Arquivo da tag: PRAZO

A CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS E O EXCESSO PRAZAL: O CASO POLONÊS.

Artigo do Profº Rômulo Moreira.

A morosidade da Justiça vai custar caro para os poloneses. A Corte Europeia de Direitos Humanos fixou um prazo de dois anos para a Polônia indenizar aqueles que foram vítimas da lentidão judicial. A decisão foi tomada depois de os Juízes Europeus constatarem que já receberam cerca de 650 reclamações de pessoas que se dizem prejudicadas pelo ritmo lento da Justiça polonesa.

Porém, em vez de julgar cada uma delas, a Corte considerou ser mais razoável comunicar a medida ao Governo da Polônia e passar essa função aos Juízes poloneses. Se o prazo não for cumprido, aí sim os Juízes da Corte voltam a entrar em ação. (Fonte: Revista Consultor Jurídico, 8 de julho de 2015, 10h15, disponível em http://www.conjur.com.br/2015-jul-08/polonia-dois-anos-indenizar-vitimas-lentidao-judicial).

Pois é, agora foi a vez da Polônia.

Antes, no ano de 2012, a Itália foi condenada a indenizar um inspetor de Polícia que teve que esperar dez anos para a conclusão do processo criminal contra ele. O motivo da condenação, no entanto, não foram os dez anos, mas sim a espera de cinco anos no processo que ele moveu contra o Estado justamente pela demora judicial. A Corte Europeia de Direitos Humanos, que analisou a reclamação do inspetor, julgou que a demora acabou beneficiando o acusado. Por conta dela, crimes prescreveram e a pena imposta foi reduzida. Já a espera de quase cinco anos no pedido de indenização foi considerada inaceitável pelos juízes europeus. Eles decidiram que, via de regra, pedido de reparação pela demora judicial deve ser concluído em dois anos e meio, no máximo. Na Itália, o que garante reparação aos prejudicados pela morosidade da Justiça é a Lei 89, de março de 2001, apelidada de Lei Pinto, em referência ao redator da norma. A lei foi aprovada em resposta à exigência do Conselho da Europa, de que a demora injustificada de processos judiciais prejudica os cidadãos e estes têm direito de receber indenização do Estado.

Aliás, anteriormente, em dezembro de 2010, a Itália foi repreendida pela Corte Europeia de Direitos Humanos por causa da pouca efetividade da lei. Os juízes consideraram que a Justiça italiana estava demorando demais para julgar os pedidos de indenização das vítimas da lentidão judicial. Na ocasião, a Corte mandou o país rever a sua lei e criar um fundo para garantir indenização aos prejudicados.[1]

Agora, neste ano de 2015, mais uma vez, a lentidão na Justiça italiana continua e o país foi condenado a pagar indenização por demorar a indenizar justamente aqueles que foram prejudicados pelo ritmo judicial lento. Para tentar evitar o pagamento duplo e facilitar a vida das vítimas, o Ministério da Justiça assinou um acordo com o Banco da Itália, que vai permitir o pagamento da compensação pela demora da Justiça em até 120 dias. Funciona assim: o cidadão espera anos para seu processo — penal ou cível — ser resolvido. Uma vez solucionado, ele inicia um novo processo pedindo indenização por ter tido de aguardar tanto tempo. Concluída essa segunda ação, se for considerado que a demora judicial o prejudicou de alguma forma, aí sim entra em jogo o acordo com o Banco da Itália e, em até quatro meses, o cidadão recebe sua indenização.[2]

Em nosso Continente, o Tribunal Constitucional do Peru acaba de fixar novo lineamento jurisprudencial sobre o prazo razoável do processo como doutrina jurisprudencial vinculante para todos os Juízes e Tribunais do País, em conformidade com o art. VI do Titulo Preliminar do Código de Processo Constitucional.

A questão foi decidida no julgamento de um Habeas Corpus impetrado por Aristóteles Romana Paucar Arce contra Juízes da 3ª. Turma Penal do Tribunal Superior de Justiça da Província Callao, onde se contestou o direito a ser julgado num prazo razoável (Processo nº. 0295-2012 na PHC/TC).

Consta da decisão:

Como se sabe, a través de diferentes pronunciamientos (Cfr. STC N.ºs 5350-2009-PHC, 2700-2012-PHC, 0350-2013-PHC, entre otras), el TC había señalado que en el ámbito del proceso penal el cómputo del plazo razonable comenzaba a correr desde el primer acto del proceso dirigido contra la persona como presunto responsable de un delito, el que a su vez podía estar representado por: i) la fecha de aprehensión o detención judicial preventiva del imputado, o ii) la fecha en que la autoridad judicial toma conocimiento del caso; entendiéndose en términos generales que dicho acto lo constituía el auto de apertura de instrucción. Con la expedición de la STC N.º 0295-2012-PHC, el TC ha precisado que el cómputo del plazo razonable del proceso penal comienza a correr desde la apertura de la investigación preliminar del delito, el cual comprende la investigación policial o la investigación fiscal; o desde el inicio del proceso judicial en los casos de delitos de acción privada, por constituir el primer acto oficial a través del cual la persona toma conocimiento de que el Estado ha iniciado una persecución penal en su contra. Sobre las consecuencias jurídicas derivadas de la afectación al derecho al plazo razonable del proceso o a ser juzgado dentro de un plazo razonable. En relación a las consecuencias jurídicas que se generan cuando se constata la violación del derecho a ser juzgado dentro de un plazo razonable, en la sentencia recaída en el Expediente N.º 3509-2009-PHC, el TC señaló que ello conllevaba a la exclusión del imputado del proceso penal. Posteriormente, en el Expediente N.º 5350-2009-PHC, advirtió que el órgano jurisdiccional debía emitir y notificar, en el plazo máximo de sesenta días naturales, la sentencia que defina la situación jurídica del procesado, bajo apercibimiento de darse por sobreseído el proceso penal, no pudiendo ser nuevamente investigado ni procesado por los mismos hechos, por cuanto ello conllevaría la vulneración del principio ne bis in ídem . Al respecto, el TC ha considerado pertinente definir la línea jurisprudencial fijada, y, por tanto, precisar que la eventual constatación por parte de la judicatura constitucional de la violación del derecho a ser juzgado dentro de un plazo razonable no puede ni debe significar el archivo definitivo o la conclusión del proceso judicial de que se trate (civil, penal, laboral, etc.). Lo que corresponde es que, bien entendidas las cosas, se proceda a la reparación in natura por parte de los órganos jurisdiccionales, la misma que consiste en emitir el pronunciamiento definitivo sobre el fondo del asunto en el plazo más breve posible, a fin de resolver de manera definitiva la situación jurídica del procesado. En tanto que, en cuanto al plazo, éste deberá establecerse según las circunstancias concretas de cada caso. Lo expuesto no exime de las responsabilidades a que hubiere lugar para quienes incurrieron en la afectación el derecho al plazo razonable del proceso. Lima, 5 de junio de 2015.” (Disponível em http://www.tc.gob.pe/notas_prensa//notas/2015/nota_2015_026.html).

Pois bem.

Esta questão relativa à mora processual, especialmente em ações penais públicas condenatórias, é extremamente preocupante em nosso País, particularmente porque aqui se banalizou a prisão provisória e, portanto, mantém-se com bastante frequência preso o réu, quando ainda não definitivamente julgado e condenado. O que deveria ser uma excepcionalidade, passou a ser uma banalidade. Desgraçadamente!

Ary Franco já pontificava há tempos que “a questão relativa ao prazo de encerramento da instrução criminal sempre foi preocupação máxima dos poderes públicos, por isso mesmo que é mister acautelar os interesses do réu, que não pode nem deve, como elemento da sociedade, ficar indefinidamente à espera de que os órgãos da sociedade que integram o Poder Judiciário ultimem a sua situação de acusado, para declará-lo inocente, ou não.[3]

Outro antigo processualista, Câmara Leal, já indicava como causa justificadora para a concessão de habeas corpus quando, estando o réu preso em flagrante ou preventivamente, não é o processo julgado dentro do prazo legal, exceto se ocorrer legítimo impedimento.[4]

Vicente de Azevedo, outro saudoso jurista, enfrentando esta mesma questão, alertava que acaso não concedido, em tais hipóteses, o habeas corpus acabaria “o réu cumprindo a pena cominada em abstrato na lei penal antes de julgado[5]

Aliás, conta-se que Carl Friedrich Gustav Seidler, um viajante suiçoalemão que esteve no Brasil entre 1825 e 1826, escreveu em 1837 o seguinte: “Mete-se num buraco de cachorro um cidadão sob a suspeita de haver praticado um crime, e só muito mais tarde se verifica sua culpa”. Depois, afirmava que “entre nós (brasileiros) não se tem amor à justiça.”[6]

A doutrina mais recente, por sua vez, é uníssona, bastando ser citados, por todos, Frederico Marques e Tourinho Filho, respectivamente:

A manutenção do réu sob carcer ad custodiam não pode, em regra, exceder o prazo legal. (…) No Direito inglês é observado, com sumo rigor, o preceito que veda manter-se preso o réu, demoradamente, sem julgamento definitivo. Entre nós, isso nem sempre acontece, o que é injusto e iníquo.”[7] É o que vimos neste processo.

Se o réu não pode ser culpado pela inobservância do prazo, é o habeas corpus o meio idôneo para pôr cobro à coação cautelar, por não se conter esta nos limites temporais em que a lei permite a vulneração da incoercibilidade no âmbito da liberdade de ir e vir.”[8]

Observamos que a Emenda Constitucional nº. 45/04 acrescentou mais um inciso ao art. 5º. da Constituição Federal, estabelecendo expressamente que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” (LXXVIII).

A injustificada demora processual acarreta constrangimento ilegal a ser remediado via habeas corpus, salvo se o atraso foi causado exclusivamente pela defesa.

Aliás, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos concebeu a chamada Teoria dos Sete Critérios que podem autorizar, excepcionalmente, a dilação processual; segundo esta teoria, sete situações devem ser observadas para se aferir o excesso prazal, dentre as quais, a complexidade do caso, a conduta processual do acusado e a conduta das autoridades judiciárias.[9]

Esta questão da demora no julgamento de um processo criminal, mormente quando se trata de réu preso, é causa de preocupações inclusive na doutrina alienígena, a ponto de estar expressamente consignado no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos firmado em Nova York, em 19 de dezembro de 1966 e promulgado pelo Governo brasileiro através do Decreto nº. 592/92, a seguinte cláusula:

3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, a, pelo menos, as seguintes garantias:

(…) “c) De ser julgado sem dilações indevidas” (art. 14, 3, c).

Igualmente lê-se no Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, promulgado entre nós pelo Decreto nº. 678/92:

Art. 8º. – Garantias Judiciais

1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente…” (grifo nosso).

Tais normas já se incorporaram ao nosso Direito Positivo, devendo ser obrigatoriamente observadas pelos nossos juízes e Tribunais, por força do disposto no art. 5º., § 2º., da Constituição Federal:

“A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, adotada no Brasil através do Dec. 678/92, consigna a ideia de que toda pessoa detida ou retida tem o direito de ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo.” (Superior Tribunal de Justiça – 5ª. Turma – Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº. 5239 – Relator Ministro Edson Vidigal – j. 7.5.96 – DJU 29.9.97, p. 48.228).

No mesmo sentido, confira-se a Convenção Europeia para salvaguarda dos direitos do homem e das liberdades fundamentais, art. 6º., 1. Na atual Carta Magna espanhola, art. 24, 2, temos: “Asimismo, todos tienen derecho (…) a un proceso público sin dilaciones indebidas y con todas las garantías…” (grifo nosso). Do mesmo modo a VI Emenda à Constituição americana: “Em todas as causas criminais, o acusado gozará do direito a um juízo rápido e público…” É o direito ao speedy trial.

Finalizamos com a lição de Aury Lopes Jr.:

Deve haver um marco normativo interno de duração máxima do processo e da prisão cautelar, construído a partir das especificidades do sistema processual de cada país, mas tendo como norte um prazo fixado pela Corte Americana de Direitos Humanos. Com isso, os tribunais internacionais deveriam abandonar a doutrina do não-prazo, deixando de lado os axiomas abertos, para buscar uma clara definição de “prazo razoável”, ainda que admitisse certo grau de flexibilidade atendendo as peculiaridades do caso. Inadmissível é a total abertura conceitual, que permite ampla manipulação dos critérios. São insuficientes as soluções compensatórias (reparação dos danos) e atenuação da pena (sequer aplicada pela imensa maioria de juízes e tribunais brasileiros), pois produz pouco ou nenhum efeito inibitório da arbitrariedade estatal. É necessário que o reconhecimento da dilação indevida também produza a extinção do feito, enquanto inafastável conseqüência processual. O poder estatal de perseguir e punir deve ser estritamente limitado pela Legalidade, e isso também inclui o respeito a certas condições temporais máximas. Entre as regras do jogo, também se inclui a limitação temporal para exercício legítimo do poder de perseguir e punir. Tão ilegítima como é a admissão de uma prova ilícita, para fundamentar uma sentença condenatória, é reconhecer que um processo viola o direito de ser julgado num prazo razoável e, ainda assim, permitir que ele prossiga e produza efeitos. É como querer extrair efeitos legítimos de um instrumento ilegítimo, voltando a (absurda) máxima de que os fins justificam os meios. O processo penal deve ser agilizado. Insistimos na necessidade de acelerar o tempo do processo, mas desde a perspectiva de quem o sofre, enquanto forma de abreviar o tempo de duração da pena-processo. Não se trata da aceleração utilitarista como tem sido feito, através da mera supressão de atos e atropelo de garantias processuais, ou mesmo a completa supressão de uma jurisdição de qualidade, como ocorre na justiça negociada, senão de acelerar através da diminuição da demora judicial com caráter punitivo. É diminuição de tempo burocrático, através da inserção de tecnologia e otimização de atos cartorários e mesmo judiciais. Uma reordenação racional do sistema recursal, dos diversos procedimentos que o CPP e leis esparsas absurdamente contemplam e ainda, na esfera material, um (re)pensar os limites e os fins do próprio direito penal, absurdamente maximizado e inchado. Trata-se de reler a aceleração não mais pela perspectiva utilitarista, mas sim pelo viés garantista, o que não constitui nenhum paradoxo. (…) Em suma, um capítulo a ser escrito no processo penal brasileiro é o direito de ser julgado num prazo razoável, num processo sem dilações indevidas, mas também sem atropelos. Não estamos aqui buscando soluções, ou definições cartesianas em torno de tão complexa temática, senão dando um primeiro e importante passo em direção a solução de um grave problema, e isso passa pelo necessário reconhecimento desse “jovem direito fundamental.”[10]

[1] Fonte: Revista Consultor Jurídico, 8 de março de 2012, 13h11 (http://www.conjur.com.br/2012-mar-08/corte-europeia-demora-cinco-anos-condenar-italia-lentidao-judicial, acessado dia 03 de junho de 2015).

[2] Fonte: Fonte: Revista Consultor Jurídico, 2 de junho de 2015, 11h35 (http://www.conjur.com.br/2015-jun-02/italia-acordo-banco-indenizar-vitimas-lentidao-judicial, acessado dia 03 de junho de 2015).

[3] Código de Processo Penal, Vol. II, Rio de Janeiro: Forense, 7ª. ed., 1960, p. 157.

[4] Comentários ao Código de Processo Penal Brasileiro, Vol. IV, 1943, p. 178.

[5] Curso de Direito Judiciário Penal, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1958, p. 377.

[6] Apud Abelardo Romero, “A Origem da Imoralidade no Brasil”, Rio de Janeiro: Conquista, 1967. Nesta obra, este grande jornalista e escritor sergipano informava que já no século XIX “quase todos se queixavam da morosidade da justiça, uma das causas e o principal efeito de seu aviltamento.” (p. 221).

[7] Elementos de Direito Processual Penal, Vol. IV, Campinas: Bookseller, 1ª. ed., 1998, págs. 370/371.

[8] Código de Processo Penal Comentado, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 6ª. ed., 2001, p. 460.

[9] Sobre o assunto, conferir “El plazo razonable en el proceso del estado de derecho”, de Daniel Pastor, Buenos Aires: Ad-Hoc, 2002, pp. 111 e seguintes.

[10] http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458, acessado em 03 de junho de 2015.

FINALMENTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL VAI DECIDIR A RESPEITO DA CONTAGEM DO PRAZO PARA A PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA.

Artigo do Profº Rômulo Moreira.

O Recurso Extraordinário com Agravo nº. 848107, a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal discutirá se a contagem do prazo para a prescrição da pretensão executória deve começar a correr a partir do trânsito em julgado para a acusação ou para todas as partes.

O tema está em debate no, que teve repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual da Corte. O processo foi ajuizado na Corte pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios para questionar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que reconheceu como marco inicial da contagem do prazo o trânsito em julgado para a acusação, com base no que prevê o artigo 112, I do Código Penal.

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios entende que, com base na presunção da inocência, é impossível a execução da sentença penal condenatória antes do seu definitivo trânsito em julgado, por respeito aos principios constitucionais previstos no artigo 5º., II e LVII da Constituição Federal.

Em seu voto pelo reconhecimento da repercussão geral na matéria, o relator do caso, Ministro Dias Toffolli, revelou que o tema não está pacificado, uma vez que existem precedentes em ambos os sentidos: em alguns casos se reconheceu que o prazo leva em conta o trânsito em julgado para a acusação, e em outros se considerou como marco inicial do trânsito em julgado definitivo – para todas as partes: “A meu ver, o tema apresenta densidade constitucional elevada e extrapola o interesse subjetivo das partes, dada a sua relevância, não se podendo olvidar também a inegável oportunidade e conveniência para se consolidar a orientação desta Suprema Corte a esse respeito”, frisou o relator.

A decisão do Plenário Virtual que reconheceu a existência de repercussão geral do tema foi unânime.

Aliás, neste sentido, a 5ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o prazo de prescrição da execução da pena começa a contar quando a sentença transita em julgado tanto para a defesa quanto para a acusação. Apesar de a lei ser expressa, ao prever que o início da contagem do prazo é a partir do trânsito em julgado para a acusação, a decisão do Superior Tribunal de Justiça  define que só quando a defesa também perde a possibilidade de recorrer é que a pena aplicada pode ser executada.

Na Corte Superior, a nova forma de interpretar o art. 112 do Código Penal começou a ser aplicada no julgamento do Habeas Corpus nº. 137.924, contra denúncia por porte ilegal de arma de fogo: “Esta Corte de Justiça, em julgado que tratou da prescrição na fase de execução da pena restritiva de direitos, consolidou o entendimento de que o simples comparecimento do penado em cartório para retirada de ofício e cadastramento não configura o início do cumprimento da condenação”, escreveu o Ministro Jorge Mussi em seu voto. Segundo o Ministro, a Justiça entende como início do cumprimento da pena a presença física do réu no local combinado.

Anteriormente, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidira remeter ao Plenário da Corte recurso (agravo regimental) apresentado no Agravo de Instrumento nº. 794971, interposto pelo Ministério Público do Rio de Janeiro contra decisão do então relator do caso, Ministro Joaquim Barbosa: “Como esse julgado do Plenário impacta o alcance e o sentido desse dispositivo do Código Penal, tem havido uma oscilação jurisprudencial nas duas Turmas”, explicou o relator. Por essa razão, ele propôs que a discussão fosse encaminhada para análise do Plenário “a fim de que se firme um ponto de vista que possa valer para todos os casos em ambas as Turmas”.

Também um pedido de vista do Ministro Luiz Fux interrompeu o julgamento do Agravo de Instrumentonº. 705009, em que a Primeira Turma analisava o momento do trânsito em julgado, tendo por base a interposição de Recurso Extraordinário, para determinar o marco prescricional da pretensão punitiva do Estado. A Ministra Rosa Weber (relatora) votou pela conversão dos embargos de declaração em agravo regimental e o desproveu, mas concedeu habeas corpus de ofício. A ministra considerou presente a extinção da punibilidade em virtude da consumação da prescrição.

A questão voltou a ser analisada pela Turma com a apresentação do voto-vista do Ministro Dias Toffoli.  Segundo ele, em relação ao mérito, não houve consumação da prescrição punitiva. “Comungo do voto da ministra Rosa Weber no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 682013 segundo o qual, vedada a execução provisória da pena, não é suficiente para o início do prazo da pretensão executória o trânsito em julgado para a acusação”, ressaltou.

Também acrescentou a necessidade de superar o art. 112, do Código Penal que diz que se inicia, para o Estado, a execução da pena com o trânsito em julgado, exclusivamente, para o Ministério Público. De acordo com ele, a Ministra Rosa Weber dizia [naquele julgado] que, não admitida a execução provisória da pena, o trânsito em julgado do título condenatório para execução torna-se inexequível se a defesa recorrer. “Vê-se que a prescrição da pretensão executória pressupõe inércia do Estado em executar a sanção. Ora, se título – sentença penal condenatória – não pode ser executado, não existe inércia”, concluiu o Ministro Toffoli, que votou pelo desprovimento do recurso e não implemento da ordem de ofício. No mesmo sentido votou o ministro Luís Roberto Barroso. Em seguida, o Ministro Luix Fux pediu vista dos autos. A relatora ponderou que “para a segurança jurídica, o trânsito em julgado tem que ser um momento tranquilo e objetivo.”

Esta não é a primeira vez que a questão da prescrição penal chega aos nossos tribunais.

Como se sabe. o Enunciado nº. 438 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça estabelece “ser inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”. Esta questão nunca foi pacífica na doutrina e na jurisprudência pátrias.

Discordamos deste entendimento, pois “não tem sentido processar alguém (ou continuar processando, acrescentamos) quando tudo indica que ele, mesmo sendo condenado, terá declarada extinta a pretensão punitiva”, como afirmava Antônio Scarance Fernandes.[1]

Parece-nos inconcebível que, à vista da prescrição iminente (art. 110, § 1º., do Código Penal) e em nome da indisponibilidade da ação penal (art. 42, do Código de Processo Penal), o Estado-Juiz admita a continuidade de um processo penal, sabendo-se de antemão tratar-se de atividade absolutamente inócua, contrariando a própria razão de ser da jurisdição, deslembrando-se, ademais, da grande quantidade de processos criminais referentes a fatos delituosos efetivamente graves.

Ademais, não esqueçamos do princípio da intervenção mínima do Direito Penal, “que debe regir la política criminal de un Estado Social y Democrático de Derecho” e, segundo o qual “la intervención del Derecho Penal en la vida social debe reducirse a lo mínimo posible”, sendo forçoso concluir “que el recurso al Derecho Penal deviene en ilegítimo desde el mismo momento en que se demuestre que es inútil o innecesario en orden a alcanzar el fin que se le asigna”, como ensina José Miguel Zugaldía Espinar.[2] (grifo nosso).

A presteza jurisdicional (observando-se, evidentemente, o devido processo legal) é corolário do moderno Direito Processual Penal; a sentença final deve guardar com o fato delituoso certa e tolerável proximidade, sob pena de se tornarem ineficazes as providências jurídicas advindas da condenação, em flagrante prejuízo para a credibilidade da Justiça Criminal.

Por outro lado, cumpre-nos preservar a dignidade do indivíduo, evitando-se a perniciosa continuidade da sujeição a um processo penal inútil e, ao mesmo tempo, acumulando-se força e energia para casos criminais de efetivo relevo, dando-se, quanto a estes, a esperada resposta à sociedade e à vítima.

Destarte, entendemos que, se no decorrer de um procedimento criminal, já for o caso de reconhecimento da prescrição antecipada (considerando-se o disposto nos arts. 59, 68, 109 e 110, todos do Código Penal), deve ser “trancada” a ação penal com fulcro no art. 648, I do Código de Processo Penal. Note-se que aqui a expressão “justa causa” não tem o sentido mais restrito daquele empregado no art. 395, III do Código de Processo Penal (indícios suficientes da autoria e prova da existência do crime). No entanto, para a utilização do habeas corpus com fundamento no dispositivo acima referido, a expressão encontra um sentido mais amplo, como ensina Maria Theresa Rocha de Assis Moura:

O conceito processual amplo de justa causa como a causa conforme a ordenação jurídica, ou a causa secundum ius, é abrangente de todas as situações que tornam lícita a coerção. E sua falta autoriza a impetração de habeas corpus, para sanar o constrangimento ilegal, nos termos do disposto no art. 648, I, do CPP.”[3]

A propósito (mutatis mutandis):

Trata-se de Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Ministério Público, contra sentença que, ao examinar a imputação da prática dos crimes de furto qualificado e corrupção de menores e as condições pessoais do recorrido entendeu pela extinção da punibilidade. Fundamentou o magistrado o reconhecimento da extinção da punibilidade na constatação do desaparecimento superveniente do interesse de agir. Sentença que em sua fundamentação revela-se acertada, pois que a ação penal visivelmente está fadada ao fracasso e o processo não constitui instrumento hábil à obtenção do resultado prático pretendido pela acusação. (…) Assim, em hipótese de perda superveniente do interesse processual, ante a impossibilidade de futura aplicação da pena, em razão do reconhecimento da prescrição em perspectiva, deve o processo ser extinto sem resolução do mérito (sic).” (TJRJ – Recurso em Sentido Estrito nº. 200705100593 DES. GERALDO PRADO – Julgamento: 13/12/2007).

Se após exame minucioso dos autos, o julgador, ao verificar a suposta pena a ser aplicada, mesmo considerando todas circunstâncias judiciais desfavoráveis, perceber que eventual juízo condenatório restaria fulminado pela prescrição, não há justificativa para proceder-se a um complexo exame da ocorrência, ou não, da conduta criminosa, em nítida afronta às finalidades do processo e em prejuízo do próprio Poder Judiciário, devendo ser reconhecida, nessa hipótese, a ausência de justa causa para a ação.” (TRF 4ª REGIÃO – RECURSO CRIMINAL EM SENTIDO ESTRITO Nº 2003.70.02.003195-9/PR – DJU 22.12.2004, SEÇÃO 2, P. 177, J. 01.12.2004 – RELATOR: DES. FEDERAL LUIZ FERNANDO WOWK). Grifo nosso.

A doutrina e a jurisprudência divergem, predominando, no entanto, a orientação que não aceita a prescrição antecipada. É chegada a hora, todavia, do novo triunfar. A prescrição antecipada evita um processo inútil, um trabalho para nada, chegar-se a um provimento jurisdicional de que nada vale, que de nada servirá. (…) Desse modo, não há falta de amparo legal para aplicação da prescrição antecipada. A doutrina da plenitude lógica do direito não pode subsistir em face da velocidade com que a ciência do direito de movimenta, de sua força criadora, acompanhando o progresso e as mudanças das relações sociais. Seguir a Lei ´à risca, quando destoantes das regras contidas nas próprias relações sociais, seria mutilar a realidade e ofender a dignidade mesma do espírito humano, porfiosamente empenhado nas penetrações sutis e nos arrojos de adaptação consciente` (Pontes de Miranda).” (TRF 1ª Região – RCCR 199735000000600/GO. 3ª Turma. Rel. Des. Fed. Tourinho Neto).

É cabível o reconhecimento da prescrição em perspectiva, em casos excepcionais, quando evidente que o prosseguimento da ação penal redundará em nada. Tanto a persecução penal, como a prestação jurisdicional, espécies do gênero das ações estatais, pautam-se pela observância ao princípio constitucional da eficiência (artigos 5º, LXXVIII e 37, caput, da Constituição Federal)” (TRF 4ª R. – 4ª S. – EINRSE 2007.72.04.001453-9 – Rel. Paulo Afonso Brum Vaz – j. 19.06.2008 – DJU 04.07.2008). Grifo nosso.

Veja-se a lição de Fábio Ataíde:

Milhares dos processos criminais que demandados no Judiciário até 2005 já estão fadados à prescrição retroativa, a tomar como referência a possível pena a ser aplicada no caso concreto. Por isso, muitos magistrados reconhecem antecipadamente a prescrição retroativa. (…) Neste particular, ao contrário da tendência do processo penal moderno, tanto o STF (cf. HC 94.757-3/08), como também o STJ (cf. HC 111.330, DJe 09.02.09), parecem seguir em um campo meramente burocrático, sem identificar as razões práticas que levam os juízes a encontrar na prescrição antecipada uma saída para a retomada da efetividade do sistema punitivo. (…) Dessa forma, muitos processos continuam tramitando sem que seja possível tirar deles qualquer efeito na proteção de bens jurídicos. São ações que, quando resultam em condenação, acabam atingidas pela prescrição retroativa, perdendo o Estado o poder de aplicar qualquer sanção. Reforça o aspecto alegórico da lei penal a crença num Judiciário preso à lei e incapaz de inovar, principalmente no campo penal. A derrocada do Direito Penal começa com seu simbolismo. Pode parecer contraditório, mas a lei penal encontra adversários também dentre seus árduos defensores, que acreditam poder defendê-la por inteiro, sem ter de extirpar uma parte para salvar o todo. O simbolismo penal vincula-se, primitivamente, à ideia de criminalização como fator de dissipação do medo social. Hobbes confirma assim o temor como alicerce do Estado Absoluto, de modo que o medo coletivo aparece como estopim de uma legislação penal simbólica e dissipadora do terror. (…) Não é necessário abrir aspas para dizer que a rejeição da prescrição antecipada somente vem a reforçar o fenômeno da lei penal simbólica, assegurando uma pseudoproteção aos bens jurídico-penais. Como se já não bastasse as cifras negras, temos, dentre os casos que finalmente chegam à Justiça, uma quantidade significativa de processos que continuam a ocupar a atenção da Justiça sem que sejam capazes de produzir efeito prático. Juízes criminais não precisam conti­nuar fazendo de conta que estão julgando. A forma como vem sendo tratado esse tema nos tribunais revela a elevada importância que se dá às normas simbólicas, inapta às finalidades para as quais são concebidas. O simbolismo penal acontece de maneira generalizada no sistema punitivo, desde institutos como a fiança até o momento da ressocialização do sentenciado. Fazendo uma análise do instituto em estudo à luz do princípio da proibição da proteção deficiente, cabe esclarecer que a questão da prescrição antecipada não é meramente formal, mas abrange aspectos para a real proteção dos direitos fundamentais. Não é tempo de repreender juízes que reconhecem a prescrição antecipadamente; essa técnica trata-se de um meio capaz de justificar os fins aos quais prestam o Direito Penal protetor de bens jurídicos em última instância. À vista disso, não será difícil inferir que a proteção da liberdade poderia muito bem fundar a opção de deixar para um plano secundário as ações penais incapazes de proteger ditos bens. Para que assim fosse, no exame do caso concreto, o valor dos processos velhos precisa ser ponderado com o dos novos, provavelmente mais sujeitos a produzir resultados práticos efetivos na proteção de direitos fundamentais. Se queremos estabelecer novos parâmetros para uma justiça do futuro, é chegado o momento de sacrificar o sangue de velhas ideias. Em tempo de crise social e econômica, ainda não encontramos meios de racionalizar o sistema penal para poupá-lo de gastos desnecessários. Como se não bastasse a precipitação da impunidade, inclusive nas instâncias superiores, resta entender que diversas outras crises estão bombardeando o Direito Penal, cuja resistência depende de meios que deem maior eficácia estratégica às escolhas punitivas, o que passa pela aceitação da prescrição antecipada. A prescrição pode ser até virtual, mas os ganhos com a sua decretação são reais. Não há dúvida de que a tramitação de processo fadado à prescrição apenas consome o tempo jurisdicional que estaria disponível para outras hipóteses cuja proteção de bens jurídicos poderia ser mais eficaz. A experiência jurisdicional do caso concreto mostra ser relativamente fácil aos operadores antever a pena aplicável ao acusado. (…) Contudo, muitos tribunais ainda não perceberam os efeitos colaterais que o processamento de ações penais sem nenhuma utilidade causa sobre outros processos que poderiam dar algum resultado. Ocupar um juiz com o trâmite de um caso sem utilidade, muitas vezes amparando a busca de testemunhas que nem ao menos lembram dos fatos, é o mesmo que impedi-lo de dar andamento aos outros casos com real consequência para a proteção de bens jurídicos fundamentais.”[4] (Grifo nosso).

Observa-se, entretanto, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de questão de ordem na AP 379, de relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, fez uma distinção da hipótese em que a prescrição em perspectiva decorre da consideração da pena máxima abstratamente aplicada ao delito. Neste sentido, a Suprema Corte reconheceu a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva de um denunciado pela Procuradoria-Geral da República pela suposta prática do crime de apropriação indébita das contribuições previdenciárias descontadas dos salários dos empregados. A decisão ocorreu no julgamento de novos embargos de declaração no Inquérito (INQ 2584), no qual a defesa pediu que fosse declarada a extinção de sua punibilidade, tendo em vista que ele completou 70 anos em setembro de 2009, razão pela qual passou a ter direito ao benefício legal de redução do prazo prescricional à metade (artigo 115 do Código Penal). De acordo com o relator do Inquérito, Ministro Ayres Britto, mesmo que seja aplicada a pena máxima para o crime continuado de apropriação indébita previdenciária (que é de reclusão de cinco anos), a sentença não teria efeito, já que a prescrição do crime – 12 anos – cai para seis anos, em se tratando de cidadãos com mais de 70 anos (maioridade senil). “Na concreta situação deste processo, nem mesmo a imposição de uma pena concreta no máximo permitido pelo tipo penal – cinco anos – manteria a integridade da pretensão estatal punitiva. Explico: tendo em vista que o acusado tem direito à redução do prazo prescricional pela metade, a prescrição de 12 anos – caso aplicada a pena máxima de cinco anos – cai pela metade”, afirmou o relator.  “Pelo que, entre o termo inicial da contagem do lapso prescricional e a data do recebimento da denúncia, ocorreu a chamada prescrição retroativa, na antiga redação que lhe dava o parágrafo 2º do artigo 110 do Código Penal”, assinalou. Ele lembrou que a jurisprudência do STF rejeita a possibilidade de reconhecimento de prescrição retroativa antecipada, que também é chamada de “prescrição em perspectiva”. Ao acompanhar o relator, assim como fizeram todos os ministros presentes, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, assinalou a importância do precedente julgado na sessão de hoje para efeito de orientação para outros tribunais.

Finalmente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal manteve a validade da Lei nº. 12.234/2010, que alterou o Código Penal estabelecendo como início para a contagem de uma eventual prescrição da pretensão punitiva a data do recebimento da denúncia e não mais a data do cometimento do crime. Na decisão, que ocorreu por maioria dos votos, os Ministros consideraram que a norma é compatível com a Constituição Federal de 1988. A Corte negou pedido formulado pela Defensoria Pública da União no Habeas Corpus nº. 122694, impetrado em favor de B.L.P. O relator do processo, Ministro Dias Toffoli, votou pelo indeferimento e afastou a tese da impetração, entendendo que está no âmbito da ponderação do legislador a possibilidade de estabelecer os marcos para a prescrição da pretensão punitiva, tendo em vista a pena em concreto antes de se iniciar a execução.“Essa lei está dento da proporcionalidade, dentro da competência da discricionariedade compatível com a Carta por parte da decisão emanada do Congresso Nacional”, salientou o relator. Para ele, o legislador tem “legitimidade democrática para escolher os meios que reputar adequados para a consecução de determinados objetivos, desde que não lhe seja vedado pela Constituição e nem viole a proporcionalidade”.O Ministro Dias Toffoli também lembrou que o Supremo consolidou o entendimento de que, por força da alteração realizada pela Lei 6.416/1977, a prescrição contemplada nos parágrafos 1º e 2º do artigo 110 do Código Penal é somente da pretensão executória da pena principal. “De modo que a prescrição retroativa, da qual diz respeito a Súmula 146/STF, não alcançava o período compreendido entre a data do fato e o recebimento da denúncia”, ressaltou. Dessa forma, ele votou pela manutenção da norma ao entender que a alteração legislativa em questão é constitucional, justa e eficaz, “razão porque deve ser prestigiada”. “A lei, a meu ver, veio a se adequar a essa realidade material do Estado na dificuldade de investigar e apresentar uma denúncia a tempo”, salientou o Ministro. A maioria seguiu o voto do relator, vencido o Ministro Marco Aurélio, que considerou que o Estado deve oferecer infraestrutura à policia judiciária, ao Ministério Público e ao Judiciário, de forma a viabilizar a eficácia do direito que o cidadão tem de ver o término do processo em um prazo razoável. Segundo ele, “tudo recomenda que cometido um crime, atue o Estado”, o qual deve estar equipado para atender aos anseios sociais quanto à paz e à segurança e ser eficiente sob o ângulo da polícia e da persecução criminal.

[1] Apud Wellington César Lima e Silva, “Mitigação do Princípio da Obrigatoriedade na Sistemática Processual Penal Brasileira”, Revista do Ministério Público do Estado da Bahia, Vol. 2, p. 78.

[2] Fundamentos de Derecho Penal – Parte General – Las Teorías de la Pena y de la Ley Penal, Universidad de Granada, 1991, pp. 163, 164 e 166.

[3] Justa Causa para a Ação Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 176.

[4] A prescrição antecipada entre o julgar e o fazer de conta. Boletim IBCCRIM: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 14-15, set. 2009.

Lei sobre prazo para registro de armas é inaplicável a fatos fora de sua vigência

“Lei excepcional temporária não tem retroatividade. Tem ultra-atividade em face da regra do artigo 3º do Código Penal”. Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) assentou, nesta quinta-feira (19), jurisprudência da Suprema Corte e restabeleceu decisão do juízo da Comarca de Corumbá de Goiás que condenou um lavrador pela posse ilegal de seis armas de fogo e munição como incurso no artigo 12 da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).

A decisão foi tomada julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 768494 – ao qual foi dado provimento – relatado pelo ministro Luiz Fux. Em maio deste ano, o Plenário Virtual do STF reconheceu a repercussão geral da questão constitucional suscitada, que trata da possibilidade, ou não, da extinção da punibilidade do delito de posse irregular de arma de fogo de uso permitido, pela aplicabilidade retroativa de lei que concedeu novo prazo para registro de armas ainda não registradas. O recurso julgado hoje substituiu o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 674610 como paradigma da repercussão geral.

No RE, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) questionava decisão do Tribunal de Justiça daquele estado (TJ-GO) que, ao julgar recurso de apelação contra a condenação do réu em primeira instância, extinguiu a punibilidade ante o entendimento de que a conduta estaria abrangida pelas Leis 11.706/2008 e 11.922/2009, que abriram novos prazos para registro de armas ainda não regularizadas. Apoiou-se, em sua decisão, no artigo 5º, inciso XL, da CF, que dispõe que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

Alegações

O MP-GO alegou, entretanto, que o lavrador foi flagrado no cometimento do crime em 27 de dezembro de 2007, fora do prazo de vigência de qualquer das leis que abriram período para registro de armas de uso permitido. Lembrou que as duas leis mencionadas abriram prazo para registro, respectivamente, desde a data de sua edição, até 31 de dezembro de cada um desses anos. Assim, haveria tipicidade da conduta, porquanto as leis temporárias somente se aplicam ao período de sua vigência e não retroagem. E esse entendimento foi ratificado pelo Plenário da Suprema Corte, que acompanhou, por unanimidade, o voto do ministro Luiz Fux nesse sentido.

O relator lembrou que o Estatuto do Desarmamento fixou prazo de 180 dias para que os possuidores de armas não registradas solicitassem o registro no órgão competente, desde que apresentassem nota fiscal ou comprovassem a origem lícita da posse, ou ainda, para que as entregassem à Polícia Federal, mediante indenização. Esse prazo foi sucessivamente dilatado pelas Leis 10.884/2004, 11.118/2005 e 11.191/2005, até 23 de outubro de 2005.

Posteriormente, a Medida Provisória 417, de 31 de janeiro de 2008, convertida na Lei 11.706, estendeu o prazo até 31 de dezembro e a lei 11.922/2009, por seu turno, o dilatou té 31 de dezembro daquele ano. Foram, segundo ele, leis excepcionais, que não retroagem no tempo, uma vez que só têm vigência no período por elas pré-estabelecido. Por isso, observou, foi errônea a interpretação do artigo 5º, inciso XL, da CF pelo TJ goiano quanto à retroatividade dessas leis.

FK/AD

 

Projeto altera prazo para embargos de declaração em processo penal

Hugo Leal

Para Hugo Leal, proposta ajuda a ampla defesa em processos penais.

Tramita na Câmara o Projeto de Lei 331/11, do deputado Hugo Leal (PSC-RJ), que altera de dois para cinco dias o prazo para a interposição, no processo penal, dos embargos de declaração (recurso utilizado quando se quer esclarecer omissão ou ambiguidade de acórdãos dos tribunais de apelação, câmaras ou turmas). A proposta modifica o Código de Processo Penal (Decreto-Lei 3.689/41).

O autor argumenta que, com a publicação eletrônica, o prazo atual de dois dias é muito pequeno para a apresentação de eventual recurso. Além disso, o prazo de cinco dias já é utilizado nos processos civis.

O parlamentar disse que a alteração não trará prejuízo ao andamento do processo. “Este pequeno aumento do prazo trará maior oportunidade para apresentação de recursos, com qualidade, e afirmará os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa.”

Tramitação
A proposta será analisada em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

A proposta será analisada em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Fonte: Agência Câmara de Notícias

OAB-BA DIVULGA PRAZO PARA IMPUGNAçãO CONTRA CANDIDATOS à VAGA DO TRT5 PELO QUINTO

A OAB-BA divulgou nesta segunda-feira, 17, edital com o prazo para
apresentação de impugnação contra os advogados inscritos ao
processo seletivo destinado à formação de lista sêxtupla para
preenchimento da vaga de Desembargador Federal, destinada a advocacia,
no Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Os interessados tem o
prazo de cinco dias após a publicação do edital para apresentar a
impugnação.
Os advogados inscritos no processo seletivo são: Márcio Koch Gomes
dos Santos, Frederico Cezario Castro de Souza, Magda Esmeralda de
Barros Teixeira de Almeida, José Coutinho Franco Filho, Marcos
Oliveira Gurgel, João Gonçalves Franco Filho, Sócrates Mascarenhas
Santos e Pedro Riserio da Silva.
Fonte: Imprensa OAB-BA

STJ muda o prazo de prescrição da execução da pena

O prazo de prescrição da execução da pena começa a contar quando a sentença transita em julgado tanto para a defesa quanto para a acusação, de acordo com o entendimento da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que já orienta as instâncias inferiores. Apesar de a lei ser expressa, ao prever que o início da contagem do prazo é a partir do trânsito em julgado para a acusação, a decisão do STJ define que só quando a defesa também perde a possibilidade de recorrer é que a pena aplicada pode ser executada.

No STJ, a nova forma de interpretar o artigo 112 do Código Penal começou a ser aplicada no julgamento do Habeas Corpus 137.924, contra denúncia por porte ilegal de arma de fogo. O réu foi condenado a um ano de prisão — pena substituída por prestação de serviços à comunidade —, mas queria que fosse declarada prescrita a pretensão executória da pena. Ele era menor de 21 anos à época do crime e dois anos já se passavam depois do trânsito em julgado da sentença.

Ao analisar os autos, o relator, ministro Jorge Mussi, verificou que o trânsito em julgado para a acusação ocorreu no dia 28 de junho de 2005 e para a defesa em 8 de novembro do mesmo ano. O réu começou a cumprir a pena no dia 5 de agosto de 2007. No HC, a defesa argumentava que o cadastramento no Programa de Prestação de Serviços à Comunidade marcava o início da contagem do prazo de prescrição. Esta alegação não foi aceita pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

“Esta Corte de Justiça, em julgado que tratou da prescrição na fase de execução da pena restritiva de direitos, consolidou o entendimento de que o simples comparecimento do penado em cartório para retirada de ofício e cadastramento não configura o início do cumprimento da condenação”, escreveu Jorge Mussi em seu voto, ratificando a decisão do TJ paulista. Segundo o ministro, a Justiça entende como início do cumprimento da pena a presença física do réu no local combinado.

Mudança na aplicação
O advogado criminalista Leônidas Ribeiro Scholz afirma que o novo entendimento não condiz com o que diz a lei. Para ele, a contagem se inicia quando acontece o trânsito em julgado para a acusação. “Não havia qualquer questionamento acerca do marco inicial da chamada prescrição da pena, mesmo porque a norma legal que o define desde 1984, literal a não poder mais, prima por extraordinária clareza”, reclama.

Antes do julgamento pela 5ª Turma do STJ, o entendimento aplicado era o escrito no Código Penal, o termo inicial começa no trânsito em julgado para a acusação, conforme explica o promotor da Vara de Execuções Penais, Marcelo Orlando Mendes.

A juíza Cláudia Barrichello, da 5ª Vara de Execuções Penais, expediu  um mandado de prisão contra um réu que não se apresentou para cumprir a pena alternativa aplicada contra ele. No despacho, ela destacou o prazo de validade do mandado. “Expeça-se mandado de prisão, cujo prazo de validade será de quatro anos, a contar do trânsito em julgado para as partes”, diz a juíza. Ao fundamentar o prazo, ela cita o HC 137.924.

Cláudia Barrichelo, em outro processo, aplicou  o mesmo entendimento do STJ. A juíza não aceitou a alegação de prescrição da pena de um motorista condenado por acidente que matou uma pessoa. A defesa, representada pelo advogado Scholz, alegou que o prazo para o cumprimento da pena imposta já estava prescrito. O argumento, mais uma vez, não foi aceito e agora o motorista cumpre a pena.

De acordo com o promotor Marcelo Mendes, a interpretação dada pelo ministro Jorge Mussi é recente, mas está sendo aplicada nas instâncias inferiores. O promotor afirma que o novo entendimento é o mais correto, já que sem o trânsito em julgado para a defesa, o réu tem a chance de obter uma absolvição, redução ou até substituição da pena. “Como vamos fazer a execução se a defesa pode conseguir mudar a pena? Nesse caso o Estado ainda não sabe como o Título Penal será executado”, observa.

Para o promotor a mudança é positiva, uma vez que, as penas alternativas, por serem menores, prescrevem com mais facilidade.

Fonte Conjur  

INOBSERVÂNCIA DE PRAZO DESTINADO À SUSTENTAÇÃO ORAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

PROCESSUAL PENAL. «HABEAS CORPUS». 317, § 1º, 321 E 288, «CAPUT», NA FORMA DO ART. 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL. JULGAMENTO DA APELAÇÃO. VÁRIOS CO-RÉUS COM ADVOGADOS DIVERSOS. PRAZO DESTINADO À SUSTENTAÇÃO ORAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA

RONALDO BOTELHO (*)

«I – A frustração da sustentação oral viola as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, posto que esta constitui ato essencial a defesa. (Precedentes do STF e do STJ).
II – Consoante recente precedente da Corte Especial, em havendo vários co-réus com diferentes advogados, deve-se observar o prazo de 15 minutos para sustentação oral para cada um dos causídicos, ressalvada a hipótese de defenderem o mesmo réu (Inquérito 323/PE).
«Habeas corpus» concedido.»
(STJ, HC 150.937/RJ, 5ª Turma, Rel.: Min. FELIX FISCHER, DJ 22/03/2010)

Consoante decidiu a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator o Ministro Felix Fischer em havendo vários corréus com diferentes advogados, deve-se observar o prazo de 15 minutos para sustentação oral para cada um dos causídicos, ressalvada a hipótese de defenderem o mesmo réu.

«VOTO

EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: Nas razões do presente «mandamus», o impetrante pugna pela anulação do julgamento da apelação, determinando que se realize um novo julgamento, sustentando, para tanto, cerceamento de defesa, uma vez que os advogados foram impedidos de sustentar oralmente suas teses defensivas.

A ordem merece ser concedida.

O e. Tribunal «a quo», levando em consideração o disposto no art. 141 do seu Regimento Interno, determinou que a sustentação oral fosse realizada pelo prazo em dobro, no total de 30 (trinta) minutos, dividido entre todos os advogados, reduzindo para um minuto e meio o tempo que cada advogado teria para realizar a defesa (fl. 57).

Logo, houve cerceamento de defesa, uma vez que o e. Tribunal «a quo», ao determinar que, não obstante a presença de 44 (quarenta e quatro) apelantes, cada qual com sua própria tese defensiva, cada um com o seu respectivo patrono, fosse dividido o tempo disponível para a sustentação oral entre todos os advogados, restou para cada um menos de 02 (dois) minutos, ocasionando no protesto dos patronos presentes diante do exíguo tempo (fls. 54/62).

Segundo o entendimento desta Corte, a frustração da sustentação oral viola as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, posto que esta constitui ato essencial a defesa. Nesta linha o seguinte precedente desta Corte:

«PROCESSUAL PENAL. «HABEAS CORPUS». ART. 1º, INCISOS I, II E V, DA LEI 8.137/90 E ARTS. 288 E 299, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. JULGAMENTO DA APELAÇÃO. VÁRIOS CO-RÉUS COM ADVOGADOS DIVERSOS. PRAZO DESTINADO À SUSTENTAÇÃO ORAL. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
I – A frustração da sustentação oral viola as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, posto que esta constitui ato essencial a defesa. (Precedentes do STF e do STJ).
II – Consoante recente precedente da Corte Especial, em havendo vários co-réus com diferentes advogados, deve-se observar o prazo de 15 minutos para sustentação oral para cada um dos causídicos, ressalvada a hipótese de defenderem o mesmo réu (Inquérito 323).
«Habeas corpus» concedido prejudicados os demais tópicos.» (HC 41.698/PR, 5ª Turma, de minha relatoria, DJ 20/03/2006)

«PROCESSUAL PENAL. «HABEAS CORPUS». ART. 12, § 2º, INCISO III E ART. 14, AMBOS DO CP. ART. 616 DO CPP. REALIZAÇÃO DE NOVO INTERROGATÓRIO. FACULDADE DO ÓRGÃO JULGADOR. DECISÃO FUNDAMENTADA. ANÁLISE DO MATERIAL FÁTICO PROBATÓRIO. JULGAMENTO DA APELAÇÃO. VÁRIOS CO-RÉUS COM ADVOGADOS DIVERSOS. PRAZO DESTINADO À SUSTENTAÇÃO ORAL.
I – Segundo precedentes desta Corte e do Pretório Excelso o art. 616 do CPP traduz uma faculdade do órgão julgador em, analisando o conjunto fático-probatório, determinar, ou não, de maneira fundamentada, a realização de diligências. «In casu», a análise da alegação de cerceamento de defesa em razão do indeferimento do pedido de realização de novo interrogatório envolve o reexame aprofundado do material fático-probatório dos autos, procedimento defeso na via estreita do «writ» (Precedentes).
II – Consoante recente precedente da Corte Especial, em havendo vários co-réus com diferentes advogados, em observância ao princípio do contraditório e da ampla defesa, deve-se observar o prazo de 15 minutos para sustentação oral para cada um dos causídicos, ressalvada a hipótese de defenderem o mesmo réu (Inquérito 323).
«Habeas corpus» parcialmente concedido.» (HC 32.862/RJ, 5ª Turma, de minha relatoria, DJ 16/08/2004)

Na Augusta Corte tem-se:

«Ampla defesa: frustração do direito à sustentação oral no julgamento da apelação.
Viola a garantia da ampla defesa o julgamento de apelação criminal, não obstante já deferido o pedido de adiamento formulado pelo defensor do acusado.
Frustrado, assim, o direito da parte a sustentação oral, e nulo o julgamento, não cabendo reclamar para declará-lo a prova impossível de que, se utilizada aquela oportunidade legal de defesa, outra teria sido a decisão do recurso.» (STF, HC 69.142/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Sepulveda Pertence, DJU de 10/04/92).

««HABEAS CORPUS». DIREITO DE DEFESA. SUSTENTAÇÃO ORAL. DESRESPEITO. JULGAMENTO REALIZADO SEM PRÉVIA PUBLICAÇÃO DA PAUTA RESPECTIVA. ACÓRDÃO DESPROVIDO DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADE. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE NOVO JULGAMENTO. CONCESSÃO DE LIBERDADE AOS PACIENTES. PEDIDO DEFERIDO.
É nulo o julgamento de causa penal, em segunda instância, sem prévia intimação, ou publicação da pauta, salvo em «habeas corpus» (Súmula 431/STF).
A realização dos julgamentos pelo Poder Judiciário, além da exigência constitucional de sua publicidade (CF, art. 93, IX), supõe, para efeito de sua válida efetivação, a observância do postulado que assegura ao réu a garantia da ampla defesa.
A sustentação oral constitui ato essencial à defesa. A injusta frustração dessa prerrogativa qualifica-se como ato hostil ao ordenamento constitucional. O desrespeito estatal ao direito do réu à sustentação oral atua como causa geradora da própria invalidação formal dos julgamentos realizados pelos Tribunais. Precedentes.» (STF, HC 71.551/MA, 1ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 06/12/96).

No corpo do voto deste julgado colhe-se-se o seguinte excerto, «in verbis»:

«O segundo vício jurídico que afeta a integridade formal do procedimento de que emanou a deliberação ora questionada consiste na relevante circunstância de que o Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão promoveu sessão de julgamento – na qual foi proferida decisão que importou em desmembramento do processo, remanescendo na esfera de competência originária do Tribunal apontado como coator somente o paciente que exerce o mandado de Prefeito Municipal – , sem a prévia e necessária publicação da pauta no Diário de Justiça do Estado, o que comprometeu, de modo irremediável, a garantia de plenitude de defesa assegurada aos réus em sede penal, frustrando-lhes, como consequência direta dessa omissão, a possibilidade de exercerem, através de seus defensores técnicos, o direito à sustentação oral.
É preciso salientar, neste ponto – e tal como expressamente enfatizado pela douta Procuradoria-Geral da República em seu parecer –, que a sustenção oral constitui ato essencial à defesa. A injusta frustração dessa magna prerrogativa processual afeta, de modo substancial, o princípio da amplitude da defesa que vem proclamado no texto da Constituição da República.
O cerceamento do exercício dessa prerrogativa – que constitui uma das projeções concretizadoras do direito de defesa evidencia a ocorrência, na espécie, de prejuízo apto e suficiente para invalidar o julgamento, pelo Tribunal ora apontado como coator, da Ação Penal 89/94 que foi movida perante aquela Corte Judiciária contra os pacientes.
As circunstâncias do caso presente evidenciam que foi efetivamente ofendida a cláusula constitucional assecuratória da plenitude de defesa, eis que, consoante se pode constatar do próprio resultado desse julgamento, objeto da Ata xerocopiada a fls. 46, «O Tribunal, atendendo à solicitação da Procuradoria-Geral de Justiça, decidiu, por maioria, se manifestar, independente da publicação da pauta, sobre a competência do Tribunal para julgar todos os réus contra os votos dos Desembargadores João Manuel e Nilo Cruz, tendo a Egrégia Corte, decidido, também, por maioria, pelo desmembramento do processo, a fim de que sejam julgados, pelo Tribunal, apenas o prefeito, e os demais pelo Tribunal do Júri da comarca, contra o voto do Des. José Filgueiras, que se manifestou no sentido de que tanto o Prefeito como os outros réus, sejam julgados pelo Tribunal e não separadamente».
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, sensível à grave importância jurídico-constitucional do direito dos réus à sustentação oral, tem, invariavelmente, prestigiado essa particular expressão da liberdade de defesa que assiste a qualquer acusado em juízo penal. Esta Suprema Corte, nos vários pronunciamentos sobre a matéria, tem invalidado os julgamentos proferidos por Tribunais, sempre que, por razões não imputáveis aos próprios acusados ou aos seus defensores (e este é o caso dos autos), seja-lhes negado, injustamente, o exercício do direito à sustentação oral. Nesse sentido, HC 67.556-5, Rel. Min. PAULO BROSSARD, DJU, 29/09/93 – RTJ 140/926, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – HC 70.727-1, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU, 10/12/93.»

Com efeito, no julgamento do Inquérito 323 a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça analisando questão de ordem suscitada entendeu, em consonância com o princípio da ampla defesa, que havendo, como no caso havia, mais de um advogado para fazer sustentação oral é de observar o prazo de 15 (quinze) minutos para cada um dos advogados presentes, ressalvada a hipótese de haver mais de um patrono para o mesmo réu, onde o prazo deve ser dividido entre os advogados, frise-se do mesmo réu, «ex vi» do art. 222, § 1º do RISTJ.

Diante dessas considerações concedo a ordem para anular o julgamento da apelação criminal 2004.51.01.537118-1, em relação a todos os réus, para que outro seja realizado, agora, com a observância do prazo para sustentação oral. É o voto.»

Decisão unânime, votando com o Relator os Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho e Jorge Mussi.