fenômeno criminoso, sendo certo que estes indivíduos
necessitam desenvolver capacidades, competências do agir, interesses e
qualidades pessoais em tensão com as regras, expectativas e costumes
sociais.
Aduza-se, por oportuno, que a massa carcerária nem sequer foi inserida no
contexto social, vivendo marginalizada das pautas macrossociais, não
existindo possibilidade de ser contextualizada através da exclusão, afinal
estamos tratando de cidadãos de segunda categoria, como bem explica Beiras
(1997, p. 207),
construcción de un ciudadano de segunda categoría’, este concepto nos
sugiere la existencia de ciudadanos que no solamente reciben un trato ‘de
segunda’ al momento de la aplicación de las normas penitenciarias, sino que
este tratamiento se da – incluso – desde el mismo momento de la
interpretación jurisdiccional de dichas normas.

Jock Young (2002), final do século XX, diagnostica a transição de uma
sociedade inclusiva para uma sociedade excludente, de uma sociedade que
assimila e incorpora para outra que exclui, sendo que uma solução que se
pode apontar para o sistema é exatamente a solução que José Raimundo
Carvalho (2012, p. 258-259), verbera quando estabelece um ponto de encontro
entre a socialização e inclusão,
A meta primordial do processo de inclusão social é trazer as pessoas para
uma sociedade da qual elas nunca fizeram parte até então, visando reduzir as
disparidades para integrar cada vez mais pessoas a uma condição de vida
digna, promovendo acesso equitativo aos benefícios do desenvolvimento.

O termo “incluir” vem do latim includere, que tem o significado de
compreender, abranger, conter em si, envolver, pertencer juntamente com
outros, entre os diversos sinônimos oferecidos pelo Dicionário Aurélio, de
Língua Portuguesa.
Segundo Romeu Sassaki (1997, p. 17), o movimento de inclusão social tem como
objetivo maior a construção de uma sociedade real e justa para todas as
pessoas, e seus princípios se baseiam nos seguintes pressupostos: a
celebração das diferenças; o direito de pertencer; a valorização da
diversidade humana; a solidariedade humanitária; a igual importância das
minorias; a cidadania com qualidade de vida. Situações acaso observáveis na
execução penal, tornar-se-iam fundamentais para a adaptação do condenado
para a vida em sociedade.
Anote-se que a finalidade pena da execução penal não é a retribuição,
tampouco a prevenção, merecendo um aprofundamento e discussão, restando uma
pergunta a ser respondida: a quem serve o Direito Penal? e porque a punição
é estimulada na forma de prisão?
De forma direta responde este questionamento Loïc Wacquant(1999, p.93),
A indústria da carceragem é um empreendimento próspero e de futuro radioso,
e com ela todos aqueles que partilham do grande encarceramento dos pobres
nos Estados Unidos.

A nova organização do sistema punitivo estabelece uma relação de controle de
uma população de jovens adultos que não dispõe de meios para sua integração
no mercado formal de trabalho e que se tornam úteis a organização e produção
no ambiente carcerário. Considere-se o baixo custo da mão de obra como mais
uma perversão do sistema capitalista, além de ter sido viabilizada a
privatização de prisões, gerando uma indústria fomentada pelo aprisionamento
da miséria, sendo incentivado o encarceramento, como resposta econômica,
real e eficiente, para responder aos setores exploradores deste segmento da
produção.
Além dos beneficiários diretos da indústria da carceragem, temos vários
personagens periféricos que se alimentam do fenômeno criminoso, desde o
jornaleiro que entrega as notícias dos fatos ocorridos, indo ao editor dos
programas e até mesmo o dono do jornal, afinal o journalism a sensation,
repleto de clichês acerca do endurecimento das penas criminais e do estímulo
às expedições punitivas, têm ampla aceitação de público, em especial, nos
indivíduos que estão próximos a fatos desta natureza. Os policiais, e os
agentes de segurança privada, as instituições diretamente ligadas ao sistema
punitivo: Magistratura, Ministério Público e responsáveis pela custódia dos
presos, e porque não a advocacia, professores de Direito, donos de editoras,
enfim todos acabam ganhando com o crime, daí ser uma premissa equivocada a
regra que “o crime não compensa”. Não compensa, para uns.
3.2 DA FUNÇÃO DA PENA
A pena pode ser definida, segundo Damásio E. de Jesus, como uma sanção
aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, como retribuição de seu
ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim evitar
novos delitos.
Hulsman (1993, p. 87) elenca dois elementos como característicos da pena,
tal como é entendida pela civilização ocidental:”Uma relação de poder entre
aquele que pune e aquele que é punido, que por sua vez reconhece a
autoridade do primeiro; e depois, imposição de doses de sofrimento,
penitência, dor.”

Para Guillermo Etcheverry (2002, p.17),
La finalidad de la pena privativa de la libertad es lograr que los
condenados adquieran la capacidad de comprender y respetar la ley, lo que
una vez cumplida su condena les facilitará la reinserción en la sociedad.
(…) En el tránsito del siglo XVIII al XIX los acontecimientos históricos
promueven nuevos marcos legales. Las leyes definen el poder de castigar como
función general. Dentro del arsenal punitivo de una sociedad, la cárcel es
una pieza esencial. Es la institución más severa con que cuenta el sistema
penal, y se la debe considerar como última herramienta para controlar las
conductas antisociales, es decir, el delito.

A finalidade da pena, muito se discutiu, e ainda se discute, sendo certo que
diversos estudiosos e teóricos formularam modelos que estabelecem pelo menos
três modelos para explicar a legitimidade e os fins da pena privativa de
liberdade, a saber: teoria absolutista – fins retributivos; relativa – fins
preventivos; mista – junção das finalidades retributivas e preventivas.
A primeira corrente prega que a função da pena é retribuição, afinal a
prisão é, antes de tudo, um castigo, fundado em Kant, era um imperativo
categórico. Para a Escola Clássica, responsável pela formulação desta
teoria, a pena é atribuída com a finalidade de retribuição ao mal causado
pelo crime, sendo necessária para restaurar a ordem jurídica violada.
Aníbal Bruno (1967, p.18) afirmou,
é um mal justo com que o Estado responde ao mal injusto praticado pelo
criminoso, em correspondência com a gravidade do fato, segundo o bem
ofendido, e a grandeza de sua culpabilidade e pela qual se processa a
reintegração da ordem jurídica violada.

Paulo Borges e João Guimarães, (2013, p.88) ensinam,
A função retributiva da pena é bem explicada pelo jurista Claus Roxin, que
ensina: A teoria da retribuição não encontra o sentido da pena na
perspectiva de algum fim socialmente útil, senão em que mediante a imposição
de um mal merecidamente se retribui, equilibra e espia a culpabilidade do
autor pelo fato cometido. Se fala aqui de uma teoria “absoluta” porque para
ela o fim da pena é independente, ‘desvinculado’ de seu efeito social. A
concepção da pena como retribuição compensatória realmente já é conhecida
desde a antiguidade e permanece viva na consciência dos profanos com uma
certa naturalidade: a pena deve ser justa e isso pressupõe que se
corresponda em sua duração e intensidade com a gravidade do delito, que o
compense.

Sucedendo a Escola Clássica surge, na segunda metade do século XIX, a Escola
Positiva, que defende as teorias preventivas da pena, embasada na ideia de
defesa social, na medida em que a função da pena consiste em inibir, tanto
quanto possível, a prática de novos delitos. Nesse momento, a pena não deve
mais ser vista como a retribuição, um castigo proporcional à transgressão
moral, mas sim como um conjunto de medidas sociais, preventiva e
repressivas, que vislumbrem uma defesa mais eficaz e humana da sociedade.
Patricia Ziffer (1999, p.49) anota,
Prevención general se entiende, tradicionalmente, la función intimidatoria
de la pena frente a los posibles autores. La teoría de la prevención general
positiva no es posible extraer una medida determinada de pena, pero
igualmente consideran que puede proporcionar un ‘marco’, configurado por la
‘reacción que ya debe ser tomada en serio y aquella que todavía no resulta
exageradamente estricta’.

A função preventiva da pena divide-se em dois ramos bem delineados: a
primeira, denominada prevenção geral, que se dirige à generalidade dos
cidadãos; e a segunda conhecida por prevenção especial, que se dirige
exclusivamente ao delinquente em particular.
Para Roberto Lyra (1942, p. 24-25):
As teorias da prevenção dividem-se em gerais e especiais. São gerais, quando
consideram a pena em face da coletividade, no momento preciso de exercer a
sua ação intimidativa; são especiais, quando consideram a pena em face de
determinado resumo, a prevenção geral encerra a função social; a prevenção
especial, a função individual da pena.

A prevenção geral pode ser ainda, positiva e negativa, como compreende Luis
Niño (1997, p. 104),
Prevención general negativa atribuible a la pena no se ha acreditado en la
dinámica social. Lo que sí se ha acreditado es que los gobernantes que
apuestan unívocamente a este fin preventivo-general aproximan su gestión al
terrorismo estatal. Prevención general positiva, según el cual a través de
la imposición de penas no se procura tal inhibición de energías criminales
sino el reforzamiento de los valores fundantes del Estado Y no satisface por
una sencilla razón: en la medida en que el funcionamiento de ese Estado, de
cara a la comunidad, vale decir, en sus políticas y sus realizaciones
económicas, sociales y culturales, no luzca racional para vastos sectores de
la población, ningún refuerzo lógico cabrá esperar a partir de la actuación
específica del sistema penal.

Paulo Borges e João Guimarães (2013, p.88), por seu turno, advertem:
A prevenção geral negativa nada mais é do que o uso da intimidação a pena
imposta ao infrator irá refletir na sociedade como um exemplo, ou seja,
surgirá o medo de também sofrer a mesma imposição caso cometa o delito
praticado pelo apenado. Por sua vez, a prevenção geral positiva vai além do
intuito da geral negativa, uma vez que busca disseminar na sociedade a ideia
da necessidade de se respeitar determinados valores.

Para explicar a prevenção especial colha-se o escólio de Takayanagi( 2010,
p. 1070),
a prevenção especial pode atuar de três formas: assegurando, com a prisão, a
comunidade diante dos delinquentes, intimidando o autor, por meio da pena,
para que não cometa futuros delitos; e preservando-o da reincidência
mediante a sua correção. Seria a ideia da ressocialização.

Assim a função preventiva especial negativa, que extirparia, segregaria o
indivíduo inconveniente da sociedade, e a função preventiva especial
positiva, que estaria relacionada às teses das escolas correcionalista e da
Defesa Social, estaria dirigida diretamente ao delinquente.
A rigor, podemos entender que o afastamento do deliquente apenas poderá
gerar a neutralização do mesmo, o que Jorge Perano (2009, p. 678), credita
ao discurso da prevenção especial positiva (ressocialização) a capacidade de
limitar a fundamentação da teoria especial negativa (neutralização), ou
ainda da teoria geral positiva, as quais serviriam para legitimar um
encarceramento indefinido e ilimitado.
Nos restam, ainda, as teorias mistas ou unitárias são as mais difundidas e
pretendem unificar a concepção de finalidade da pena, conciliando os
aspectos mais relevantes das teorias absolutas e preventivas, que em
conjunto trazem como justificativa para a imposição da pena a necessidade de
retribuição da afronta ao ordenamento jurídico perpetrada pelo indivíduo,
vislumbrando a sua ressocialização e reintegração ao convívio social,
aproveitando ainda para servir de exemplo para que os outros membros da
coletividade não sigam o mesmo caminho da delinquência.Porém, tais objetivos
quando reunidos, na busca por uma justificativa unitária da pena de prisão,
soam conflitantes, conforme afirma Thompson (1970, p. 9-10),
Ainda o nosso moderno sistema prisional procede numa direção muito incerta,
porque sua administração tem, necessariamente, uma série de compromissos. De
um lado, espera-se que as prisões punam; de outro, supõe-se que reformem.
Espera-se que disciplinem rigorosamente ao mesmo tempo em que ensinem
autoconfiança. São construídas para operar como grandes máquinas impessoais,
mas se espera que ajuste os homens a viver vidas comunitárias normais.
Operam de acordo com uma rígida rotina autocrática, mas se espera que
desenvolvam a iniciativa individual. Todas as regras restritivas, por demais
frequentes, obrigam o preso à ociosidade, a despeito do fato de que um de
seus objetivos primários é de ensinar aos homens como ganhar uma vida
honesta. Recusam ao preso qualquer possibilidade de autogoverno, mas esperam
que ele se transforme em um homem consciente, numa sociedade democrática.
Para alguns, as prisões não são mais do que clubes campestres, a prover as
fantasias e os caprichos dos internos. Para outros, a atmosfera prisional
parece carregada somente de amargura, de rancor e de sentimento pervertido
de frustração. E assim o esquema paradoxal prossegue, porque nossas ideias a
respeito da função das instituições correcionais, na nossa sociedade, são
confusas, vagas e nebulosas.

Após uma abordagem histórica do tema, constata-se que para as “teorias
justificacionistas”, mesmo que se considere a pena um mal, ela será sempre
um mal necessário. Dessa forma, concluindo a linha de pensamento das três
principais correntes que buscam legitimar o direito de punir do Estado,
recorremos aos pensamento de Paulo Queiroz (2005, p. 9):
Punitur quia peccatum est; punitur ut ne peccetur; punitur quia peccatum est
et ne peccetuar. Respectivamente: pune-se porque pecou (tória absoluta);
pune-se para que não se peque (teoria relativa); pune-se porque pecou e para
que não se peque (teoria mista).

Certo está Álvaro Mayrink da Costa(2014, p.21), quando aduz,
A pena de prisão não ressocializa nem proporciona a reintegração social
futura do condenado ao modelo socionormativo, opera teoricamente a tutela
dos bens jurídicos, sem conseguir reduzir o conflito violento de interesses.
Como é impossível aboli-la, cumpre ao Estado, como instrumento de prevenção
geral positiva limitadora, reservá-la aos portadores de comportamentos
transgressores de especial gravidade à ordem jurídico-social, intolerados
pela macrossociedade, e efetivar através de intervenção garantista a reforma
efetiva da gestão penitenciária diante da crise da prisão, assegurando o
respeito à dignidade da pessoa humana presa, garantida por um estado social
e democrático de direito.

E com ele concorda Guillermo Etcheverry, (2002, p.17),
Es por todos conocido que la pena privativa de libertad no tiene los efectos
declarados, ya que no repara el daño ocasionado, no es una herramienta de
resocialización y favorece la reincidencia: las condiciones indignas de la
vida en prisión destruyen progresiva e irreparablemente los rasgos de
humanidad, la subjetividad e identidad de las personas. El funcionamiento
del sistema penal sigue manifestando su ineficiencia. Desde ese punto de
vista podríamos decir que la pena privativa de libertad ha fracasado y que
al presente los penalistas no encuentran cómo suplirla. Irwin identifica
tres etapas en el deterioro de la persona privada de libertad ambulatoria:
desintegración, desorientación, degradación. Una progresión elocuente que
obliga a la acción. La idea de que la privación de la libertad prepara desde
el aislamiento a un individuo para vivir libremente y formar parte de una
comunidad demuestra ser una falacia.

Daí porque Eugenio Raul Zaffaroni (2009, p. 139) adverte:
La prisión o ‘jaula’ es una institución que se comporta como una verdadera
máquina deteriorante: genera una patología cuya característica más saliente
es la regresión, lo que no es difícil de explicar. El preso o prisioneiro es
llevado a condiciones de vida que nada tienen que ver con las del adulto; se
le priva de todo lo que usualmente hace el adulto o no conoce. Por otra
parte, se le lesiona la autoestima en todas las formas imaginables: pérdida
de privacidad y de su propio espacio, sometimiento a requisas degradantes.

As funções declaradas da pena prescrevem um dever ser e legitimam o
funcionamento de justiça; numa segunda perspectiva, a pena exerce uma função
na economia, isto é, a pena é determinada em relação aos sistemas econômicos
e sociais de determinada época e sociedade, com a finalidade de atender aos
interesses da classe dominante.
Poder-se-ia afirmar que o cárcere teria a função de Intimidação do infrator,
contudo, é pacífico o entendimento de que a pena de prisão não intimida.
Os cárceres estão abarrotados de pessoas que não se amedrontaram diante da
pena e pelas ruas circulam milhares de criminosos a praticarem toda sorte de
delitos indiferentes à possibilidade de serem presos e apenados. D’outra
banda não socializa, afinal um um meio criminógeno jamais poderá cumprir uma
função, senão de aperfeiçoamento no crime, nos fazendo concluir que este
processo de readptação, encontra alguns entraves de ordem natural,
intransponíveis, sendo eles:

3.2 ISOLAMENTO

O primeiro fator a impedir a recuperação do condenado é o isolamento ao qual
ele é submetido, pois ao adentrar nos portões e os muros de um
estabelecimento prisional, deixando o convívio com a familia e os amigos,
além de despojar-se de todos os papéis que desempenhava nos diversos núcleos
sociais, para transformar-se num encarcerado, ainda que todos os outros
males que venham a ser provocados pela prisão fossem desconsiderados, o
simples fato de estar excluído do mundo livre e de sua família, representa
um grande obstáculo à sua reabilitação.
No mundo fechado da prisão é difícil sugerir e propor respostas de
comportamento para a vida em liberdade. O homem, por sua própria natureza,
nasceu para a liberdade e não para a prisão. Se esta não lhe ofertar
possibilidade de transformação, enfrentará o desconcertante entrave de não
readaptar-se posteriormente na sociedade e tornará facilmente a delinquir.
Pontua Odete Oliveira (2003, p. 51),
Privação de liberdade é o pior dos sofrimentos que se pode impor ao ser
humano. O rompimento compulsório com a família, principalmente com os
filhos, com o recinto e a privacidade do lar, via de regra, é o mais difícil
de suportar.

Leciona Tiago Cabral (2006, p. 22),
A manutenção do contato e o convívio com a família proporcionam condições
para estruturar o ambiente familiar e tornam possível ao condenado o retorno
ao lar, encontrando em seus entes, pessoas carinhosas, saudáveis, e que o
amam, o conforto das longas horas de solidão e aprisionamento.

Assim enfrentamos o primeiro ponto a justificar a dificuldade de adptação do
condenado, qual seja, o isolamento decorrrente da prisão e a perda do
referencial da família e amigos, instrumento fundamental para a busca do
equilibrio do recluso.

3.3 PRIVAÇÕES

3.3.1 PRIVAÇÃO DE BENS
Considere-se que o encarcerado ao estar sob o julgo do sistema penitenciário
fica privado de possuir qualquer objeto que possa traduzir alguma espécie de
conforto material, isto porque, ao ingressar no presídio, todos os seus
objetos pessoais são entregues a administração prisional, resguardando-se
poucos artigos de higiene pessoal.
Como esclarece Goffmann (1974, p.26-7),
Uma vez que o internado seja despojado de seus bens, o estabelecimento
precisa providenciar pelo menos algumas substituições, mas estas se
apresentam sob forma padronizada, uniformes no caráter e uniformemente
distribuídas (…) o fato de não dar chaves aos internos e as buscas e os
confiscos periódicos de propriedade pessoal acumulada reforçam a ausência de
bens.

Azevedo (1999, p. 50), afirma,
O cárcere contraria todo ideal educativo moderno de estimular a
individualidade e o auto-respeito, alimentado pelo respeito ao educador. Os
rituais de degradação no começo da detenção, despojando o encarcerado dos
símbolos exteriores da própria autonomia (vestimentas e objetos pessoais)
constituem o oposto. A educação fortalece o sentimento de liberdade e
espontaneidade do indivíduo; a vida carcerária, como universo disciplinar,
tem o caráter repressivo e padronizador. (sem grifos no original)

3.3.2 PRIVAÇÃO DAS MÍNIMAS CONDIÇÕES DE PRIVACIDADE E HIGIENE

Estabelece a Lei de Execuções Penais(Brasil, Legislação Penal, Lei 7.210/84)
no seu art. 88,
O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho
sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração,
insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).

As condições encontradas nos estabelecimentos prisionais são outros aspectos
que não permitem a reeducação do condenado, pois são extremamente precárias.
Embora a LEP traga comando normativo das condições mínimas de salubridade,
espaço e higiene, notadamente as condições assistidas no Brasil, passam
longe das razoáveis para educar um indivíduo para ser reintegrado ao
convívio social.
A matéria também é disciplinada pela ONU, através das Regras Mínimas para o
tratamento de reclusos, (nº 10. 2005): “Reconhece que os locais das prisões
devem corresponder às exigências mínimas de higiene, espaço físico mínimo,
iluminação, calefação e arejamento.
Dessa forma, as más condições de higiene, por sua vez, representadas pela
falta de circulação de ar, a grande concentração de umidade, os odores
fortes, a imensa quantidade de insetos e parasitas, são encontradas nas
celas, corredores, e até mesmo, nas cozinhas, debilitando a saúde dos presos
e comprometendo o desenvolvimento de qualquer tarefa que tenha por objetivo
reintegrá-los à sociedade, sendo um segundo aspecto negativo à
ressocialização.

3.3.3 PRIVAÇÃO DE AUTONOMIA

Uma das características do sistema prisional é o seu fechamento ou seu
caráter total representado pela barreira à relação social com o mundo
externo e por proibição à saída que, muitas vezes, estão incluídas no
esquema físico, por exemplo: portas fechadas, paredes altas, arames
farpados, poços, fossos, águas, florestas ou pântanos.
Demais disto a sujeição do indivíduo ao convívio atrás das grades, o submete
a regras rígidas estabelecidas pela administração prisional fazendo que eles
sejam submetidos a uma vida fechada e formalmente administrada.
Pontua Odete Oliveira (2003, p. 53),
No sistema prisional, o estado de subordinação à direção do estabelecimento,
aos guardas, aos regulamentos, às regras, aos horários, às ordens e
contra-ordens e revistas é total. Tal situação não enseja a mínima
possibilidade de escolha ou opção por parte do preso. A obediência ao
comando e ao corpo burocrático não permite ao interno manifestar sua
opinião, externar sua vontade ou interesse. A consequência desta
característica de completo cerceamento é, sem dúvida, de uma grande apatia
ou frustração indizível.

O automatismo coercitivo a que são submetidos todos os reclusos retira-lhes
completamente a iniciativa e até os desejos mais reservados, a ponto de se
apresentarem hesitantes entre o fazer e o não fazer, com o próprio senso de
autodeterminação alterado, aguardando que outros tomem decisões por eles.

3.3.4 PRIVAÇÃO DE SEGURANÇA
Embora possa parecer um paradoxo o fato do indivíduo estar submetido a uma
instituição total – penitenciária, implica numa constante sensação de
insegurança.
A privação de segurança se faz sentir com grande intensidade no dia-a-dia do
prisioneiro. Nunca é possível saber o que poderá acontecer num presídio:
violência, brutalidade e ameaça que ocorrem nos meios prisionais,
culminando, muitas vezes, em rebeliões, motins, fugas e mortes.
Esta sensação coloca os presos em estado de alerta diuturnamente pois a
reprodução do processo de violência pode desencadear uma resposta estatal
imediata e com consequencias graves à integridade física e psicológica do
encarcerado.

3.3.5 PRIVAÇÃO DE RELAÇÕES HETEROSSEXUAIS

Por expressa previsão da legislação brasileira é possível a visita íntima
dos internos submetidos ao sistema prisional do nosso país.
Estabelece o Art. 41 da LEP (Brasil, Legislação Federal, Lei 7.210/84):
Constituem direitos do preso:
[…]
X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em alguns dias
determinados (…)

Reforçando a legislação existente, a resolução número 1 do Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), publicada em 30 de Março de
1999, recomendava aos Departamentos Penitenciários Estaduais ou órgãos
congêneres que fosse assegurado o direito à visita íntima aos presos de
ambos os sexos, recolhidos aos estabelecimentos prisionais.
Todavia, o exercício deste direito nem sempre é respeitado no sistema
prisional, seja pelas exigências estabelecidas pela própria administração
prisional, seja pela falta de condições materiais para a execução do
benefício, estando muitas vezes o prisioneiro privado da possibilidade de
contato sexual com seu(a) parceiro(a). Isto nos faz concluir que para o
detento, uma das mais terríveis de todas as privações e sofrimentos impostos
na prisão é o tolhimento da realização de atos sexuais que estava acostumado
na sua vida extra-muros. Ao estar impedido de manter relações
heterossexuais, sente-se ferido em sua masculinidade e, então, é acometido
de verdadeiro sentimento de castração simbólica, ou então, opta por relações
de caráter homosexual na própria prisão.
Demais disto, o ócio e a ausência de exercícios físicos aumentam ainda mais
o desejo sexual, nas palavras de Jiminez Ásua (apud DONNICE, 1976, p.74): “A
incontinência sexual é uma espécie de pena acessória principal”.
Júlio Fabbrini Mirabete (2004, p. 125), por sua vez, observa que,
a abstinência sexual pode causar graves danos à pessoa humana, podendo
desequilibrar a pessoa e favorecer condutas inadequadas. Desse modo, vem
ganhando corpo nas legislações a orientação de se conceder permissão de
saída ou visita íntima como solução do problema sexual das prisões.

Importante anotação sobre o tema faz Tiago Cabral, (2006, p. 27),
A repressão do instinto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da
personalidade do indivíduo. Enfim, torna-se impossível falar de
ressocialização em um meio carcerário que deforma e desnatura um dos
instintos fundamentais do homem, e ainda tortura física e psicologicamente o
condenado, não dando a mínima condição para um tratamento digno e que surta
resultado.

A visita íntima é um dos fatores de manutenção da conexão do presidiário
com o mundo exterior e funciona como incentivo efetivo para que o mesmo,
passado o período de cumprimento da pena, seja reinserido no seu núcleo
familiar e social, contando com certas peculiaridades como afirma Carvalho,
(2005, p.3),
Assim, a visita íntima do marido, mulher, companheiro ou companheira, deverá
estar sempre condicionada ao comportamento do preso, à segurança do presídio
e às condições da unidade prisional sem perder de vista a preservação da
saúde das pessoas envolvidas e a defesa da família. Trata-se de uma questão
delicada a ser encarada com muita responsabilidade, em benefício da própria
população carcerária. No entanto, a visita da família é um direito
incontestável, que deve ser incentivado, como elemento de grande influência
na manutenção dos laços afetivos e na ressoacialização do preso.

Além disto, temos que muitas vezes os presidiários acabam sendo vítimas
“assaltos sexuais”, gerando inegável violação ao inelieável direito de
preferência sexual, pela perda da autonomia do consentimento e reflexamente
ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana.
Na verdade, incorre-se em grave contradição quando se busca a correção e a
(re)socialização do apenado e, ao mesmo tempo, ignora-se o problema sexual
ou se pensa que este não requer atenção especial.
Conforme assinala Cézar Bitencourt (2001, p. 202):
A repressão do instinto sexual propicia a perversão da esfera sexual e da
personalidade do indivíduo. Enfim, é impossível falar de ressocialização em
um meio carcerário que deforma e desnatura um dos instintos fundamentais do
homem.

3.3.6 PRIVAÇÃO DE UM TRATAMENTO HUMANITÁRIO

Uma outra questão que apresenta-se como empecilho a socialização é a forma
como o preso acaba sendo tratado na estrutura penitenciária, perdendo sua
identidade e passando por humilhações e tratamento desumano e degradante.
Logicamente que o homem é produto do meio, e também os responsáveis pelo
encarceramento encontram-se custodiados, explico: conviver todos os dias em
um estabelecimento prisional afeta diretamente os próprios agentes do
sistema, associe-se a este fato, o baixo nível cultural dos guardas
prisionais, via de regra, e a ausência de critério seletivo têm criado
grande vulnerabilidade do sistema penitenciário.
Kent (1988, p. 53-4) sustenta,
Las ideas y las normas – por excelentes que fueren – de poco servirán sin la
coetánea presencia de un personal preparado y motivado para cumplir un reto
resocializador de significativa monta, razón por la cual deberá ponerse
especial cuidado en la selección, en la formación y en el perenne
perfeccionamiento de las personas llamadas a afrontar este compromiso tan
noble y humano que les permita sentirse útiles a sí mismos y, sobretodo, en
gracia de una pléyade de marginados que tienen derecho inalienable a
regresar para el disfrute de las bondades incomensurables de la libertad.

A falta de um plano de carreira, de uma remuneração digna, de condições
salubres de trabalho, de uma jornada de trabalho adequada, impõe aos agentes
de presídio um nível de stress elevadíssimo que repercute, muitas vezes, no
tratamento dos internos.
Desse modo, a deficiência na seleção dos agentes penitenciários e a escassez
de recursos para a correta manutenção dos estabelecimentos, além da
preocupação exacerbada com a disciplina e a segurança para evitar rebeliões
e fugas, conduzem a uma precária e, às vezes, brutal assistência aos presos.
Assim podemos afirmar que, na maioria dos casos, o tratamento dispensado aos
internos além de ser desumano é humilhante, sádico e impiedoso,
consubstanciado em maus-tratos verbais (insultos, grosserias, gritos, uso de
palavras ofensivas) e físicos (pancadas, tapas, chutes, murros, enfim, todo
tipo de crueldade) que só contribuem para a degradação moral do condenado.
Acreça-se a este fato que a manutenção do objetivo maior do Estado está no
custodiamento e na manutenção da ordem interna dessa sociedade, mas o
desenvolvimento desta ação concentra um poder repressivo nas mãos de muito
poucos, abrindo infindável abismo entre os mandantes e os mandados,
verdadeiro regime totalitário, em que os presos são submetidos a um
exacerbado controle extremo, por meio de constante vigilância e minucioso
regulamento, a uma estrutura severa e limitada, de privacidade impossível,
em que a conduta e a intimidade de cada um são observadas pelos demais.
De fato, o convívio no estabelecimento penitenciário, desrespeitando as
regras mínimas de tratamento de preso, ofende a dignidade da pessoa humana e
desrespeita os direitos fundamentais. De mais a mais, é imposição que recai
sobre o Estado respeitar, proteger e promover as condições que viabilizem a
vida com dignidade.
Sobre este ponto, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem afirmado
reiteradas vezes que,
Quien sea detenido tiene derecho a vivir en condiciones de detención
compatibles con su dignidad personal y el Estado debe garantizarle el
derecho a la vida y a la integridad personal.

Sendo certo que o Estado é único responsável pelos estabelecimentos
destinados a custódia de pessoas detidas e deve garantir os seus direitos,
sendo corrente na jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos
Humanos, senão vejamos,
la Convendón toda persona privada de Iibertad tiene derecho a vivir en
condiciones de detcnción compatibles con su dignidad personal y eI Estado
debe garantizarle el derecho a la vida y a la lntegridad personal. En
consecuencia, el Estado, como responsable de los establecimientosde
detención, es el garante de estos derechos de los detenidos (Caso Neira
Alegría y otros. Sentencia del 19 de enero de 1995. Serie C, nº 20, pár.60.)

No mesmo sentido,

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Durand y Ugarte, Sentencia de
16 de agosto de 2000. Serle C, nº 68, párr.78.

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Cantoral Benavides. Sentecia
del 18 de agosto de 2000. Seric C, n.º69, párr.87.

CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Castillo Petruzzi. Sentencia
del 30 de mayo de 1999. Serie C, nº 52, párr.195.
A Corte Internacional de Justiça, na sentença do “caso Barcelona Traction”,
sustentou que,
Los principios y las reglas concernientes a los derechos fundamentales de la
persona humana, crean obligaciones respecto de la Comunidad Internacional en
su conjunto’. La importancia de los derechos hace que ‘Todas los Estados
puedan ser considerados como teniendo un interés jurídico en que esos
derechos sean protegidos, por lo cual las obligaciones de que se trata son
obligaciones ‘erga omnes’ (CIJ, 5-2-1970).

3.4 DOS DIREITOS NÃO ATINGIDOS PELA CONDENAÇÃO

Estipula o art. 38 do Código Penal Brasileiro (Brasil, Legislação Federal,
Lei 7.209/84):
Art. 38 – O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da
liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade
física e moral. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Considere-se a prisão como resposta estatal decorrente de ofensas as regras
do contrato social (Rosseau). Por estas mesmas normas cada cidadão abre mão
de uma parcela dos seus direitos em favor do grupo social com o objetivo de
harmonizar a convivência com o respeito a todos os direitos não atingidos
pela sanção estatal.
A LEP prevê em seu art. 3º, que são assegurados ao condenado todos os
direitos não atingidos pela sentença. O preso, apesar de perder uma gama de
direitos normalmente usufruídos por aqueles em liberdade, não pode perder
todo e qualquer direito, sem qualquer relação com o cumprimento da pena.
Assim, não deixa de ser um sujeito de direitos, mesmo que esta afirmação não
possa ter a plenitude que teria no caso de se falar de um indivíduo em
liberdade.
Joe Graeff Filho ( 2011, p. 202 ) observa,
Quando o infrator for levado ao cárcere, o Estado deve ter como premissa
básica o fato que está retirando do sujeito apenas sua liberdade, parte que
apesar de integrar sua dignidade, abriu mão ao praticar o delito, mas todas
variáveis devem ser garantidas, pois, a prisão não deve, para o bem da
própria sociedade, ser vista como um castigo, mas sim como a oportunidade
reconstrução dos preceitos éticos esquecidos. Como um retorno ao começo,
inicia-se novo processo de educação informal e se necessário formal. A
correção pela prisão deve visar o preenchimento das lacunas deixadas na
formação do indivíduo e que propiciaram o desvio delitivo como forma de
garantir uma nova oportunidade.

Por esta razão o preso tem assegurado o direito ao respeito de sua
integridade física (CF art. 5°, XLIX), sendo passível de apuração de
responsabilidade qualquer abuso neste sentido, seja na condição de abuso de
autoridade (Brasil, Legislação Federal, Lei 4.898/65), ou nas disposições da
Lei de Tortura (Brasil, Legislação Federal, Lei 9.455/97).
A condenação criminal transitada em julgado suspende automaticamente os
direitos políticos, enquanto durarem seus efeitos (CF, art. 15, III),
consoante a lição de SILVA: (2013, p.349): “O núcleo fundamental dos
direitos políticos consubstancia-se no direito eleitoral de votar e ser
votado, embora não se reduza a isso”.
Não podemos perder de vista que a condenação em caráter definitivo, gera em
favor do Estado um título executivo, sentença penal transitada em julgado,
que encerra um comando mandamental referente ao tempo de custódia que será
submetido o condenado, contudo, embora custodiado, permanecerão incólumes
diversos direitos do condenado, tais como:
a) O direito à vida: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade”. (art., 5°, caput, da CF). Desta
forma é dever do Estado zelar pela preservação do direito a existência do
condenado, não podendo, em hipótese alguma, sonegar este direito sob pena de
grave violação aos Direitos Humanos;
b) O direito à integridade física, psíquica e moral: prevê o art., 5, III,
da Constituição Federal, que “ninguém será submetido a tortura nem a
tratamento desumano ou degradante”, e em seu inciso V, assegura o direito de
resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material,
moral ou à imagem. Complementa no inciso X do Art. 5º, da carta política,
que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação”, além da individualização da pena, previsto no
inciso XLVI, do art. 5º da CF; assim, uma vez entregue a custódia estatal o
preso tem garantido que não será submetido a quaisquer espécie de violência,
sobretudo, a tortura, além de ter preservado o direito à imagem;
c) O direito à liberdade de convicção religiosa: é inviolável a liberdade de
consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos
religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a
suas liturgias (art. 5º, VI da CF). E ainda, nenhum preso ou internado
poderá ser obrigado a participar de atividade religiosa (art. 24, § 2º da
LEP). O Direito à religião também é previsto no art. 5º, VII da CF/88;
d) Direito à instrução: todo cidadão terá direito ao ensino fundamental,
obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para
todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria (art. 208, I, CF). No
art. 215, da Constituição Federal, está previsto que o Estado garantirá a
todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura
nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das
manifestações culturais;
Nas unidades prisionais a assistência educacional compreenderá a instrução
escolar e a formação profissional do preso e do internado (art. 17 da LEP).
O ensino fundamental será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da
Unidade Federativa (art. 18 da LEP). Já o ensino profissionalizante será
ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico (art. 19 da
LEP).
A mulher condenada à pena restritiva de liberdade, terá ensino profissional
adequado à sua condição. Todas as atividades educacionais podem ser objeto
de convênios com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou
ofereçam cursos especializados. Em atendimento às condições locais,
dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as
categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e
didáticos;
e) Direito à assistência jurídica: o Estado deverá prestar assistência
jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos
(art. 5º, LXXIV, da CF). E ainda, os artigos Art. 15 e 16 da LEP garantem a
assistência jurídica, destinada aos presos e aos internados sem recursos
financeiros para constituir advogado. As Unidades da Federação deverão ter
serviços de assistência jurídica nos próprios estabelecimentos penais;
f) Direito ao uso do nome: constitui um dos direitos do preso o chamamento
nominal (art. 41, XI da LEP). Os apelidos e a numeração são proibidos nas
unidades prisionais.
g) Direito à alimentação, alojamento e vestuário (art. 41, I da LEP). A
assistência material ao preso e ao internado consistirá no fornecimento de
alimentação, vestuário e instalações higiênicas (art. 12 da LEP);
h) Direito a tratamento médico, farmacêutico e odontológico;
i)Direito ao trabalho remunerado. O direito ao trabalho é regulamento pelo
artigo 39 do Código Penal e art. 28 a 37 da LEP. O trabalho do condenado,
como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa
e produtiva;
j) Direito de comunicar-se reservadamente com seu advogado;
k) Direito à previdência social. O art. 41 da LEP resguarda os direitos à
previdência social, nos termos da art. 43 da LOPS, além do seguro contra
acidente de trabalho;
l) Direito à proteção contra qualquer forma de sensacionalismo (art. 41,
VII, da LEP;
m) Direito de igualdade de tratamento, salvo quanto às exigências da
individualização da pena (art. 41, XII da LEP);
n) Direito a visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias
determinados (art. 41, X, da LEP);
o) Direito de contato com o mundo exterior por meio de correspondência
escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a
moral e os bons costumes (art. 41, XI, da LEP e art. 5º XII da CF);
p) É garantido o direito de propriedade, seja ela material ou imaterial,
(art. 5°, incisos XXII, XXVII da CF), ainda que o preso não possa
temporariamente exercer alguns dos seus direitos;
q) O direito a indenização por erro judiciário ou judicial está guarnecido
pelo art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal, quando determina que o
Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar
preso além do tempo fixado na sentença;
r) Todo preso tem o direito de ser informado de seus direitos, entre os
quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família
e de advogado (art. 5º LXIII, da CF);
s) O preso também tem direito à identificação dos responsáveis por sua
prisão ou por seu interrogatório policial (art. 5º LXIV, da CF);
Podemos afirmar que administração penitenciária tem o dever de respeitar os
direitos fundamentais dos reclusos de forma a assegurar o exercício de todos
os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei e a esse dever
corresponde a obrigação do preso de respeitar as normas do regimento interno
reguladoras da vida do estabelecimento. Assim é vedado por lei qualquer
manifestação de exercício arbitrário do poder, através de ato de violência,
intolerância, irracionalidade ou em confronto com os princípios consagrados
na Carta Política. Restando preservados o direito à vida, à dignidade, à
liberdade, à privacidade, estes em coordenação ao princípio da dignidade da
pessoa humana.
Note-se que a execução penal deve ser regida pelo princípio da legalidade e
que assegura que os presos só podem ter restrições de direitos quando
previamente previsto em lei, garantindo ao condenado liberdade de
pensamento, união familiar, privacidade.

3.5 DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

Outro princípio que assegura efetivação dos direitos dos presos concerne ao
princípio da individualização da pena que propõe que a pena seja aplicada
àquela pessoa individualmente considerada, de forma a possibilitar o livre
desenvolvimento da sua personalidade individual e que deve haver proporção
entre ação e reação, entre gravidade do crime e gravidade da pena e que a
pena deve ser cumprida dentro do marco constitucional de respeito à
dignidade do sentenciado e não em função dos anseios sociais de punição.
Neste sentido a individualização ocorre num primeiro momento com adoção do
art. 59 CP e seus incisos, devendo o juiz partir para a fixação da
pena-base, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequencias do
crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja
necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. A
individualização da pena para além de ser um direito fundamental, conforme
dispõe o art. 5° incisos XLV e XLVI da Carta Maior, está estritamente
vinculada aos princípios e garantias do Estado de direito e à política
criminal definida pela Constituição, exigindo uma estreita correspondência
entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a ser aplicada, de
maneira que a pena atinja suas finalidades de prevenção e repressão. Assim,
a imposição da pena depende do juízo individualizado da culpabilidade do
agente (censurabilidade de sua conduta), sendo uma garantia do condenado
contra o arbítrio judicial.
Outro princípio que assegura efetivação dos direitos dos presos concerne ao
princípio da individualização da pena que propõe que a pena seja aplicada
àquela pessoa individualmente considerada, de forma a possibilitar o livre
desenvolvimento da sua personalidade individual e que deve haver proporção
entre ação e reação, entre gravidade do crime e gravidade da pena e que a
pena deve ser cumprida dentro do marco constitucional de respeito à
dignidade do sentenciado e não em função dos anseios sociais de punição.
A individualização da pena é um direito fundamental, conforme dispõe o art.
5° incisos XLV e XLVI da Carta Maior (Brasil, Legislação Federal,
Constituição Federal 88):
A lei regulará a individualização da pena (…) e nenhuma pena passará da
pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do
perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e
contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido,
respectivamente.

O fundamento individualizador da pena (Strafzumessungsgrund), na concepção
clásica Spendel (Günter Spendel. Zur Lehre, p. 1954, p. 191.) comprende tres
significados: real, final y lógico,
el concepto ‘fundamento individualizador de la pena’ puede entenderse, en
primer lugar, como “fundamento real” (Realgrund), o causa essendi de la
medida de la pena. Con ello se quiere aludir a los antecedentes de hecho y
circunstancias que necesariamente tienen que ser tenidas en cuenta. Los
ejemplos que señala el autor son clarificadores: el extraordinario valor de
las cosas robadas, la especial brutalidad de unos malos tratos, o el número
de muertos como consecuencia de una acción imprudente. En segundo lugar,
tiene el significado de ‘fundamento final’ (Zweckgrund) o causa finalis, lo
cual significa preguntarse por el fin que se persigue con la imposición de
la pena. Por último, está el ‘fundamento lógico’ (logischer
Strafzumessungsgrund) o ratio cognoscendi, que vincula los presupuestos de
la individualización con la individualización misma.

A individualização da pena, pelo modelo atual, se dá em três fases: legal,
judicial e administrativa. No primeiro momento, o legislador escolhe os bens
jurídicos que irá proteger, aquilata a forma de proteção, estabelecendo o
comando secundário da norma penal com o seu carater sancionador; No segundo
momento, o Estado Juiz, através do Poder Judiciário, encontrando a ativação
do tipo penal através da conduta, subssume o atuar do agente a norma penal
formando a tipicidade e delimitando, no caso concreto, a quantidade de pena
aplicável a infração, e finalmente, no momento em que o título judicial se
torna firme, sentença penal transitada em julgado, temos por parte do Poder
Executivo o acompanhamento da execução penal de forma individualizada.
José Guzmán Dalbora aborda o Tema (2010, p. 128),
La tripartición de la individualización penal en unas etapas legal, judicial
y administrativa tampoco se avienen con la Constitución de un Estado de
Derecho. Bien mirado, el desprecio por la individualización legal, así como
la dilatación de las atribuciones jurisdiccional y administrativa en las
especies judicial y penitenciaria.

Carmem Silvia de Moraes Barros (2001, p. 129) afirma que a execução penal,
bem como as demais fases de individualização da pena, está estritamente
vinculada aos princípios e garantias do Estado de direito e à política
criminal definida pela Constituição, no que concorda Alexandre de Moraes
(2007), ao ponderar que o referido princípio exige uma estreita
correspondência entre a responsabilização da conduta do agente e a sanção a
ser aplicada, de maneira que a pena atinja suas finalidades de prevenção e
repressão.
A primeiro momento da individualização, ocorre na esfera legislativa,
conforma anota Patricia Ziffer, (1999, p. 61),
Las valoraciones previamente dadas por el legislador, reflejadas en el marco
penal, son vinculantes para el juez, quien debe dejar de lado sus propias
valoraciones y aplicar las valoraciones legales. Según Bruns, las
valoraciones judiciales deben ceder paso a las del legislador aun en caso de
duda respecto de la constitucionalidad de la escala.

Posteriormente a individualização ocorre perante o Poder Judiciário, e de
acordo com o caso concreto, seguindo as diretivas do art. 59 CP e seus
incisos, o que Raymond Saleilles, chamou de “adaptación de la pena al
individuo”, devendo o juiz partir para a fixação da pena-base, atendendo as
regras do art. 59 do CP.
Este modelo apresenta três teorias que buscam explicar a individualização
judicial da pena, conforme ensina, Eduardo Demetrio Crespo (1999, p. 43),
Modelos principales de solución al problema: TEORÍA DE LA PENA EXACTA O
PUNTUAL (Punktstrafetheorie) considera posible calcular exactamente en el
caso concreto cuál es la pena que corresponde a la culpabilidad del autor y,
aunque dentro de ciertos límites cabe tener distinta opinión sobre la pena
aplicable a un caso concreto, esto se debe a la limitación del conocimiento
humano sobre el problema de la culpabilidad. LA TEORÍA DEL ESPACIO DE JUEGO
(Spielraumtheorie) y LA TEORÍA DEL VALOR JERÁRQUICO DEL EMPLEO
(Stellungswerthearie), buscan el equilibrio entre la función preventiva de
la pena y de sus limitaciones a través de los principios de proporcionalidad
a la gravedad del injusto y a la culpabilidad del autor. La “teoría del
espacio de juego”, elaborada por la jurisprudencia alemana, afirma que la
pena adecuada a la culpabilidad comprende un marco determinado entre un
máximo y un mínimo. El marco de la culpabilidad no es sino una fase
intermedia en el camino para la determinación de la pena última, que debe
ser una pena puntual. Una cuestión importante es que este marco no debe
confundirse con el marco de la revisabilidad del arbitrio judicial.

Fabiano Yuji Takayanagi (2010, p .1067) anota,
A aplicação da pena privativa de liberdade deve seguir um procedimento
trifásico, no qual o magistrado deverá adotar o seguinte caminho: a fixação
da pena-base, para então, levar em consideração as circunstâncias atenuantes
e agravantes, por fim, adotar as causas de diminuição e aumento de pena,
conforme dita o artigo 68 do Código penal, motivando cada passo adotado
respeitando o art. 93, IX da Constituição Federal, sob pena de nulidade da
decisão.

Patricia Ziffer (1999, p.49) sustenta,
La individualización de la pena es el acto por el cual el juez pondera la
infracción a la norma y la transforma en una medida de pena determinada. La
magnitud de la pena es siempre expresión de la ponderación del ilícito
culpable; no es otra cosa que la ‘cuantificación de la culpabilidad.’

Manuel de Rivacoba( 995, p.55) por sua vez observa,
Individualización el proceso por el cual se adapta y concreta para el
singular suceso delictivo la abstracta previsión penal de la ley para la
especie o categoría criminosa a que pertenezca, escogiendo para aquél y
haciendo cumplir al reo la magnitud y la posibilidad, de las comprendidas
dentro de los limites de dicha previsión.

A individualização da pena para além de ser um direito fundamental, está
estritamente vinculada aos princípios e garantias do Estado de Direito e à
política criminal definida pela Constituição, exigindo a apreciação do juízo
individualizado da culpabilidade do agente (censurabilidade de sua conduta),
sendo uma garantia do condenado contra o arbítrio judicial.
Mir Puig (apud CRESPO 1999, p. 32) assinala que,
por ‘determinación de la pena’ se entiende la fijación de la pena que
corresponde al delito, y que ello afecta tanto a la clase como a la cantidad
de pena, incluyendo en un sentido amplio la decisión acerca de la suspensión
de la pena o su sustitución por otras penas o por medidas de seguridad.
Aclara, además, que en ese esquema la determinación de la pena posee un
momento legal y otro judicial, a los que debe añadirse la intervención de la
Administración penitenciaria en la ejecución de las penas privativas de
libertad.

Fabiano Yuji Takayanagi (2010, p .1067) informa: “para a dosimetria da pena,
deve o julgador ter uma cuidadosa ponderação dos efeitos étnico-sociais da
sanção penal e das garantias constitucionais, especialmente a garantia da
individualização do castigo”.
José Guzmán Dalbora (2010, p. 115),
De ahí que la individualización tiene que ser refractaria a la
conmensuración de la pena, a la exigencia valorativa de graduarla según el
hecho concreto del autor, y que la vieja individualización objetiva, atenta
nada más que a la gravedad del resultado antijurídico, tampoco merece aquel
rótulo, sino el de un ensayo imperfecto e incompleto de conmensuración.

Manuel de Rivacoba (1995, p.59),
La piedra basal o el punto de partida de la individualización de la pena
por el juez reside en su apreciación de la intensión o la extensión del
perjuicio inferido por el delito que está juzgando al correspondiente bien
jurídico, o de la situación de riesgo creada por aquél para éste o en las
infracciones permanentes, del grado y la duración de la compresión que
impida o reduzca su normal goce o ejercicio. Sólo en los delitos cuyo
resultado consiste en la destrucción total del respectivo bien jurídico no
cabe una graduación de lo injusto; y así, efectivamente, desde un punto de
visa objetivo, hablando sólo de antijuridicidad, no hay un homicidio más
grave que otro, sino que todos son iguales.

Finalmente a fase de individualização na esfera administrativa, isto é,
quando irrecorrivelmente condenado passa a executar a pena, devendo o Estado
Juiz classificar o apenado de acordo com as suas condições individuais ao
fim de garantir a sua segurança e que o cumprimento da pena atinja seus
reais objetivos.
José Guzmán Dalbora (2010, p. 125), explica,
Aquí interviene la individualización administrativa, encomendada a la
administración penitenciaria. En ella reposa el quicio de la
individualización, consistente en definir el régimen aplicable al sujeto y
su duración, con lo que Saleilles viene a parar, como quienes le precedieron
en este rumbo intelectual, en la sentencia indeterminada.

Para efeito de efetivação do postulado de garantia expresso na Carta
Política é garantido ao preso atenção ao devido processo legal na apreciação
dos seus requerimentos e eventuais punições que devem ser apreciados e
julgados por juiz natural e imparcial, garantido o contraditório com
produção de provas, a ampla defesa com assistência técnica indispensável,
que as decisões sejam fundamentadas para proporcionar análise por outras
instâncias, além do direito a um processo sem dilações indevidas.
Finalmente fica assegurado ao preso atenção ao princípio da humanidade que
assegura ainda o direito de cumprir pena perto dos familiares
(identificando-se com o princípio da intranscendência da sanção penal, pelo
qual a pena não passará da pessoa do condenado); direito à intimidade, à
privacidade, à liberdade de expressão e ao sigilo da correspondência.
Portanto, podemos concluir que é intolerável toda e qualquer forma de
arbitrariedade por parte da autoridade administrativa e as finalidades de
não-dessocialização e de harmônica integração social do preso, devem guiar
as medidas que se adotem durante o cumprimento da pena, devendo a autoridade
judicial garantir os direitos dos presos e determinar o seu cumprimento no
sistema penal e penitenciário
Ainda neste sentido, prescreve a LEP, art. 10º (Brasil, Legislação Federal,
Lei 7.210/84): “A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado,
objetivando prevenir o crime e orientar o retorno a convivência social”.

3.6 REGRAS MÍNIMAS PARA O TRATAMENTO DOS RECLUSOS

As regras mínimas para tratamento de reclusos são normas aprovadas no
Primeiro Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o
Tratamento dos Delinquentes, realizado em Genebra em 1955.
Estas regras não pretendem descrever em pormenores como deve ser o modelo de
sistema penitenciário, buscam apenas, fulcradas no consenso geral do
pensamento desta época, e nos elementos essenciais dos mais adequados
sistemas contemporâneos, estabelecer o que geralmente se aceita como sendo
bons princípios e práticas no tratamento dos reclusos e na gestão dos
estabelecimentos prisionais.
Anote-se que são regras que servem de referência para as diversas nações
mundiais e podem e devem ser aplicadas em todos os locais e em todos os
momentos. Demais disto, pretendem proteger os Direitos Humanos no seu
conjunto, através de condições mínimas aceitas como adequadas pelas Nações
Unidas.
Por outro lado, as regras abrangem uma área relativamente à qual o
pensamento evolui rapidamente, seja pela dinâmica social como pelas novas
tecnologias assimiladas pelo sistema e os desafios criados pelos presos.
Considerando que as regras não objetivam impedir experiências e práticas,
desde que as mesmas sejam compatíveis com os princípios e tentem incrementar
a realização dos objetivos das regras no seu conjunto.
Sobre elas se manifestou Luiz Garrido Guzmán (1976, p. 28),
El objeto de estas Reglas Mínimas es exponer los principios y las prácticas
que generalmente se aceptan como adecuados para el tratamiento de los
reclusos y la administración de los establecimientos penitenciarios. Con
este documento quedan coronados con éxito los persistentes esfuerzos
realizados bajo los auspicios de la Sociedad de Ias Naciones y, más
recientemente, de las Naciones Unidas, por resolver la palpitante cuestión
del tratamiento justo y humano de los delincuentes, presos o condenados a
penas de privación de libertad.[…] Las Regias Mínimas son, en cierto
sentido, una ley-tipo que se ofrece para su adaptación e incorporación a los
ordenamientos legales y a la práctica correccional en general. Desde hace
tiempo, la reforma penitenciaria se ha considerado como aquel aspecto de la
defensa social en el que el establecimiento explícito de normas es más
necesario y posible. En ellas se estudian prácticamente la totalidad de los
problemas que afectan a la realidad penitencaria.

3.7 DO PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

A socialização é um processo de influência mútua entre uma pessoa e seus
semelhantes, um processo que resulta da aceitação dos padrões de
comportamento social e da adaptação a eles. Ela se divide em dois caminhos:
a Socialização primária: onde a criança aprende e interioriza a linguagem,
as regras básicas da sociedade, a moral e os modelos comportamentais do
grupo a que se pertence, sendo de axial importância para o indivíduo e deixa
marcas muito profundas em toda a sua vida, já que é aí que se constrói sua
primeira visão de mundo e a formação do seu caráter, e a socialização
secundária, através da qual todo e qualquer processo subsequente que
introduz um indivíduo já socializado em novos setores, do mundo objetivo da
sua sociedade (na escola, através dos amigos, no trabalho), tem a
expectativa de servir como elemento de aprendizagem para o convívio em
sociedade, ou grupo, depositam neste indivíduo, novas formas de aculturação.

3.7.1 PAPEL DA FAMÍLIA NO PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO

Os processos de socialização iniciam-se na infância sendo de se destacar o
papel da família como primeiro referencial para o indivíduos no sentido de
lhe impor regras para o convívio em sociedade. Nota-se que a falha neste
primeiro passo indicará que a criança ao ter contato com o mundo exterior,
passara a receber de estranhos os limites que porventura não lhes foram
estabelecidos pela família.
No caso dos presos, nota-se que nos mais das vezes este processo não se
desenvolveu de forma adequada, ou seja, falhou, mas nem por isto se deve
desistir de retormar o processo de socialização, dai ser coerente a palavra
de Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, que faz uma interessante observação no
sentido de que: “incluir é abandonar estereótipos”, acaba adequando-se
perfeitamente a estes casos.
Na hipótese do cumprimento da pena privativa de liberdade, faz-se necessário
iniciar um novo processo de socialização como forma de incluir indivíduo
para retomar às suas atividades, de forma que tenha uma motivação para
viver, seja no seio de sua família, notadamente a partir de práticas não
compreendidas no período que esteve extra-muros. Estas práticas indicam, no
sentido de estimular o presidiário enquanto pessoa humana, empenhando-se no
exercício de um labor, ou através de práticas educativas, porquanto a
sociedade ocupa um papel demasiadamente importante nesta ocasião, pois cada
demonstração de rejeição ao ex-detento pode significar-lhe um incentivo ao
ócio e continuidade na prática delituosa, tudo o que se faz imprescindível é
mesmo o apoio e confiança a serem demonstrados, para que possa vir a motivar
o egresso a continuar sua vida distante da prática delituosa.
Caffarena (apud ARAÚJO, 2007, p.89), sabiamente anota,
Assim como a oportunidade do resgate da auto-estima por meio de uma
atividade qualquer, seja esta remunerada ou não, que venha enriquecer e
afastar o indivíduo do ócio vulgar e pernicioso, o apoio familiar e as
visitas constituem outro fator fundamental para a recuperação e a
valorização de vidas. O apoio familiar constitui-se em elemento fundamental,
pois produz no interno a intenção de não repetir os erros que o levaram ao
cárcere.

A complexificação da cena carcerária depende da conjunção de duas vontades:
1) da sociedade civil querer ocupar esse espaço; 2) da prisão se abrir para
circulação, e principalmente, permitir a presença nos seus espaços de
pessoas estranhas à instituição. Demais disto, a família que poderá auxiliar
na formulação deste novo modelo de socialização.
Desta forma demonstra-se como de axial importância o papel da família neste
processo, apoiando, orientando e auxiliando o condenado para o retorno da
vida em e a sociedade, não se podendo perder de vista, que o ex-detento é um
ser humano, clamando por uma oportunidade na sua vida, a qual corresponde a
viver em harmonia e sob tratamento igualitário, com os demais, sendo correto
o pensamento de Elionaldo Julião (2010, p. 542):
Compreendendo que os vínculos familiares, afetivos e sociais são sólidas
bases para afastar os condenados da delinquência, ou seja, evitar a
reincidência criminal, conforme já previsto na área socioeducativa, o
sistema carcerário deverá investir na implementação de um Plano Nacional de
Convivência Familiar e Comunitário para a política de execução penal,
primando-se por diretrizes e políticas que estreitem os laços familiares e
comunitários com os apenados, principalmente ampliando as perspectivas de
efetivamente se “mediar os possíveis conflitos” existentes.

3.7.2 SOCIALIZAÇÃO ATRAVÉS DO TRABALHO

Uma das premissas básicas para o processo de socialização do condenado é
encontrada no trabalho do preso.
O trabalho do preso é uma espécie de direito e dever ao mesmo tempo; Dever
por determinação das normas dos arts. 34 e 35 do CP na medida que impõe aos
condenados em regime fechado e semiaberto a sujeição ao trabalho durante o
dia como decorrência da condenação, d’outra banda é direito assegurado pela
LEP, art. 40, considerando os eventuais benefícios decorrentes do labor, em
especial a remição dos dias trabalhados.
O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana,
terá finalidade educativa e produtiva, sendo assegurado as regras de
organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e
à higiene. As regras de segurança do trabalho tem o objetivo promover a
proteção do trabalhador no seu local de trabalho, visando a redução de
acidentes de trabalho e doencas ocupacionais, estando regulamentadas por
leis específicas. O CP remete para a legislação especial a regulamentação
dos direitos do preso e do trabalho do preso.
O trabalho inegavelmente funciona como um elemento fundamental na
socialização do condenado, embora, apenas uma pequena parcela dos
encarcerados exercam uma atividade produtiva, ou qualquer forma de
aprendizado, razão pela qual Foucault (1986, p. 203), anotou,
o trabalho é definido como parte constituinte da ação carcerária de
transformação dos indivíduos. Impõe-se não como atividade de produção, mas
pelos efeitos que faz desencadear na mecânica humana, proporcionando a ordem
e a regularidade; o que sujeita os corpos a movimentos regulares, exclui a
agitação e a distração, impõe uma hierarquia e uma vigilância que serão
ainda mais bem aceitos, e penetrarão ainda mais profundamente no
comportamento dos condenados.

Infelizmente, em virtude da escassez de vagas, uma pequena parcela dos
condenados é albergado pela benefício/obrigação do trabalho, e na via
transversa a falta de atividade laborativa a desempenhar gera um tempo livre
enorme, que não é preenchido com nenhuma outra atividade construtiva
(recreativa, intelectual, artística, desportiva), produzindo ociosidade e
consequencias bastante negativas para sua readaptação, tais como uso de
drogas, planejamento de fugas, brigas, entre outras consequencias danosas.

3.7.3 SOCIALIZAÇÃO ATRAVÉS ESTUDO

A socialização dos presos torna-se mais eficiente quando eles têm a
possibilidade de estudar, pois a educação é imprescindível nesse processo,
nota-se que grande parte da população carcerária não teve a oportunidade
concreta de estudar na primeira infância, e por esta razão, não
submeteram-se aos influxos das praticas educativas.
Durkheim (1978, p. 41) define “educação” como uma:
[…] ação exercida, pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se
encontram ainda preparadas para a vida social: tem por objetivo suscitar e
desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e
morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto, e pelo meio
especial a que a criança, particularmente, se destine.

E segue para afirmar (1978, p. 42), que a educação consiste, pois, numa
socialização metódica das novas gerações,
[…] a sociedade se encontra, a cada nova geração, como que diante de uma
tabula rasa, sobre a qual é preciso construir quase tudo de novo. É preciso
que, pelos meios mais rápidos, ela agregue ao ser egoísta e associal, que
acaba de nascer, uma natureza capaz de vida moral e social. Eis aí a obra da
educação. Ela cria no homem um ser novo.

Como expõem Daniela Duarte e Jorge Teles (apud SARAIVA e LOPES, 2011, p.
29):
No caso de presos, a educação é decisiva na restauração da autoestima e na
sua reintegração na sociedade, por meio da potencialização da capacidade do
indivíduo em superar psicológica e socialmente as adversidades e
converter-se em sujeito de sua própria história.

Há uma consciência de que a educação é a força motriz para qualquer processo
de socialização, em especial em relação aos presos, de modo que é dever do
Estado realizar tarefas no sentido de prover o sistema prisional de meios
que possam auxiliar na reabilitação dos apenados e a educação tem papel
precípuo nesse processo. Conforme assinala, em feliz síntese, José M. R.
Delgado:
los seres humanos son educables y susceptibles de cambios personales y
sociales, existiendo hechos históricos que apoyan esta tesis: recordemos que
la esclavitud fue abolida, los sacrificios humanos han desaparecido, ya no
hay antropofagia, la mortalidad infantil ha disminuido considerablemente y
la duración de la vida se ha alargada bastante. Las ideas originadas por
seres excepcionales como Jesuscristo y Einstein han determinado cambios
decisivos en las mentes y en las conductas de los hombres. Hay que dar alta
prioridad a la investigación del espacio interior del cerebro para encontrar
las bases biológicas que permitan potenciar la felicidad personal, la
convivencia social y la cooperación internacional. Esto no es una utopía,
sino una posibilidad a nuestro alcance si así nos lo proponemos. El intento
de conseguir Paz y Bien merece ser explorado. Su éxito internacional puede
ser de incalculables y beneficiosas consecuencias. Pero incluso si el logro
internacional fuese difícil y prematuro, su implantación a nivel personal
será mucho más fácil y rápido. El éxito a nivel personal puede potenciar su
posterior utilización universal. El pensar y el actuar suponiendo que ‘yo
soy así’ y ‘siempre seré así’ y por lo tanto poco voy a cambiar’ es falso
biológicamente y peligroso para el individuo y para sus relaciones sociales.

Castrillo (1997, p.101) entusiasta da educação pontua,
No me cabe la menor duda de que la educación y la reeducación son posibles.
Sus efectos son incuestionablemente positivos, aunque no en modo alguno
automáticos ni totales, como en el fondo sucede con todo lo individual, con
todo lo específico de cada ser humano.

No caso da educação, particularmente, vai além da simples aquisição de
conhecimentos e de garantia de direitos constitucionais. É perspectiva de
mudança de vida, autoestima e outras competências e habilidades para a vida
tanto individual quanto social.

Neste particular leia-se que tanto a educação formal, como a informal são
excelentes coadjuvantes no processo de socialização, como afirma João
Vargas, (2004, p. 25),
O ensino formal e o ensino informal constituem premissas básicas de
socialização (e não de re-socialização) no cárcere, para a vida extramuros,
uma vez que gera qualificação intelectual útil, com a aquisição da
escolaridade, além dos meios profissionalizantes disponibilizados. O
cárcere, através do ensino, prepara o preso, durante o cárcere, qual um
internato educacional, para a utilização do lado de fora de seus muros, num
futuro não muito distante. A realidade atual é oposta a isso, uma vez que o
ensino não atinge a todos, nem de modo formal e nem informal. Não há
registro de presos que cursem universidades no cárcere, como ocorre em
vários países economicamente mais avançados. Este meio é fundamental para a
realização dos outros dois, como veremos a seguir.

Além de ser um direito social, a educação é um pré-requisito para usufruto
dos demais direitos civis, políticos e sociais emergindo como um componente
básico da dignidade da pessoa humana, sendo corrente as preocupações
internacionais sobre a criação de instrumentos que objetivem a proteção e a
efetividade da garantia dos direitos humanos dos presos.
Sobre isso, Gadotti (1999, p. 62) diz: “Educar é libertar […] dentro da
prisão, a palavra e o diálogo continuam sendo a principal chave. A única
força que move um preso é a liberdade; ela é a grande força de pensar”.
Pensado desta forma, o ensino deve ser um processo global, e a pessoa do
condenado deve estar no centro deste processo, despertando e estimulando sua
verdadeira vocação, sendo educado corretamente pelo mundo exterior e para o
seu retorno da vida em sociedade e neste sentido o educador tem o papel
decisivo, devendo possuir capacidade para o diálogo e respeito pelas
características individuais de cada preso.
Conforme o sociólogo Fernando Salla (1999, p. 67): “por mais que a prisão
seja incapaz de ressocializar, um grande número de detentos deixa o sistema
penitenciário e abandona a marginalidade porque teve a oportunidade de
estudar”.
Sob qualquer prisma que se pense em enfrentar o papel da educação no sistema
prisional, temos que sua função precípua é diminuir a distância do preso com
o contexto social, oportunizado uma vida após o seu retorno ao convívio na
sociedade, sendo importante coadjuvante no processo de socialização do
condenado.

3.7 CRISE NA RESSOCIALIZAÇÃO

Com estas observações vemos que a ressocialização encontra-se em flagrante
crise por inúmeros motivos, sendo o primeiro deles a falta de vontade
governamental para enfrentamento da crise do sistema prisional: a uma, por
criar um sistema que seleciona a população mais pobre da sociedade para
receber a sanção penal e lhe frustrar oportunidades de inclusão social,
sendo inegável a falta de politicas públicas que objetivem obstar o fenômeno
do crime; a duas, por não estabelecer um planejamento concreto, pensado a
prisão a longo prazo, através de políticas de aperfeiçoamento do sistema
tanto no aspecto do trabalho como na educação.
Um segundo obstáculo a ressocialização está na deficiência da formação das
pessoas imbuidas no dever de cuidar do sistema prisional, partindo da
premissa que este sistema se constrói apenas com vigilância e opressão,
quando na verdade a proposta ressocializadora deve incluir a humanização do
tratamento do preso.
Em terceiro plano, a falta de espaços físicos e sociais adequados para a
custódia dos presos, afinal os limites espaciais destinados aos
encarcerados, normalmente minúsculos, não lhes possibilitam praticamente
nenhuma movimentação e as posições em que podem ficar não são sequer
razoáveis para o bem-estar físico de um ser humano.
Silva e Bezerra (2007, p. 1) por estas razões afirmam,
A superlotação das unidades prisionais, as subumanas condições de vida dos
presos, o crescimento de organizações criminosas e da corrupção dentro das
prisões, aliado à falta de segurança, não permitem que os estabelecimentos
carcerários cumpram sua função.

O problema agrava-se pela desproporção existente entre o número de vagas nos
estabelecimentos prisionais e a grande quantidade de mandados de prisão
expedidos, o que resulta na superlotação das prisões, onde as celas
individuais abrigam muito mais condenados do que a sua capacidade permite.
Uma outra questão a gerar complexidade para a cena carcerária, consiste na
legislação penal de emergência e no excesso da utilização da prisão,
sobretudo, da prisão provisória, como instrumento de manutenção da ordem do
sistema.
Günther Jakobs( 2003, p. 55) sustenta,
Com isso, tem-se como farol legislativo, o aumento cada vez maior da
quantidade de pena em detrimento da qualidade e da finalidade da pena a ser
cumprida, o que caracteriza o viés do castigo, características de um direito
penal de oposição, onde se persegue ‘ampla progressão dos limites da
punibilidade, vale dizer, a mudança de perspectiva do ato praticado pelo ato
que se vai pratica?’), deixando de lado a premissa de que a pena deve em seu
cumprimento almejar o caráter ressocializador e preventivo que vislumbre
impedir o retorno a delinquência daquele que foi submetido ao sistema
prisional.

O Tema é bem sintetizado por Caffarena,(1997, p.63)
Las cárceles son micro sociedades que funcionan con una enorme diversidad de
problemas, en donde se confunden problemas sanitarios con problemas
educacionales, problemas de tratamiento de las personas, problemas
terapéuticos.

Parece correto concluir que a proposta atual de enfrentamento do crime, nem
de longe, consegue os seus propósitos, razão pela qual pensamos que em
alternativas ao sistema que podem ser encaminhadas através dos processos de
socialização antes expostos, seja através da família que seria chamada a
participar do processo de inclusão do preso enquanto ostente esta condição;
seja através da qualificação obtida através da instrução e educação, e
finalmente pelo trabalho que poderá decisivamente apontar novos hábitos que
facilitarão a vida do Egresso na sociedade.

AS NUDEZAS SECRETAS DE ELEONORA

AS NUDEZAS SECRETAS DE ELEONORA

Acabo de ler as ”As nudezas secretas de Eleonora”, Ed. Novo Século, do escritor Achel Tinoco, (173 páginas)  Um livro de fôlego, como bem disse o escritor Jose Louzeiro. Uma trama rápida e bem encatenada , descrevendo um triângulo amoroso entre um pintor, uma mocinha do interior (pudica e não tão séria)  e o seu noivo. Na narrativa aparecem ainda um empregador inescrupuloso e uma advogada :  falastrona, cachaceira, envolvida com o tráfico de drogas e para completar lésbica.   Já conhecia do mesmo autor: “Perdendo uma metade de mim”, com uma narrativa interessante, sendo que gostei mais deste. Creio que é uma obra que merece ser lida. Tive notícias que estará lançando uma biografia interessante dentro de pouco tempo, vamos aguardar.  Para comprar http://www.martinsfontespaulista.com.br/site/detalhes.aspx?ProdutoCodigo=283366

OS SONHOS QUE ALIMENTAM A VIDA

Estou devendo um comentário de um livro que terminei a poucos dias: “Os sonhos que alimentam a vida”, Ed. Jaboticaba,  José Gregori, (428 páginas). Uma historia rica de acontecimentos , mas que me desculpe o autor, pouco empolgantes. Talvez tenha me decepcionado,  pois esperava algo na altura do “Código da Vida”, Saulo Ramos, e os acontecimentos relatados demonstram um estilo mais recatado, de um burocrata teve uma certa militância na época da ditadura sem muita exposição. Amigo de Fernando Henrique e de Dona Ruth, procurou viver como um verdadeiro Tucano, procurando um ninho , quando encontrou  não marcou o território, não recomendaria. Demorei uns três meses para terminar, pois toda vez que avançava ficava com sono. Pode ser encontrado em http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/resenha/resenha.asp?nitem=2744093&sid=172169221132351697349346&k5=102C37A0&uid=